sexta-feira, dezembro 31, 2004

(MUITO) BOM 2005

Esperemos que o próximo ano seja melhor do que este, por isso nada como tentar começar 2005 da melhor maneira...
Divirtam-se logo à noite, que eu também vou tentar fazê-lo ;)
Entretanto, era suposto ter postado a lista de melhores filmes e discos de 2004, mas como ainda não me decidi completamente o melhor é colocá-las daqui a uns dias (não muitos, espero...)

LAÇOS DE FAMÍLIA

Centrado nas relações dos quatro elementos de uma família de classe média norte-americana, "Equal Affections" desenrola-se ao longo das últimas décadas do século XX e expõe algumas das mutações sociais que marcaram a vida urbana contemporânea, partindo de uma teia de complexas ligações familiares.

Louise Cooper, a matriarca, ultrapassa uma fase de solidão, amargura e frustração, geradas não só pelo cancro que ameaça o seu estado de saúde mas também pela tensão conjugal. Nat, o seu marido, recatado e distante, torna-se progressivamente menos paciente e tolerante, não suportando as constantes crises e oscilações emocionais de Louise. April, a filha do casal, vive uma próspera carreira de cantora rock através da qual dissemina os seus ideais feministas e Danny, o seu irmão, é um jovem advogado que tenta construir uma relação estável com o seu companheiro Walter.

Através de uma bem-conseguida narrativa não-linear, David Leavitt apresenta as atmosferas que marcam o âmago da família Cooper, estabelecendo portas de entrada para questões como a infidelidade, o companheirismo, a alienação, a confiança, a instabilidade conjugal, o surgimento da morte ou a ambivalência sexual.

Louise é a instigadora de grande parte do desencadear da acção e a personagem mais desenvolvida e intrigante do romance. Recorrendo a flashbacks, Leavitt explora o conflito interior da ousada e inquieta jovem que viria a tornar-se numa insegura esposa e mãe. A vida de Louise adquire tonalidades trágicas ao atingir a meia idade, e esses elementos geram situações de união familiar mas também de assinalável crispação entre as perspectivas de algumas personagens.

Embora possua protagonistas com potencial, esta obra de Leavitt não se debruça, contudo, num turbilhão emocional tão absorvente quanto os primeiros capítulos sugerem. A famíla Cooper tem tanto de disfuncional como de realista e é fácil sentir empatia com estas personagens, mas nem todas são igualmente surpreendentes. Nat carece de maior tensão interior, uma vez que a sua evolução ao longo da acção é diminuta, e April parece funcionar mais como um porta-estandarte de uma ideologia do que como uma personagem.
A relação de Danny e Walter também não chega a ter tempo de antena suficiente para alacançar grandes momentos de intensidade, tornando-se pouco aprofundada e memorável.

"Equal Affections" possui, no entanto, uma sólida interligação de ambientes dramáticos e melancólicos com episódios mais esperançosos e reconfortantes, oferecendo um subtil e credível retrato de família.
Ainda que possua atractivos suficientes - como a pequena surpresa no desenlace agridoce -, esta obra de David Leavitt não chega a arrebatar (contrariamente a "Enquanto a Inglaterra Dorme", por exemplo, um dos seus melhores livros), mas proporciona momentos de afeição q.b. que tornam a sua leitura mais do que justificável.

E O VEREDICTO É: 3/5 - BOM

quarta-feira, dezembro 29, 2004

WTF????????

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Power Rangers Movie!


What movie Do you Belong in?(many different outcomes!)
brought to you by Quizilla
Com tantos, tantos bons filmes por aí, tinha mesmo que me calhar este????? Ok, confesso que não o vi, e até gosto de filmes de super-heróis, mas os Power Rangers????? Se cada um tem mesmo aquilo que merece, devo ser muito má pessoa...
A propósito de filmes, esta semana estreiam alguns com potencial:
- "À Procura da Terra do Nunca" (Finding Neverland), de Marc Foster
- "A Porta no Chão" (The Door in the Floor), de Tod Williams
- "5x2", de François Ozon, que já vi e acho que vale a pena, mesmo não sendo genial

BLINKS E LINKS

Agradeço aos responsáveis pelos blogs Som Activo e Delight in Disorder por me terem blinkado...
Continuem assim...

sexta-feira, dezembro 24, 2004

BOM NATAL

Eu já devia saber que não é boa ideia tentar enviar sms pela net no dia 24 de Dezembro...Enfim, vai ter de ser mesmo à moda antiga, e ainda assim o tráfego deve estar intenso. De qualquer forma, bom Natal para todos os que visitam este blog (que nem são muitos LOL, mas para o ano será melhor - yeah, right...).

quinta-feira, dezembro 23, 2004

RESPONDAM E PERGUNTEM...

A: First, recommend to me:

1. a movie

2. a book

3. a musical artist, song, or album

4. a personality / thinker / artist / achiever / talent / remarkable creature

B: I want everyone who reads this to ask me three questions, no more, no less. Ask me anything you want

C: Then I want you to go to your journal, copy and paste this allowing your friends to ask you anything

Estas foram as minhas respostas e perguntas ao davidlynch:

A.

1. "Estranhos Prazeres" (Strange Days), de Katryn Bigelow

2. "Alta Fidelidade", de Nick Hornby

3. Porque não as 3 opções? Elliot Smith; "Be There" dos Unkle; "Garbage" dos Garbage

4. A equipa do Gato Fedorento

B.

Britney ou Aguilera?

"Sete Palmos de Terra" ou "Os Sopranos"?

Blur ou Oasis?

C. Vá, façam o mesmo, não custa muito ;)

quarta-feira, dezembro 22, 2004

ANTI-PAI NATAL?

A julgar pelo número de compras de Natal que (não) fiz, é isso que devo ser...Mas acho que vou ter de ceder um pouco à lógica consumista, até porque este mês recebi finalmente o meu primeiro ordenado :D e, por isso, não tenho desculpas para não me deixar envolver pelo "espírito natalício"...
O título deste post foi "roubado" a um dos filmes mais prometedores que chegará ainda este ano a salas de cinema nacionais (mas não garanto, porque já foi adiado pelo menos uma vez), a par de "À Procura da Terra do Nunca" e "A Porta no Chão".
"Bad Santa - O Anti-Pai Natal", com Billy Bob Thornton, é a mais recente obra de Terry Zwigoff, o realizador de "Ghost World - Mundo Fantasma". Como ainda não vi o novo filme do cineasta, recordo o antecessor no post abaixo. E, enquanto não faço a lista de melhores filmes de 2004, sugiro que (re)descubram esse, que foi um dos meus favoritos de 2002...

OS INADAPTADOS

Um daqueles filmes que passou injustamente despercebido em 2002, "Ghost World - Mundo Fantasma" destacou-se, contudo, como um dos mais surpreendentes desse ano, tornando-se instantaneamente numa obra de culto. Embora seja um filme norte-americano sobre adolescentes, não cai no caminho mais óbvio e convencional das piadas fáceis e referências a sexo de 2 em 2 minutos, recusando igualmente personagens baseadas em estafados clichés.

Adaptando para a sétima arte a obra de banda-desenhada homónima de Daniel Clowes - um dos mais estimáveis autores underground norte-americanos -, Terry Zwigoff apresenta um filme que diverge em tudo da lógica dos tradicionais comics de super-heróis que têm marcado grande parte da produção cinematográfica recente made in USA. Aqui não há efeitos especiais impressionantes nem intrépidos protagonistas, mas um universo minimalista povoado por gente normal que vive um quotidiano melancólico e pouco reluzente. Assim, foca-se aqui a alienação, o consumismo ou as (sub)culturas urbanas vistas pela óptica de duas adolescentes desalinhadas.

Enid (Thora Birch, de “Beleza Americana”) é uma jovem inteligente e criativa que, ao terminar o liceu, questiona quais as perspectivas para o seu futuro e os rumos a seguir numa nova fase da sua vida. Acompanhada pela sua melhor (e única?) amiga Rebecca (Scarlett Johansson, antes do boom de "Lost in Translation - O Amor é um Lugar Estranho"), Enid vive um tenso processo de crescimento onde a chegada da idade adulta está cada vez mais próxima, trazendo uma carga de responsabilidades e escolhas que devem ser feitas. As duas amigas, quase sempre afastadas dos colegas, nunca estiveram muito interessadas em integrar-se, mas pela primeira vez apercebem-se de que talvez devam - ou terão de - fazê-lo. Valerá a pena? E qual o preço a pagar pela integração?

Terry Zwigoff combina eficazmente drama e comédia, tornando "Ghost World - Mundo Fantasma" numa obra que segue a melhor tradição das dramedies características de domínios do cinema "indie". Irónico e sarcástico sem deixar de ser genuíno e emotivo, o filme é um intenso retrato da realidade mundana e monótona dos subúrbios, onde jovens outcasts isolados lidam com o desencanto de ambientes vincados pela inércia. A espaços, surge por aqui o humor ácido próximo da série de animação "Daria", da MTV, embora a película de Zwigoff seja mais profunda e intimista.

O ritmo da narrativa é, por vezes, demasiado lento e arrastado, mas acompanha bem os cenários de monotonia e tédio que envolvem as personagens, dotando o filme de um realismo simultaneamente envolvente e claustrofóbico. "Ghost World - Mundo Fantasma" é um incomum olhar sobre os nerds e os falhados que, apesar do seu potencial, acabam por ser sempre ignorados ou desprezados e, por isso, são quase invisíveis, como fantasmas. Com uma vida social quase nula, tornam-se gradualmente incapazes de estabelecer laços e relações com os que os rodeiam, habitando áridas esferas de solidão. Enid, mais do que Rebecca, incorpora esses elementos, e quando tenta aproximar-se de alguém apercebe-se de que é usada e magoada.

Um dos mais entusiasmantes e memoráveis filmes norte-americanos recentes, "Ghost World - Mundo Fantasma" é uma discreta pérola que expõe com sensibilidade e alguma crueza a vertente angustiante, dolorosa e solitária do processo de crescimento, juntando-se a títulos igualmente recomendáveis como "Donnie Darko" de Richard Kelly, "L.I.E." de Michael Cuesta, "Elephant" de Gus Van Sant ou "SubUrbia", de Richard Linklater.

E O VEREDICTO É: 4/5 - MUITO BOM

segunda-feira, dezembro 20, 2004

O MÚSICO QUE VEIO DO FRIO

Conquistando alguns admiradores com os álbuns "Whiskey" (1996) e "Tatoo" (1998) e alargando o leque de fãs com "Poison" (2000) e "Antenna" (2002), o sueco Jay Jay Johanson apresentou algumas das suas canções mais emblemáticas no passado dia 17 ao público da Aula Magna, em Lisboa.

Promovendo o seu lançamento mais recente, a compilação "Prologue", o músico fez uma revisão da sua carreira num concerto que mesclou referências do trip-hop, electro, pop ou jazz, sonoridades incontornáveis na sua discografia. Iniciando a noite com um dos seus temas mais carismáticos, "So Tell the Girls That I Am Back in Town", Jay Jay Johanson ofereceu um cardápio musical que oscilou entre a postura introspectiva e discreta característica dos seus primeiros álbuns e a vertente mais dinâmica, com consideráveis cargas electro, dos seus registos mais recentes ("Antenna", sobretudo).

Para além da componente sonora, o espectáculo contou ainda com um cuidado trabalho visual onde se evidenciou um interessante trabalho de iluminação e as curiosas imagens que eram exibidas no ecrã do palco (com destaque para as fotos marcantes de David Bowie, Daft Punk, Kiss ou Aphex Twin, entre muitas outras figuras da cultura pop).

Embora tenha sido prejudicado por problemas de som a espaços, o concerto foi competente e profissional, ainda que um pouco frio e distante. Não é que o cantor não tenha sido afável com o público, mas algumas canções não contaram com grandes doses de alma e entrega, tornando a actuação correcta e funcional mas incapaz de gerar grande empatia. Terá sido culpa da considerável carga electrónica que revestiu a maioria dos temas, como um espectador sugeriu? Talvez, já que certas canções mais antigas do músico não precisavam de operações de reactualização digital para sobreviverem (o tema que encerrou o concerto, "I`m Older Now", passava bem sem as manobras de cosmética electropop que o revestiram).


Contudo, a maior parte do público da Aula Magna aderiu às canções do cantor e da sua banda e aplaudiu entusiasticamente canções como a sóbria "Believe in Us" (um dos melhores momentos de "Poison"), "She`s Mine But I`m Not Hers" (acompanhada por um vídeo baseado no jogo "Scrabble"), a enérgica "On the Radio" (um dos temas mais populares de "Antenna") ou uma versão mais dançável de "Automatic Lover", a cargo do DJ, que não destoaria numa rave.

Para além da revisão de episódios fulcrais da sua discografia, Jay Jay Johanson apresentou ainda composições inéditas, como as bem-recebidas "Rush" ou "Tomorrow", carregadas de atmosferas melancólicas e incluídas no próximo álbum do cantor, que deverá ser editado em 2005. "Suddenly", mais um inédito, foi outro grande momento, não muito distante dos ambientes hipnóticos de "Two Fingers", a excelente canção que o cantor gravou com o projecto Bang Bang mas que, infelizmente, não constou no alinhamento da noite.

No final de quase duas horas de concerto, o crooner voltou ao palco, não para interpretar mais um ou dois temas, mas para agradecer ao público e prometer o regresso em breve, finalizando um espectáculo por vezes morno mas globalmente eficaz e sofisticado.

E O VEREDICTO É: 3/5 - BOM

domingo, dezembro 19, 2004

ENTRE A REALIDADE E A FICÇÃO

Depois da intensidade de "Tudo Sobre a Minha Mãe" e "Fala com Ela", Pedro Almodóvar aumenta as doses de negrume e obscuridade em "Má Educação" (La Mála Educación), distanciando-se da vertente calorosa e emotiva dessas elogiadas obras antecessoras.
Apostando em tons mais sinistros, o mais recente filme debruça-se sobre temas polémicos como a pedofilia, a prostituição ou a homossexualidade. É certo estas temáticas não são inéditas na obra do cineasta, mas raramente foram abordadas de forma tão soturna e arrepiante como em "Má Educação".

Herdando referências do film noir, do policial ou do melodrama, a película centra-se na relação de dois amigos de infância, colegas de um colégio interno católico, que se reencontram mais tarde, na idade adulta, no início dos anos 80. Enrique é agora realizador de cinema e Ignacio um actor principiante à procura de uma oportunidade para brilhar. Quando os dois jovens se reencontram, estão lançadas as pistas para uma intrincada história marcada pela mentira, traição, morte, amor e vingança, onde o presente e o passado mantêm uma interligação incontornável.

Almodóvar proporciona um denso olhar sobre os podres da Igreja Católica, nomeadamente sobre as assombrosas atmosferas dos colégios internos e das ambivalentes relações entre os padres e as crianças. É sabido que o cineasta passou a infância nestas instituições, mas desconhece-se até que ponto o argumento de "Má Educação" é auto-biográfico.


Através de flashbacks, o filme apresenta uma perspectiva sobre os laços de confiança dos dois amigos na infância, expondo também a descoberta da paixão de ambos pelo cinema e os primeiros contactos com o despertar da sexualidade.
Com uma estrutura narrativa complexa e criativa, "Má Educação" funde as esferas da realidade e da ficção, tornando-se num desafio constante para o espectador e obrigando-o a reavaliar e questionar os acontecimentos decorridos.

Ao contrário de grande parte dos filmes de Almodóvar, aqui não se efectua um mergulho no universo feminino, antes se expõem as tensões e antagonismos de um conjunto de personagens masculinas. O carácter trágico e a densidade dramática, no entanto, mantêm-se, através de uma teia de intrigas vincada pelo desejo, ambição, pecado e obsessão. As atmosferas são, por isso, carregadas de negrume, e raramente há espaço para o despontar do amor num filme que aborda a perversidade humana. A espaços, verificam-se alguns momentos de humor, mas "Má Educação" privilegia a melancolia e o desencanto.

Para além da espessura dramática, a película impressiona também pelo rigor técnico e formal, onde a realização e banda-sonora voltam a marcar pontos e a reconstituição de Madrid dos anos 80 exibe competência. A direcção de actores é igualmente profícua, da qual se destaca a credibilidade do duo protagonista constituído por Fele Martínez (Enrique) e, sobretudo, Gael Garcia Bernal (Ignacio). Bernal, um dos mais promissores actores latinos de hoje - como "Amor Cão", "E a Tua Mãe Também" ou "Diários de Che Guevara" podem atestar - , oferece aqui os seus melhores desempenhos e confirma a sua versatilidade (a femme - ou homme? - fatale que compõe é uma das mais impressionantes interpretações do ano).

Talvez menos acessível e imediata do que algumas das suas obras anteriores, "Má Educação" é uma experiência cinematográfica que volta a demonstrar a vitalidade criativa de Almodóvar e um estilo que - goste-se ou não - é singular, característico e pessoal.

E O VEREDICTO É: 4/5 - MUITO BOM

sábado, dezembro 18, 2004

PERSEGUIDO PELO PASSADO

Um ano depois...
Jantar de turma da faculdade hoje...Long time no see...
Este blog tem andado um bocado desgovernado ultimamente, mas vou tentar recuperá-lo.

quinta-feira, dezembro 16, 2004

VAI UM QUIZ?

Aura Color:

orange aura
Your aura shines Orange!


What Color Is Your Aura?
brought to you by Quizilla

EXCITING

Andava eu inocentemente a passear nesse oásis cultural - a FNAC - quando fui alvo de fortes tentativas de sedução impossíveis de ignorar. Tive de sair de lá com uma nova companhia irrecusável...Não é que leve qualquer uma para casa, mas desta vez não consegui mesmo evitar.

Refiro-me, claro, ao mais recente lançamento de uma das minhas bandas preferidas:

O álbum de remisturas dos Depeche Mode começou a rodar recentemente por aqui. E 3 CDs ao preço de um não é todos os dias. Como não cheguei a oferecer prenda de aniversário a mim mesmo, pareceu-me boa altura...

quarta-feira, dezembro 15, 2004

O OUTRO LADO EXISTE

Como "A Última Hora" (25th Hour), de Spike Lee, ou "Fahrenheit 9/11", de Michael Moore, podem comprovar, os trágicos eventos do 11 de Setembro inspiraram novas perspectivas cinematográficas sobre a América contemporânea. Num período algo tenso e imprevisível, também Wim Wenders proporciona um olhar sobre a nação do Tio Sam com "Terra da Abundância" (Land of Plenty), focando atmosferas onde se movimentam os párias e "outcasts", figuras de um lado pouco visitado e divulgado.


O realizador de "Paris, Texas" ou "Buena Vista Social Club" aborda a relação de Lana (Michelle Williams), uma jovem idealista missionária e Paul (John Diehl), veterano do Vietname assombrado por alguma paranóia. Regressada de uma missão em África e no Médio Oriente, Lana chega a Los Angeles para auxiliar os sem-abrigo e procurar o seu tio. A aproximação dos dois protagonistas evidenciará os contrates entre a busca de esperança ou a espiral descendente gerada pela obsessão e desconfiança exacerbada.

Dividido entre a harmonia etérea e a tensão claustrofóbica, o filme combina traços do road movie e drama familiar, apresentando um estilo realista, contemplativo e próximo do documentário. Ao contrário da vertente polémica e sensacionalista de um "Fahrenheit 9/11", "Terra da Abundância" adopta tons mais poéticos e apaziguados, ainda que pontuados por doses consideráveis de melancolia e desespero.
Também não paira por aqui um americanismo exagerado e saloio, presente em tantos filmes americanos que exaltam as ilimitadas qualidades da nação (talvez porque esta obra é produto de uma perspectiva de um europeu). Pelo contrário, a película exibe momentos de desencanto e amargura a par de ambientes mais reluzentes a espaços, debruçando-se sobre as múltiplas culturas que constituem o tecido humano americano. A realidade que Wenders expõe nem sempre é aprazível e fácil de contemplar, evidenciando a vertente mais escondida e negra do "sonho americano".

Apesar do retrato que o cineasta alemão oferece ter os seus momentos de relevo, o filme é prejudicado por um ritmo demasiado lento e arrastado, e a partir de certo ponto nada mais há para mostrar do que a repetição de ideias e questões. O que começa como uma obra promissora torna-se num filme desequilibrado, inconstante, excessivamente longo e, por isso, acaba por proporcionar mais doses de monotonia do que de desafio. O argumento, demasiado esquemático, não chega a entusiasmar, e os conflitos dos protagonistas aproximam-se de modelos estereotipados.
Embora Wenders gere algumas cenas de envolvente sobriedade - complementadas pela interessante banda sonora, que inclui Leonard Cohen, David Bowie ou o quase desconhecido Thom -, esses ocasionais momentos de inspiração não são suficientes para sustentar um filme que se torna insípido e pouco estimulante. Ainda que seja mais consistente do que a maioria dos esforços recentes do cineasta, "Terra da Abundância" possui uma boa premissa para a qual faltou, infelizmente, uma execução à altura.

E O VEREDICTO É: 2/5 - RAZOÁVEL

segunda-feira, dezembro 13, 2004

MAIS UM...

Jay Jay Johanson, o cantor que começou por se destacar como crooner nos discos "Tattoo" e "Whiskey" para se dedicar depois à pop electrónica em "Poison" e, sobretudo, "Antenna", actua em palcos nacionais nos próximos dias 17 - Aula Magna, em Lisboa - e 18 de Dezembro - Teatro Sá da Bandeira, no Porto, pelas 21h30m.

Para além da recuperação das canções do recente "Prologue - Best of the Early Years 1996-2002", há ainda a probabilidade do músico sueco apresentar alguns temas inéditos do seu novo álbum em preparação.
Espera-se uma noite sofisticada e a passagem por momentos como "Keep It a Secret", "So Tell the Girls That I Am Back In Town", "On the Radio", "Colder (I Want You No More)" ou "Quel Dommage".

Mais um concerto a considerar, para além do de Josh Rouse...


Aula Magna - Alameda da Universidade de Lisboa
Telefone: 21 7967624

Teatro Sá da Bandeira - R. Sá da Bandeira, 108, Porto
Telefone: 22 2003595

O DIA EM QUE O PAÍS TREMEU

Sim, todos sabemos que já anda muito tremido há uns tempos, mas não literalmente...Hoje às duas e pouco pensei estar com problemas informáticos quando o computador começou a tremer, mas quando a mesa adoptou os mesmos movimentos vi que afinal não era bem isso...E no momento em que um colega de trabalho gritou "Está a haver um sismo" desfizeram-se as dúvidas. E pronto, arranjou-se assunto de conversa para o resto da tarde...

A VERDADE DA MENTIRA

Adaptada de uma peça teatral, "Duras Verdades" (Home Truths) é uma das obras menos mediáticas de David Lodge, autor de "Soldados à Força", "O Museu Britânico Ainda Vem Abaixo" ou "A Troca", entre outros títulos. O livro centra-se na relação de amizade entre dois apaixonados pelo mundo da escrita, Adrian Ludlow (escritor praticamente retirado) e Sam Sharp (que se distingue sobretudo pelos argumentos que cria para séries televisivas). Os dois velhos amigos voltam a aproximar-se quando Sam é entrevistado por uma astuta jornalista, Fanny Tarrant, que o humilha e ridiculariza num artigo de um reputado jornal. Magoado pelo golpe da sua entrevistadora, Sam tenta persuadir Adrian a deixar-se entrevistar pela repórter de forma a colocarem em prática um plano de vingança.

Com esta premissa, David Lodge apresenta um romance baseado numa peça teatral exibida pela primeira vez em Birmingham em 1998. O autor procedeu a uma revisão e alterou alguns elementos, tornando a forma da história ligeiramente mais próxima da estrutura do romance. Contudo, o esqueleto teatral ainda é visível, uma vez que a novela tem um número de páginas relativamente curto (não chega às 150), não aposta em descrições minuciosas e exaustivas nem em mergulhos profundos na esfera emocional das personagens. Paralelamente, o número de protagonistas é reduzido, assim como a quantidade de espaços onde se desenrola a acção, e manifesta-se ainda um considerável recurso aos diálogos.

Lodge proporciona uma curiosa e divertida perspectiva sobre a disseminação dos media, o culto das figuras públicas e a perda da privacidade, gerando um interessante olhar sobre o preço da fama e a perda da criatividade num mundo de "ídolos com pés de barro". Pelo meio, há também algumas observações acerca da peculiaridade da entrevista jornalística, segredos conjugais, amizades decadentes e a capacidade de deslumbramento que uma obra de arte pode suscitar.

O autor consegue oferecer uma narrativa com um ritmo acelerado e dinâmico, não se perdendo em longas descrições ou reflexões. Os diálogos são credíveis e bem trabalhados, conseguindo expor as tensões e inquietações das personagens e concentrando as doses certas de inteligência e humor. A acção contém momentos suficientemente surpreendentes e apelativos, conquistando o interesse e afastando-se da previsibilidade e redundância.


"Duras Verdades" é uma obra leve mas pertinente e actual, que só perde por ser tão curta e não chegar a aprofundar muito o universo interior dos seus protagonistas. No entanto, mantém sempre o carácter lúdico e as altas cargas de perspicácia pelos quais David Lodge é internacionalmente reconhecido.

E O VEREDICTO É: 3/5 - BOM

sábado, dezembro 11, 2004

JOSH ROUSE EM PORTUGAL

Apesar de não ser um artista muito mediático, Josh Rouse conseguiu gerar alguns focos de atenção entre certas franjas do público. Portugal é um dos países onde o jovem cantautor norte-americano tem uma base de admiradores consistente, por isso é um dos destinos a registar o seu regresso após uma passagem pelo festival Paredes de Coura.

"Dressed Up Like Nebraska", "Home", "Under Cold Blue Stars" e "1972" são os quatro álbuns de originais que fornecerão algumas das pistas para os concertos de dia 15 (Fórum Lisboa) e 17 (Alfândega do Porto) de Dezembro, pelas 21h30m, com primeira parte a cargo de Nuno Prata. Já que não consegui ir ao concerto dos Pluto na quinta-feira passada, vou tentar ir a este...Recomendo, sobretudo para quem gosta de folk/indie rock...

Fórum Lisboa - Av. Roma, 14 L, Lisboa
21 8420900

Alfândega do Porto - Centro de Congressos e Exposições - R. Nova da Alfândega, Porto
22 3324049

(IN)DISPONÍVEL PARA AMAR

"Antes do Amanhecer" (Before Sunrise), relativamente discreto na altura da estreia em 1995 conseguiu, no entanto, aglomerar uma considerável legião de fãs que o foi (re)descobrindo ao longo dos anos. Autêntico fenómeno de culto, a mais acarinhada obra de Richard Linklater forneceu um retrato das dúvidas, esperanças, sonhos e inquietações da chamada geração X, expostas através da singular relação de Jesse (Ethan Hawke) e Céline (Julie Delpy), que se conhecem em Viena e passam um dia juntos. A dupla combina encontrar-se meses mais tarde, não colocando de parte a hipótese de dar continuidade à curiosa história de amor da qual foi protagonista, ainda que por pouco tempo.


O reencontro dá-se agora, nove anos depois, onde o duo já não se encontra a viver os últimos dias da adolescência mas a contrastar as ilusões, projectos e expectativas de então com a insípida realidade quotidiana da idade adulta. "Antes do Anoitecer" (Before Sunset) é, então, a apresentação do reencontro do par, desta vez em Paris. Jesse é agora um escritor que promove a sua nova obra na capital francesa e Céline aproveita a ocasião para o rever. O filme é ainda mais minimalista do que o seu antecessor, centrando-se apenas nos diálogos dos protagonistas e seguindo o seu percurso de hora e meia em tempo real, desde os tons formais e algo desconfortáveis do reencontro até ao mergulho no espectro emocional dos dois ex-amantes.

"Antes do Anoitecer", não tão reluzente e esperançoso como a obra que o antecedeu, abre espaço para o cinismo e a desilusão, expondo as metas que ficaram por atingir e as previsões que não chegaram a concretizar-se. Quando o par se conheceu, as atmosferas eram marcadas pela ilusão e entusiasmo, mas o novo contacto ocorre num contexto de alguma frustração e amargura (o preço da maturidade?). Apesar de melancólico e nostálgico, "Antes do Anoitecer" continua a ser um filme de Richard Linklater e, por isso, o idealismo ainda consegue superar os ambientes de cinismo desencantado. Há espaço para o amor, portanto, mesmo se as cedências e obrigações da vida adulta parecem indicar o contrário.

Credível e realista, o filme flui naturalmente, oferecendo um intrigante olhar sobre as relações humanas através de excelentes diálogos e das muito convincentes interpretações de Hawke e Delpy. Projecto feito "por amor à camisola", "Antes do Anoitecer" evidencia a entrega e dedicação da equipa que o gerou, tornando-se num dos mais simples e belos dramas de 2004.


A película assinala também o regresso do melhor Linklater, apostando na espontaneidade e sobriedade em detrimento da formatação de registos indistintos (o mediático e pouco surpreendente "Escola de Rock" chegou a colocar algumas dúvidas quanto à criatividade do cineasta). Manifesta-se, então, o regresso aos momentos inspirados da obra do realizador, como "Slacker" (um retrato indie da juventude, que lhe deu reconhecimento no início dos anos 90) ou "SubUrbia" (outra perspectiva sobre a teen angst, apostando num modelo narrativo original: focar as experiências de um grupo de jovens durante uma noite).


Esta atípica sequela/continuação possui, então, aspectos suficientemente singulares para se destacar como uma das pérolas do cinema independente norte-americano de 2004, congregando doses certas de leveza e de elementos despoletadores de reflexão.

E O VEREDICTO É: 3,5/5 - BOM

sexta-feira, dezembro 10, 2004

UM PRESENTE DE ALCOBAÇA EM LISBOA

Aguardado por muitos com grande expectativa, o concerto dos The Gift na noite de 6 de Dezembro no Teatro S. Luiz comprovou que o novo álbum da banda passou com distinção no teste inicial, neste que foi um dos primeiros espectáculos da digressão. Depois da surpresa que foi "Vinyl", em 1998, e da confirmação em "Film", de 2001, o grupo de Alcobaça prova que é um dos mais cativantes e engenhosos projectos musicais portugueses.

O recente disco duplo "AM-FM" foi o ponto de partida para uma inspirada actuação que contou com uma sala repleta e expectante, o que indicia que o número de fãs da banda continua a crescer (as vendas do novo disco também apontam para isso). Começando de forma ténue e discreta com o insinuante "I am AM", o tema instrumental que abre o disco, o grupo ofereceu uma prestação cuja intensidade foi aumentando progressivamente.

As primeiras canções da noite, tendencialmente apaziguadas e melancólicas, foram acompanhadas por um sóbrio e meticuloso trabalho de iluminação, gerando sem dificuldade uma acolhedora atmosfera intimista. Esta fase foi essencialmente dedicada às composições de "AM", introspectivas e serenas, como a excelente "Are You Near?", a melódica "Elisa" ou a enleante "Wallpaper". A apresentação das canções foi acompanhada pelas imagens de um ecrã de fundo que se adaptavam aos ritmos e tonalidades dos temas, exibindo uma curiosa interligação entre a vertente visual e sonora.

Apesar de interessantes, os momentos retirados de "AM" retratam uns The Gift demasiado iguais a si mesmos, onde os momentos do passado parecem repercutir-se de forma agradável mas não muito ousada. A explosão da noite deu-se, por isso, quando a banda se concentrou nos episódios de "FM", mais dinâmicos, enérgicos e aglutinadores de influências e territórios sonoros. "Driving You Slow", o primeiro single do novo álbum, resultou melhor ao vivo do que em disco e constituiu uma das ocasiões de maior empatia entre o grupo e o público.

"11.33", repleto de ambientes r&b e soul, deu ainda mais relevo à expressiva e característica voz de Sónia Tavares e congregou sonoridades até então pouco exploradas pelo grupo. A recepção não poderia ter sido mais calorosa, justificando a manobra de relativo risco ao incluir a canção no álbum. As esferas discretas da primeira parte do concerto deram então lugar à euforia e excitação, capitalizadas em momentos como o vibrante e complexo "Cube".

"AM-FM" possibilitou um cardápio de canções minuciosamente trabalhadas, não tão acessíveis como as de "Vinyl" nem tão uniformes e planas como as de "Film", aproximando o grupo de domínios aparentados de Bjork (a produção - sobretudo de "AM" - lembra a de "Vespertine"), dos Múm ou mesmo dos Postal Service (electrónica ultra-detalhada que não destrói, contudo, o formato canção e uma forte vertente emocional e melódica).


Mas como o melhor fica para o fim, revisitou-se um dos temas fundamentais de "Film", o intenso "Front Of". Brilhante canção, despoletadora de uma arrepiante e épica atmosfera, originou mais uma oportunidade para a voz de Sónia Tavares brilhar e contagiar. Depois da overdose de tensão de "Front Of", houve ainda tempo para recordar, nos encores, outro episódio-chave de "Film", a apelativa e festiva "Question of Love", com uma deliciosa energia descaradamente pop. "Red Lights" foi mais um excerto de "FM", mas o grupo regressaria ainda a "Film" com o hipnótico "So Free", a canção em três partes que disseminou uma viciante onda dançável pelo público e destacou-se como outro dos pontos de eleição da noite.


O concerto regressou, no segundo encore, à calmaria inicial com "Fácil de Entender", o único tema do novo disco cantado em português (e já agora, está escondido antes da primeira faixa de "AM"). Embora não fosse mal pensado recuperar alguns temas de "Vinyl" - e há muitos que o merecem -, a actuação dos The Gift constituiu um óptimo início de digressão, expondo uma banda que se apoia em canções sólidas, intrigantes e imaginativas não dispensando um irrepreensível trabalho a nível visual e cenográfico. O público não teve escolha senão render-se e apreciar as notáveis duas horas de concerto deste peculiar presente – dádiva, para muitos – oriundo de Alcobaça...

E O VEREDICTO É: 4/5 - MUITO BOM

quarta-feira, dezembro 08, 2004

1000...gonn1000

1000 visitas, um marco importante, por isso obrigado a todos os que visitaram o blog durante estes dois meses de existência (o primeiro post foi colocado a 8 de Outubro). Espero que sejam as primeiras 1000 de muitas, por isso voltem sempre, até porque os convites chegam para todos ;)

terça-feira, dezembro 07, 2004

DIGA "BOM DIA" COM OS PLUTO

Depois de um concerto - e que concerto!!! - dos Gift ontem no S. Luiz, outra (boa) banda lusa passa por Lisboa em breve...

Semi-descendentes de um dos mais saudosos grupos portugueses dos anos 90, os Pluto iniciam a digressão de apresentação do novo - e primeiro - álbum, "Bom Dia", na próxima quinta-feira, pelas 23h, no Santiago Alquimista, em Lisboa. Dia 16 será a vez do Porto, às 22h no Hard Club.

As comparações com os Ornatos Violeta são inevitáveis, embora os Pluto exibam uma vertente mais pesada e agreste, gerando um convincente de disco de rock cantado em português. A intensidade da voz e das letras de Manel Cruz é um dos elementos-chave do projecto, e o carisma da banda poderá ser testado ao vivo em breve. Prevêem-se duas "boas noites", e eu espero estar lá quinta-feira...

domingo, dezembro 05, 2004

SHARK TALE

As comparações a "Tubarão" (Jaws) e "O Projecto Blair Witch" (Blair With Project) deixavam alguma água na boca - passe a expressão - para o muito elogiado filme de Chris Kentis, uma obra de baixo orçamento com um espírito série-B.
"Open Water - Em Águas Profundas" narra a viagem de um jovem casal norte-americano rumo a um destino paradisíaco e foca a inusitada situação com que este se depara quando é abandonado, por acidente, a 20 milhas da costa. Entregues aos tubarões - e não só, há outras ameaças dignas de registo - Susan (Blanchard Ryan) e Daniel (Daniel Travis) tentam encontrar uma solução para este problema enquanto se esforçam por sobreviver. Em termos de argumento, "Open Water - Em Águas Profundas" não é muito mais do que isto, mas esta premissa é suficientemente curiosa para gerar um filme de suspense e terror psicológico.

Este projecto de Chris Kentis originou algum burburinho devido à não utilização de duplos ou efeitos especiais, colocando os actores à mercê dos tubarões que os circundavam.
Infelizmente, o filme é um dos casos onde a fama é superior ao proveito, pois a tensão e dose de assombro são bem menores do que o que havia sido anunciado.

Nota-se que esta é uma produção de escassos recursos, uma vez que os aspectos técnicos são minimalistas e apenas funcionais, elemento que se mantém nas interpretações competentes, mas sem grande carisma, da dupla protagonista. O ritmo nem sempre é eficaz, e a primeira meia-hora deste thriller arrasta-se sem proporcionar nenhum momento de considerável interesse. Embora a acção melhore na segunda metade do filme, raras são as sequências que conseguem criar uma atmosfera de tensão e pânico, tornando a narrativa enfadonha e pouco surpreendente.

O tom realista, cru e quase documental da película é uma lufada de ar fresco face à concorrência, que cada vez mais recorre a efeitos especiais e a perigos exagerados, mas os resultados que gera ficam aquém das expectativas (a interessante cena da tempestade nocturna, uma das poucas ocasiões intensas e intrigantes, é demasiado fugaz e mal aproveitada).

Baseado em factos verídicos, "Open Water - Em Águas Profundas" é uma obra escorreita que tem o mérito de tentar introduzir algo de novo no estafado género do thriller, mas as boas intenções não bastam e o filme mete mais água - literalmente - do que deveria, desperdiçando o seu potencial. Ainda assim, os fãs do género poderão encontrar aqui alguns motivos de interesse, sobretudo se as expectativas forem modestas.

E O VEREDICTO É: 1,5/5 - DISPENSÁVEL

MAIS BLINKS E LINKS

Era suposto ter escrito este post antes, mas como já não tenho tanto tempo para o blog vai só mesmo agora...Obrigado aos responsáveis pelos seguintes blogs/fotolog por me blinkarem:

Já agora, aproveito para agradecer também aos membros do Fórum Cinetuga que me escolheram como "Crítico do Mês" de Novembro. Vamos ver se mantenho a posição...:D

MARIDOS E MULHERES

Baseado em dois contos de Andre Dubus (We Don`t Live Here Anymore e Adultery), a segunda longa-metragem de John Curran aborda o quotidiano das relações conjugais, debruçando-se sobre a temática da traição e da infidelidade. Vencedor do Prémio Waldo Salt - Melhor Argumento no Festival de Sundance de 2004, "We Don`t Live Here Anymore - Desencontros" é mais um dos bons exemplos do cinema independente norte-americano que vai chegando, de forma mais ou menos discreta, a salas portuguesas.

Se outros méritos não tivesse, a película destaca-se de imediato pela carga de talento dos seus protagonistas, Mark Ruffalo, Laura Dern, Peter Krause (da série "Sete Palmos de Terra") e Naomi Watts, quatro nomes em ascensão no universo cinematográfico actual. Embora a obra não apresente nada realmente novo ou de superlativa criatividade - é mais uma perspectiva das dificuldades das relações humanas e da crise de afecto entre dois casais - consegue cativar e envolver devido à considerável química dos actores e à forma credível com que estes interpretam as suas personagens.

O argumento, sóbrio e suficientemente denso, capta as subtilezas do quotidiano e permite entrar no âmago da conturbada esfera emocional dos dois casais, expondo uma complexa teia de comportamentos onde a amizade, o amor e o companheirismo se misturam e confundem. Os apaziguados ambientes rurais do filme escondem uma atmosfera que contém um intenso turbilhão emocional, onde os limites das personagens são testados e a confiança se encontra não muito distante da traição.

Nem sempre é fácil compreender as motivações ou criar empatia com os dois casais, uma vez que o realizador coloca a nú as suas fragilidades e imperfeições, tornando-os, para o bem e para o mal, dolorosamente humanos e verosímeis. De resto, este é um dos pontos fortes do cinema independente norte-americano, que consegue surpreender devido aos soberbos estudos de personagem que frequentemente proporciona. Não é por acaso que alguns momentos de "We Don`t Live Here Anymore - Desencontros" demonstram paralelismos com os recentes "XX/XY", de Austin Chick, ou "Antes do Anoitecer" (Before Sunset), de Richard Linklater, outras meritórias incursões pelo espectro emocional de jovens adultos em crise.

Seco e absorvente, o filme desenrola-se a um ritmo lento, mas não entediante, uma vez que Curran guarda revelações suficientes para manter o interesse e fornece uma intocável direcção de actores (o par Ruffalo/Dern é particularmente excepcional). "We Don`t Live Here Anymore - Desencontros" não efectua o golpe de aza que lhe permita juntar-se às obras geniais, mas também não deixa de ser uma das mais refrescantes estreias do final de 2004, apresentando personagens de carne e osso. Um drama melancólico e consistente, sem excessos melodramáticos nem manobras de sedução fácil.

E O VEREDICTO É: 3,5/5 - BOM

sexta-feira, dezembro 03, 2004

UM PRESENTE DE ALCOBAÇA EM LISBOA

Com um novo disco editado há dias, os The Gift actuarão no Teatro Municipal S. Luiz, em Lisboa, na próxima segunda-feira, numa boa oportunidade para conhecer "AM/FM" ao vivo.

Um dos projectos musicais portugueses mais ousados e criativos, os The Gift encontram-se a promover o seu novo álbum duplo por todo o país.
Dia 6 de Dezembro, "AM/FM" será apresentado em Lisboa, no Teatro Municipal S. Luiz, pelas 21h. Sucessor dos bem-sucedidos "Vinyl" e "Film", o mais recente registo de originais do grupo aposta em múltiplos territórios sonoros, expondo uma mistura de pop, electrónica, rock e até algumas inéditas experiências por domínios r n`b.
Explorando formatos de índole clássica a par de composições mais experimentais, nuns momentos tendencialmente apaziguado e noutros dinâmico, "AM/FM" volta a exibir a vitalidade da banda de Alcobaça e o resultado poderá ser conferido ao vivo na próxima segunda-feira. E eu estou a contar ir :D

Teatro Municipal S. Luiz:
Rua António Maria Cardoso, 38
1200-027 Lisboa
Telefone: 213 257 650

quinta-feira, dezembro 02, 2004

ESTREIAS DA SEMANA - 2 A 8 DE DEZEMBRO

O épico "Alexandre, o Grande", o thriller "Ligação de Alto Risco" e o documentário "Autografia" são os novos filmes em salas nacionais esta semana.

Uma das obras cinematográficas mais aguardadas do final de 2004, "Alexandre, o Grande" (Alexander) marca o regresso de Oliver Stone à realização. Para além do nome do cineasta, o filme tem sido alvo de expectativa devido aos pesos-pesados do elenco, que inclui Colin Farrell (como protagonista), Angelina Jolie, Val Kilmer, Rosario Dawson e Anthony Hopkins. Centrado no percurso de um dos maiores conquistadores da História, "Alexandre, o Grande" possui potencial para se tornar num épico marcante, embora a recepção internacional não tenha sido a mais calorosa. O resultado pode ser avaliado a partir de hoje.

"Ligação de Alto Risco" (Cellular) foca as peripécias de um jovem que recebe uma inesperada chamada telefónica de uma mulher que desconhece e constata que é o único que pode salvar a sua vida. Dirigido por David R. Ellis, este thriller é protagonizado por Chris Evans, Kim Basinger e William H. Macy.

"Autografia", de Miguel Gonçalves Mendes, foi distinguido na última edição do doclisboa com o prémio de Melhor Documentário Português. Centrado na vida e obra do poeta e pintor Mario Cesariny, o filme dá continuidade à tendência de colocar os documentários no circuito comercial cinematográfico. Juntamente com a película, é exibida a curta-metragem "Momentos na Vida de um Poeta", de Carlos Calvé, com Mario Cesariny.

quarta-feira, dezembro 01, 2004

SOU??? ENTÃO ESTÁ BEM...





You Are a Snarky Blogger!



You've got a razor sharp wit that bloggers are secretly scared of.
And that's why they read your posts as often as they can!


Bem, como hoje não escrevi nada recorri a um post pré-fabricado (via Me, Myself and I)...E os feriados são para descansar, até porque amanhã será o meu primeiro dia de "trabalho a sério". Um daqueles dias que ficará marcado no meu calendário, portanto (pela positiva, espero)...

terça-feira, novembro 30, 2004

MOMENTOS MAIS SABOROSOS (?)

Uma atenta análise aos hábitos alimentares das sociedades ocidentais ou uma mera arma de arremesso contra a McDonald`s? O documentário "Super Size Me - 30 Dias de Fast Food" divide-se entre estas duas vertentes.

Num período em que o cinema documental tem recebido uma crescente atenção mediática (comprovado pelo sucesso de eventos como o doclisboa), "Super Size Me - 30 Dias de Fast Food", de Morgan Spurlock, é mais um dos exemplos do género que chega a salas nacionais em 2004. Vencedor do Prémio de Melhor Realizador no Festival de Sundance, o documentário tem gerado alguma polémica devido à abordagem dos malefícios da fast-food, traçando um retrato negro dos restaurantes que oferecem este tipo de alimentação (com um olhar particularmente incisivo e acusador sobre a McDonald`s).

Recentemente, cineastas que se movem dentro do género documental como Nicolas Philibert (Ser e Ter), Agnès Varda (Os Respigadores e a Respigadora) ou Catarina Mourão (Desassossego) têm tido algum sucesso junto de um público de considerável dimensão, mas o estilo de Morgan Spurlock assemelha-se mais ao tipo de discurso cáustico do controverso Michael Moore (Bowling for Columbine, Fahrenheit 9/11), uma vez que o realizador partilha da mesma apetência por uma componente lúdica caracterizada por algum humor negro e ironia.
Este aspecto faz com que "Super Size Me - 30 Dias de Fast Food" não se deixe levar muito a sério, começando logo pela premissa, onde o realizador se torna cobaia de uma experiência através da qual se alimentará exclusivamente de fast-food durante um mês. Os resultados desta dieta não são os mais saudáveis, minando a saúde de Spurlock a vários níveis - enjoos constantes, aumento do colesterol, obesidade, perturbação da potência sexual- e o realizador utiliza esses efeitos nocivos para criticar os malefícios do consumo deste tipo de comida (recorrendo, também, a testemunhos de médicos especializados).

Se o alerta para os cuidados a ter na alimentação é útil e necessário, o comportamento algo irresponsável Spurlock para o demonstrar - a McDonald`s é quase identificada como um alvo a abater e o realizador dá seguimento à sua dieta apesar dos avisos dos médicos e dos múltiplos vómitos - acaba por retirar alguma da força da análise.
De resto, muitos dos elementos do documentário apenas fazem sentido dentro da população dos EUA - o tão falado menu Super Size nem existe em Portugal -, embora o desvio dos princípios que orientam uma alimentação saudável ocorra a nível bem mais alargado. "Super Size Me - 30 Dias de Fast Food" revela-se mais pertinente quando aborda o tipo de refeições servidas nas escolas, já que, em momentos como esse, consegue afastar-se da lógica excessiva próxima dos postulados de Michael Moore ou de um formato parente dos reality-shows.

Contendo mais estilo do que substância, este projecto de Morgan Spurlock não deixa de fornecer algumas bases de reflexão acerca de questões relevantes das sociedades contemporâneas, mesmo sendo um pouco enjoativo e indigesto a espaços.
E O VEREDICTO É: 2,5/5 - RAZOÁVEL

NOSTALGIAAAAAAAAA...

Vai uma viagem sonora até 1998 para recordar dois dos melhores discos do ano??


segunda-feira, novembro 29, 2004

UNS ANJOS NA TERRA

Intolerância, novos modelos de família, SIDA, política, orientações sexuais, religião ou traição são alguns dos elementos-chave de "Anjos na América" (Angels in America), a surpreendente mini-série do canal norte-americano HBO. Baseado numa premiada peça teatral de Tony Kushner, o projecto foi adaptado ao grande ecrã pelo cineasta Mike Nichols e inclui na lista de protagonistas três dos mais conceituados actores do presente: Al Pacino, Meryl Streep e Emma Thompson. Igualmente meritórios são Justin Kirk, Ben Shenkman ou Patrick Wilson, alguns nomes não tão mediáticos mas de considerável talento.

"Anjos na América" desenrola-se no início dos anos 80 e retrata os primeiros momentos de disseminação da SIDA, doença que funciona como elemento de ligação dos protagonistas. Num período marcado pela administração de Reagan, uma complexa teia de personagens debate-se com a alvorada de novas mentalidades, o florescer da revolução sexual e um conturbado contexto pós-Guerra Fria, vivendo crises de identidade e fases de contínuo questionamento.


Nesta adaptação televisiva, Mike Nichols ultrapassa os limites do meio e proporciona momentos de pura excelência cinematográfica através de um rigoroso trabalho de realização com refrescantes técnicas narrativas. Misturando momentos de cru realismo com cenas de intensa carga onírica, Nichols concede a este projecto uma bizarra, mas muito original e intrigante atmosfera. Embora as sequências dos sonhos/visões das personagens sejam, a espaços, objecto de árdua análise e interpretação, possuem uma dimensão experimental rara nas linguagens televisivas actuais. Esta vontade de ultrapassar as formas convencionais aproxima "Anjos da América" de outras séries revolucionárias da televisão de hoje, como a carismática "Os Sopranos" (The Sopranos) ou a inexcedível "Sete Palmos de Terra" (Six Feet Under).

Com um denso ambiente fim-de-milénio, a narrativa da mini-série ora apresenta episódios de forte tensão dramática e emocional ora envereda por ocasiões de um áspero humor negro, mantendo um tom etéreo e alucinatório que antecipa a entrada num "admirável (?) mundo novo". O ritmo da acção nem sempre cativa, sendo ameaçado por cenas onde o desafio conceptual se confunde com pretensão, gerando momentos demasiado frios e herméticos. Contudo, quando resulta, oferece um poderoso estudo de personagens onde se abordam os conflitos da natureza humana mediante uma viagem pelos seus meandros mais recônditos e inóspitos. A brilhante direcção de actores ajuda, e a muito conseguida reconstituição de época torna o projecto ainda mais credível. De resto, Mike Nichols demonstra a sua mestria com cenas de admirável poesia visual, criando envolventes imagens dignas de antologia.

Bem escrita e soberbamente realizada, "Anjos na América" é um pequeno oásis num panorama televisivo cada vez mais formatado e pouco reluzente. Uma ousada mini-série a (re)descobrir.

E O VEREDICTO É: 3,5/5 - BOM (com tendência para subir num revisionamento)

OS ANJOS (NÃO, NÃO SÃO ESSES!!!)

Como, apesar de tudo, ainda há pequenos oásis no universo televisivo português, a 2: repete, durante esta semana pelas 23h, os seis episódios da mini-série "Anjos na América" (Angels in America), de Mike Nichols, uma das mais inovadoras produções da HBO. Surpreendente a nível visual, temático e narrativo, esta série de culto aborda o início da propagação da SIDA nos EUA dos anos 80. Entre os actores encontram-se Al Pacino, Meryl Streep e Emma Thompson, veteranos num elenco com alguns novos talentos...E mais não digo, o resto (re)descubram vocês (conselho de amigo)...

sábado, novembro 27, 2004

ISTO (NÃO) É NORMAL

Uma das bandas mais interessantes a trabalhar nos domínios da electrónica na recta final dos anos 90, os Gus Gus foram, também, uma das mais subvalorizadas. No entanto, "This is Normal", o segundo disco do colectivo, de 1999, eleva-se bem acima da mediania através de uma muito conseguida mistura de pop, house, techno, trip-hop, jazz, ambient e electro.

Apresentando uma complexa sonoridade fim-de-milénio, "This is Normal" é um álbum diversificado e intrigante, contendo sonoridades envolventes que rapidamente se tornam viciantes. Expondo vozes masculinas e femininas e contrastando-as com atmosferas glaciares, nocturnas e hipnóticas, o disco torna-se simultaneamente estranho e cativante. Essa estranheza verifica-se também nas letras das canções, ambíguas e incomuns, reforçando a peculiar personalidade da banda.

Começando por conquistar logo pela excelente capa - ou não fosse esta da editora 4AD, meticulosa e inovadora a nível gráfico - "This is Normal" proporciona uma viagem por ambientes futuristas, experimentais e sedutores, e entre os momentos de eleição salienta-se o contagiante electropop de "Starlovers", o denso e quase cinematográfico "Blue Mug", o delicado e subtil "Bambi", o enérgico e dançável "Love vs Hate" ou o negro e claustrofóbico "Snoozer".

Consistente, bem-estruturado e inovador, o segundo álbum dos Gus Gus é o melhor que o colectivo gerou até hoje. Os seus sucessores, "Gus Gus vs T-World", de 2000, e, sobretudo, o indistinto "Attention", de 2002, desiludiram ao não exibir os traços de criatividade de "This is Normal". O disco confirma também que a pop islandesa não se resume apenas aos Múm e aos (sobrevalorizados? Eu acho que sim) Bjork e Sigur Ros.

Um dos melhores exemplos da electrónica de finais de 90, para colocar ao lado de Massive Attack, Lamb, Morcheeba, Air, Tricky e Sneaker Pimps...

E O VEREDICTO É: 4/5 - MUITO BOM

REGRESSO AO PASSADO

Muitas vezes, no cinema e noutros domínios artísticos, a melhor forma de surpreender não nasce tanto da inovação mas antes da recuperação de marcas do passado, devidamente contextualizadas e adaptadas ao presente. "Sky Captain e o Mundo de Amanhã" (Sky Captain and the World of Tomorrow), embora inove em alguns aspectos - essencialmente nos visuais - assenta muito num tipo de cinema cuja fase áurea ocorreu nos anos 30 e que raramente encontra sucedâneos nos dias de hoje (pelo menos de forma tão óbvia e decalcada).

A narrativa do primeiro filme de Kerry Conran situa-se na Nova Iorque dos anos 30, não propriamente na do nosso mundo, mas na de um universo mais fantasioso, ingénuo e cartoonish. Um universo onde robôs gigantescos podem invadir cidades de forma abrupta, mas onde há também a esperança da salvação devido à coragem de intrépidos heróis.

As influências da película são as mais diversas - o tom despretensioso da série-B, o carácter lúdico dos comics norte-americanos, as atmosferas nostálgicas do cinema de aventura/ficção científica dos anos 30 - e remetem para um período mais cândido, embora algo maniqueísta e mesmo simplista à luz do que se faz hoje.

"Sky Captain e o Mundo de Amanhã" exibe traços do cinema clássico mas possui também a sofisticação das mais avançadas tecnologias digitais, aqui utilizadas para a criação dos impressionantes cenários artificiais (gerados através do blue screen, que possibilita a construção de espaços virtuais). Esta revisita do passado com tecnologias modernas torna o filme numa curiosa aventura retro-futurista, uma experiência invulgar num contexto de blockbusters formatados e pouco entusiasmantes. Kerry Conran oferece uma interessante componente visual nesta sua primeira obra, mas o argumento não exibe, infelizmente, tanta solidez e criatividade, desenrolando-se de forma demasiado previsível e convencional.

A linearidade da narrativa funciona, no entanto, como uma forma de homenagear algumas das obras da era dourada de Hollywood (que também apresentavam um ritmo escorreito e reduzida densidade emocional), às quais "Sky Captain e o Mundo de Amanhã" retira inspiração. As personagens seguem igualmente esses traços, desde o altruísta e audacioso Sky Captain (Jude Law, numa interpretação convincente) à curiosa e insinuante jornalista Polly Perkins (Gwyneth Paltrow, que incorpora mais uma loura fria e distante), passando pela muito breve participação de Franky Cook (Angelina Jolie, no papel de uma provocante e corajosa agente especial). O trio pode ser acusado de unidimensionalidade, mas o recurso ao estereótipo é intencional - e até justificável - numa obra desta índole.

"Sky Captain e o Mundo de Amanhã", com tanto de imaginativo como de banal, consegue acrescentar algum fôlego ao estafado cinema de aventuras, apresentando uma apelativa dimensão visual numa experiência cinematográfica que combina eficazmente acção, ficção científica, romance e humor (com piscadelas de olho às comédias screwball na divertida relação agridoce das personagens de Jude Law e Gwyneth Paltrow).

Um entretenimento competente, a espaços prodigioso, na linha das aventuras infanto-juvenis capazes de agradar a um público dos 7 aos 77. E talvez marque o início da saga de um novo herói (sem superpoderes) a adicionar à galeria onde se encontram James Bond, Indiana Jones e outros nomes míticos da cultura popular recente.

E O VEREDICTO É: 3/5 - BOM

sexta-feira, novembro 26, 2004

CRUELDADE INTOLERÁVEL

Vencedor do Booker Prize em 1998, "Amesterdão" (Amsterdam), de Ian McEwan, é um mordaz retrato da sociedade aristocrática britânica e um olhar sobre os efeitos da mentira, do egoísmo e da fama.

O livro foca a relação de dois amigos, Clive Linley, um conceituado compositor, e Vernon Halliday, editor de um influente jornal. Estas duas personagens encontram-se interligadas por Molly Lane, uma conhecida figura londrina cujo funeral despoleta o início da intriga. Ian McEwan aproveita esta cerimónia fúnebre para iniciar uma narrativa com tons de comédia negra e algum drama, debruçando-se sobre o eventual antagonismo entre a supremacia do ego e os valores ético-morais.

Apesar de Molly Lane ser o elemento de ligação entre as personagens principais deste romance - quase todas foram seus amantes -, McEwan não apresenta muitas informações acerca da sua vida ou dos factores que a tornaram tão carismática, não nos elucidando quanto aos motivos que a transformaram num alvo de tamanha admiração. Mesmo as restantes personagens carecem de maior caracterização e desenvolvimento, uma vez que, nos momentos que antecedem o desenlace, Clive e Vernon exibem comportamentos pouco fundamentados e algo contraditórios face ao que ocorreu anteriormente. McEwan compensa esta limitação com um argumento imprevisível, incluindo reviravoltas suficientes para manter o interesse, mas mesmo aí as personagens parecem ser apenas elementos despoletadores de acontecimentos e não agentes com vontade e motivações próprias.

O escasso número de páginas do romance - menos de 200 - poderá justificar parte da superficial densidade dramática das personagens, embora se esperasse um pouco mais de um autor que já provou - no intrigante e assombroso "O Jardim de Cimento" (The Cement Garden), por exemplo - conseguir mergulhar, de forma exímia, nas tensões e fragilidades humanas. O ritmo também nem sempre entusiasma, já que a primeira metade do livro se desenrola de forma demasiado lenta e, quando a narrativa se torna mais estimulante, é afectada por um final algo conturbado e não muito convincente.

Embora a esfera emocional dos seus protagonistas seja pouco aprofundada, "Amesterdão" proporciona algumas interessantes observações sobre os limites da amizade, os ambientes do jornalismo (e a ameaça da tabloidização, sobretudo tendo em conta que a acção se desenrola em Inglaterra), crispações políticas, o lado negro da fama ou o florescimento do processo de criação artística. Estes elementos conseguem cativar a atenção e promover alguma reflexão, mas não chegam para salvar a reduzida empatia gerada pelo duo protagonista (Clive, auto-indulgente e narcisista, e Vernon, implacável e vingativo). Se, por um lado, a dupla é adequada para um romance de contornos satíricos e irónicos como "Amesterdão", tem a desvantagem de não nos cativar, pelo que o seu destino nos é indiferente e irrelevante. Por isso, o livro torna-se cada vez mais frio e distante e, embora exiba curiosos episódios a espaços, não é a obra mais recomendável de um dos maiores escritores britânicos contemporâneos.

E O VEREDICTO É: 2/5 - RAZOÁVEL

VIBRAÇÃO, ENERGIA E ALMA ROCK

Ao sexto disco de originais, um dos nomes mais prestigiados do rock alternativo actual volta a convencer e a acrescentar mais um interessante capítulo a uma relativamente curta, mas versátil, carreira.

Figura ímpar no panorama musical de hoje, PJ Harvey tem conseguido captar as atenções de um público cada vez mais alargado sem nunca perder o respeito dos fiéis seguidores que a elogiam desde o início e a tornaram numa artista de culto. Essa aproximação a cenários mainstream verificou-se sobretudo em "Stories From the City, Stories From the Sea", de 2000, o seu álbum mais acessível, com uma considerável carga pop, mas nem por isso menos desafiante. "Uh Huh Her", o seu sucessor, revela-se menos directo e imediato, voltando a exibir marcas dos registos iniciais da cantora.

O primeiro single "The Letter" acentuou o regresso a um rock ríspido e potente, semelhante a alguns momentos de discos como "Dry" ou "Rid of Me", e parte dos restantes temas do novo álbum - "Who the Fuck", "Cat on the Wall - exibem essa visceralidade presente nos trabalhos de estreia de PJ Harvey. De resto, "Uh Huh Her" revisita muitas das etapas da discografia da artista, apresentando canções que não destoariam em discos anteriores. As etéreas e densas "It`s You" ou "The Desperate Kingdom of Love" relembram episódios do incontornável "To Bring You My Love", a hipnótica e atmosférica "The Slow Drug" revisita os ambientes claustrofóbicos de "Is This Desire?" e as belíssimas "Shame" e "You Came Through" seguem as tonalidades mais melódicas e apelativas de "Stories From the City, Stories From the Sea".

Esta ligação de "Uh Huh Her" a marcas sonoras do passado não esgota, contudo, o disco num mero exercício de "mais do mesmo", uma vez que a maioria dos temas são suficientemente consistentes para ultrapassarem essa limitação. O problema é que, por vezes, o álbum parece demasiado fragmentado e pouco coeso, dada a diversidade de domínios contrastantes das canções. Apesar de sólido, "Uh Hur Her" não consegue, por isso, ser tão forte e contagiante como alguns dos seus antecessores, sendo penalizado por alguma falta de fluidez. Mesmo assim, há por aqui consideráveis doses de surpresa e inquietação que justificam múltiplas audições, comprovando a vitalidade de PJ Harvey e da sua peculiar amálgama de rock, blues, pop, indie e punk.

E O VEREDICTO É: 3,5/5 - BOM

quinta-feira, novembro 25, 2004

ESTREIAS DA SEMANA - 25 DE NOVEMBRO A 1 DE DEZEMBRO

"Nicotina", "The Incredibles: Os Super Heróis", "Open Water - Em Águas Profundas", "História de Marie e Julien", "Lealdade Traída", "A Costa dos Murmúrios" e "O Apartamento" são as estreias cinematográficas da semana.

"Nicotina", de Hugo Rodríguez, apresenta as interligações de nove personagens na Cidade do México, numa história que envolve criminosos, reviravoltas e muito humor negro. Já comparado a "Snatch - Porcos e Diamantes", de Guy Ritchie, ou "Amor Cão" (Amores Perros), de Alejandro Gonzalez Iñarritu, "Nicotina" tem Diego Luna como protagonista (um dos novos valores mexicanos, a par de Gael Garcia Bernal).

"The Incredibles: Os Super Heróis" é mais uma longa-metragem de animação com a marca de qualidade da Pixar. Desta vez, a acção centra-se numa família de super-heróis e nas peripécias mirabolantes que terão de enfrentar. Brad Bird realiza esta película que promete.

"Open Water - Em Águas Profundas" relata as experiências de um casal que, devido a um imprevisto, fica isolado nos mares das Caraíbas. O duo terá de resistir às ameaças climatéricas e à intensa circulação de tubarões. Esta obra de Chris Kentis foi um dos filmes independentes mais elogiados do ano nos EUA, distinguindo-se pelo seu realismo e recurso a poucos meios. Já vi e não acho que mereça o hype e a grande percentagem de críticas positivas a nível internacional...Em breve falo mais do filme.

"História de Marie e Julien" (Histoire de Marie et Julien) é o mais recente filme de Jacques Rivette e foca uma história de amor, segredos e chantagens, dando continuidade aos olhares do realizador sobre as relações humanas. Emmanuelle Béart encontra-se entre as protagonistas deste drama.

"Lealdade Traída" (A Different Loyalty) baseia-se na experiência verídica de uma mulher que descobre que o seu marido trabalha para os serviços secretos. Dirigido por Marek Kanievska, esta amálgama de romance e espionagem inclui Sharon Stone e Rupert Everett entre os nomes do elenco.

"A Costa dos Murmúrios" inspira-se no romance homónimo de Lídia Jorge e apresenta uma perspectiva sobre os efeitos da guerra colonial, focando a conturbada relação amorosa de um jovem que cumpre o serviço militar e da sua namorada que o visita em Moçambique. Beatriz Batarda, Filipe Duarte, Adriano Luz, Mónica Calle são alguns dos actores deste filme de Margarida Cardoso.

"O Apartamento" (Wicker Park) é uma nova versão "L` Appartement", de 1996, realizado por Gilles Mimouni e protagonizado pelo casal Vincent Cassel/ Monica Bellucci. Paul McGuigan adapta a história aos EUA dos dias de hoje e narra as convulsões amorosas de um jovem nesta mistura de drama e thriller. Josh Hartnett e Diane Kruger constituem a dupla central.

quarta-feira, novembro 24, 2004

UM SALÃO COM 15 MINUTOS DE FAMA

23 horas. Levantamos os bilhetes e vamos beber um refrigerante no Café dos Teatros, no Teatro Municipal São Luiz.

23:15. Instalamo-nos numa das várias mesas de esplanada dispostas pelo Jardim de Inverno para assistir à comédia “Celadon”, com as "chalaceiras" Ana Bola e Maria Rueff. Enquanto aguardamos temos oportunidade de notar que, depois de dois meses de representações, a sala ainda se encontra repleta de espectadores, a confirmar a admiração de muitos pela curiosa dupla de actrizes. Ao fundo, no palco, há apenas um balcão onde está simplesmente escrito “Celadon”, as paredes laterais reflectem listas de várias cores, efeito da projecção das luzes que aí incidem, e a última lista contém imagens de jovens - obrigatoriamente fashion - a deambularem num fundo branco, e mais tarde percebemos que estas imagens sugerem a circulação de pessoas num centro comercial (ou melhor, num Fórum, que é sempre mais sofisticado e selectivo, onde até é preciso ir de carro).

23:30. Anuncia-se que o espectáculo vai começar e avisa-se que não é permitido captar imagens. É então que se houve algum barulho atrás de nós e reparamos que está a entrar a pitoresca Denise de Magalhães (Ana Bola) acompanhada pela sua recente assistente no seu salão de nails – Celadon – a madeirense Maria Delfina Caroço (Maria Rueff). Estas duas figuras, com penteados exuberantes, socas de saltos altíssimos e vestimentas igualmente sugestivas, chamando a nossa atenção para os "glúteos" ou "nádias" da chefona Denise, devem ter acabado de tomar uma refeição no Fórum onde trabalham, uma vez que cada uma traz um tabuleiro da fast-food, o qual deixam cair, Denise por instinto e Delfina por imitação.

Acontece de tudo um pouco neste salão de nails excepto aquilo que supostamente era óbvio fazer-se: trabalhar. Denise sabe muito bem inventar histórias, na verdade é fácil acreditar nela, consegue encarnar o estilo necessário para ser uma “tia” e é isso que ambiciona ser, viver nas festas, ser famosa e aparecer na revista “Trombas”. Delfina também tem tudo para ser famosa. Tal como a sua patroa, também não sabe fazer nada para além de nails - embora, vá lá, consiga trabalhá-las em porcelana, em gel, com ou sem piercing,…- nem sequer pensar. Querem alguém com melhor perfil para ser famoso em Portugal e posar para as fotos das incontáveis revistas à disposição num qualquer salão de cabeleireiro ou no lar de uma dona de casa que se preze?

A encenação (de António Pires) é adequada, até porque as actrizes conseguem transmitir eficazmente as peculiaridades do espaço através de uma competente e carismática representação. Guarda-roupa e cabelos igualmente fantásticos, ajudando muito para que esta comédia portuguesa - apesar dos muitos estrangeirismos, ou melhor, neologismos constantemente debitados por Denise - produza os seus efeitos. E, para o género de espectáculo que é, poder ser visto num café-teatro, de uma maneira descontraída, fumando um cigarro e tomando alguma coisa, faz com que os espectadores se libertem e consigam tirar proveito do que estão a assistir.

Uma peça mais divertida do que interessante, nada de surpreendente ou particularmente inesperado. Gera diversas gargalhadas – o público deliciou-se em múltiplas ocasiões - mas estas actrizes nem sempre conseguem dissociar-se das personagens que representam há alguns anos, pelo que “Celadon” pode descrever-se como um misto do humor algo corriqueiro e previsível dos sketches recentes apresentados no Herman Sic e de uma refrescante dose de nonsense digna dos melhores laivos de inspiração das Produções Fictícias (o texto, contudo, é da autoria de Ana Bola).

Com uma boa disposição suficientemente contagiante e um considerável espírito crítico – a fama em destaque, mais uma vez - “Celadon” consegue gerar momentos de antologia, como o relato da vida do azarado pai de Delfina ou a minuciosa e divertida descrição da festa de VIPs, da qual Denise foi (só acredita quem quer) espectadora. Entretenimento garantido.

E O VEREDICTO É: 3/5 - BOM

Qui a Sáb: 23h30 - Teatro Municipal S. Luiz:

Jardim de Inverno Rua António Maria Cardoso, 601200-027 Lisboa Telefone: 213 257 650

Artigo escrito por mim e pelo Olarques acerca do espectáculo da passada quinta-feira.