sexta-feira, agosto 24, 2007

MILAGRES PRECISAM-SE

Steve Carrell é um dos nomes que se tem distinguido na comédia norte-americana recente, acumulando elogios tanto do público como da crítica ao longo de uma carreira que tem ganho consistência em filmes como "Virgem aos 40 Anos", "Uma Família à Beira de um Ataque de Nervos" ou a versão americana da série "The Office".

"Evan, O Todo-Poderoso" (Evan Almighty), contudo, é um dos títulos em que o seu talento surge mais desaproveitado, mal empregue numa comédia com raros (ou mesmo nulos) momentos de humor conseguido e assente num argumento tosco e preguiçoso. Pegando nos pressupostos de "Bruce, O Todo-Poderoso", protagonizado por Jim Carrey, Tom Shadyac conta aqui uma nova versão da parábola bíblica da Arca de Noé, sendo que agora o papel de construtor da mesma cabe a Evan, um congressista recém-eleito que, após mudar com a família para uma casa luxuosa, percebe que os seus novos desafios profissionais serão os menos problemáticos com que se irá deparar.

Inicialmente o protagonista não leva a sério a missão que lhe é incumbida por Deus, com quem vai dialogando em várias ocasiões inesperadas e cuja identidade coloca em causa, mas aos poucos vai verificando que as suas recomendações não só fazem sentido como devem ser cautelosamente seguidas. Por isso, à medida que vários casais de diversas espécies de animais começam a instalar-se perto da sua casa, Evan decide começar a construir a Arca, tarefa que o coloca no epicentro de um considerável aparato mediático e de uma não menos densa crise familiar e profissional.

"Evan, O Todo-Poderoso" é vendido como uma comédia embora não passe de uma inconsequente lição de moral onde a subtileza e a complexidade não marcam presença, investindo num tom ligeiro durante parte da sua duração e tornando-se mais constrangedor quando adopta um tom sério e despropositado. Os gags ora investem num slapstick infantil e forçado ora em one liners de pouca graça, e chega a ser penoso aguentar tantas doses de tropeções, embaraços e escatologia servidos sem qualquer sentido de timing cómico.
As personagens já seriam fracas para uma sitcom indistinta, e limitam-se a passear de cena em cena sem que ganhem qualquer espessura, sendo pouco mais do que cabeças falantes. É certo que há um esforço para que o protagonista ganhe alguma densidade, mas à custa de uma débil gestão da carga dramática, derrapando num sentimentalismo incómodo e enjoativo. Pior estão os seus três filhos, que não chegam a ganhar qualquer personalidade ou função, e o antagonista é um concentrado de lugares comuns na caracterização de políticos fraudulentos.

Shadyac nunca decide se se dirige a crianças ou adultos, oferecendo uma falhada comédia familiar que não merecia os competentes efeitos especiais nem alguns bons actores - além de Carrell, há Morgan Freeman na pele de Deus ou a discreta Lauren Graham como esposa do protagonista, que passa o filme sem ter o que fazer. Nada muito inesperado considerando a filmografia do realizador, que entre outros títulos pouco memoráveis inclui "Patch Adams", "O Professor Chanfrado" ou "O Mentiroso Compulsivo".
Com tantos bons filmes que chegam a Portugal só em DVD (quando chegam), "Evan, O Todo-Poderoso" tem honras de estreia mas está a um nível qualitativo tão raso como os mais anódinos subprodutos que invadem a programação televisiva aos fins-de-semana à tarde. Mais vale, assim, apanhá-lo por lá daqui a uns tempos (se tiver mesmo que ser), uma vez que até os fãs mais acérrimos do actor principal correrão o risco de saírem desiludidos depois de o verem descer tanto a fasquia. É que Evan, apesar de ser Todo Poderoso, não consegue fazer milagres, embora o filme precisasse muito de um.

E O VEREDICTO É: 1/5 - DISPENSÁVEL

4 comentários:

Anónimo disse...

o realizador, que entre outros títulos pouco memoráveis inclui "Patch Adams", "O Mentiroso Compulsivo". nao concordo com a colocaçao deste evan banal e desinteressante "tvi a tarde" com patch Adamns assim como o Mentiroso compulsivo q é uma comedia mt melhor conseguida q esta

gonn1000 disse...

Sim, também acho que esses dois são um pouco melhores, mas ainda assim filmes sem nada muito recomendável.

Anónimo disse...

nao sao filmes de culto, mas sao filmes bons de ver. ha q fazer a distinçao entre os concebidos para tranmitirem mensagens e abordarem temas complexos, onde geralmente se encontram os "grandes filmes". mas se no nosso dia a dia(pelo menos eu), nao tenho a capacidade para esses filmes q nos deixam alguma coisa em q pensar ou nos fazem sair da sala a dizer comentar o q vimos. isto tudo para dizer que dentro do genero "nao tem especialmente interesse", devia haver uma classificaçao para "filmes bons de ver para desanuviar", sem serem automaticamente dispensaveis.
é apenas a opiniao de um frequentador do blog, do qual tenho o maior respeito pelo q tens construido.

gonn1000 disse...

Não acho que um filme que apenas pretenda funcionar enquanto entretenimento seja "automaticamente dispensável", o problema é que este "Evan, o Todo Poderoso" falha também nesse aspecto, já que de boa comédia pouco tem, perdendo-se em gags infantis (sim, os de "O Mentiroso Complusivo" eram melhores, embora já tenha visto o filme há anos). Por exemplo, de filmes recentes achei que "Paranóia" se saía muito melhor enquanto entretenimento "para desanuviar", não tem grandes pretensões mas funciona bem.
E obrigado :)