Num período em que na maior parte da pop mainstream os produtores obtêm já tanta – senão mais – visibilidade e reconhecimento do que os artistas com que colaboram, também a lusodescendente mais famosa do mundo contribui para que a tendência se dissemine ainda mais com o seu terceiro álbum.
Após a comercialmente (e, a espaços, artística) bem-sucedida estreia com “Whoa Nelly!” (2000), que colocou na boca do mundo singles como o banal “I’m Like a Bird” ou o mais entusiasmante “Turn off the Light”, Nelly Furtado regressou com um novo registo, “Folklore”, três anos depois, onde de novo aglutinava géneros e referências díspares mas já sem a frescura de alguns momentos do seu predecessor.
Embora fosse um álbum aceitável, a decepcionante recepção do público arriscava-se a condenar a canadiana a mais uma one(ou two)-hit-wonder cuja ascensão ao estrelato fora tão rápida como a descida para o esquecimento generalizado, e de forma a evitar isso só se adivinhava uma solução: mudar. Três anos mais tarde, a mudança não só se registou como dificilmente poderia ser mais evidente, tanto a nível musical como (e sobretudo?) a nível da imagem da cantora.
Em “Loose” desapareceu a pose ingénua, cândida e espontânea que Nelly cultivou até aqui, e numa altura onde a pop encontra, talvez como nunca antes, uma forte aliada na imagem, nada como adoptar uma postura mais insinuante, ousada e “solta”, o que decerto não prejudicará o número de passagens dos seus videoclips.
Mais relevante do que a mudança visual foi, no entanto, a musical, que passou essencialmente pela aliança com Timbaland na produção da maioria dos temas do disco, cuja marca é óbvia e salutar em “Loose”, tornando-o no trabalho mais interessante de Nelly até à data.
A aposta em novas sonoridades atesta-se logo na canção de abertura, “Afraid”, vincada por oscilantes e sombrias texturas electrónicas, não especialmente acessível mas intrigante e promissora. “Maneater”, um dos melhores
singles do ano, impõe-se de seguida como a verdadeira porta de entrada para o disco, irradiando uma energia contagiante à custa de um refrão
catchy e de um ritmo invejável, com um saboroso travo à
electropop dos anos 80 mas cuja sofisticação da produção torna claro ser uma canção do presente. Um belo exemplo de confecção retrofuturista, como o é também “Promiscuous”, outro
single que foge ao óbvio através do dueto (e
flirt) entre Nelly e Timbaland, onde o
R&B e o electro estabelecem uma ligação efervescente e sedutora.
À semelhança dos anteriores,
“Loose” aposta num considerável eclectismo, mas ao contrário destes consegue ser quase sempre estimulante mesmo quando se torna derivativo, como no caso de “Glow”, irresistível concentrado de pop electrónica que não destoaria num álbum de
Gwen Stefani ou
Madonna (fase “Ray of Light”), ou de “No Hay Igual”, cantada em espanhol e cuja percussão imprevisível e aura tribal a interligam aos territórios de M.I.A..
O recurso ao perfeccionismo e minúcia de Timbaland é uma opção certeira, mas mesmo assim
“Loose” não evita alguns escorregões, seja na agradável mas demasiado genérica aproximação ao
R&B de “Showtime”, na mais insípida balada pop FM “In God’s Hands” e especialmente na dispensável “Te Busque”, banalíssima (e incompreensível) colaboração com Juanes.
Estas são, contudo, ocasionais falhas de criatividade compensadas por momentos como “Say it Right” ou “All Good Things”, este o emotivo tema que encerra o disco e um dos raros episódios melancólicos, ao qual não será alheio o facto de ter sido escrito a meias com Chris Martin, dos Coldplay.
Mesmo com arestas por polir,
“Loose” é um álbum mais surpreendente do que se esperaria, já que consegue nivelar-se acima de muita da concorrência e oferecer alguma da melhor pop
mainstream de 2006, apontando pistas interessantes para esta nova Nelly Furtado, que fez bem em soltar-se mas é melhor que não largue as boas companhias.
E O VEREDICTO É: 3/5 - BOM
Nelly Furtado - "Maneater (LJX Remix)"