sexta-feira, abril 08, 2005

A VIDA DESTE RAPAZ

Pierre (Manuel Blanc) é um jovem francês de um meio rural que viaja para Paris em busca de uma vida mais profícua e entusiasmante, tentando fugir às escassas expectativas que a sua terra natal lhe proporciona. Idealista e algo ingénuo, chega à capital de França sem nenhum plano definido, limitando-se a seguir os desígnios do acaso e as oportunidades que lhe surgem naturalmente.

No entanto, Pierre rapidamente percebe que a experiência urbana por que tanto ansiava não se revela assim tão promissora, e múltiplas dificuldades começam a surgir, tornando a sua subsistência cada vez mais conturbada. Embora tivesse o sonho de se tornar actor, o jovem é confrontado com uma cruel e complexa realidade que torna a sua ambição numa miragem, sendo forçado a aceitar empregos precários para sobreviver.

Em “Não Dou Beijos” (J’ Embrasse Pas), André Techiné narra assim uma amarga estória sobre a perda da inocência e os últimos dias da adolescência, apresentando os inúmeros desafios, contrastes e complexidades que marcam a chegada à idade adulta.

Neste denso estudo de personagem, o cineasta foca uma abrupta espiral descendente onde um jovem entra no mundo da prostituição quando se depara com a inexistência de outras alternativas viáveis. Pelo seu caminho, passam uma neurótica mulher mais velha, um homossexual de meia-idade e uma jovem prostituta (ironicamente inatingível) por quem Pierre se apaixona (e terá que lidar com as penosas consequências).

Estas inéditas e imprevistas relações geram uma dolorosa dilaceração emocional no protagonista, lançando-o numa esfera de individualismo, desespero, pânico e alienação, obrigando-o a enfrentar o mundo sozinho pela primeira vez.

Apesar de conter uma narrativa com quebras de ritmo e de demorar demasiado tempo a arrancar, “Não Dou Beijos” é, ainda assim, um dos melhores filmes que Techiné assinou na década de 90 (data de 1991), bem mais absorvente do que títulos algo indistintos como “Longe” ou “Alice e Martin”.

Ao contrário do que sucede em obras como “Os Tempos que Mudam”, aqui o cineasta não se perde em múltiplas personagens, debruçando-se sobre o protagonista e oferecendo um retrato credível, profundo e tridimensional deste.

A realização possui as cargas necessárias de realismo e secura, despoletando uma intrigante aura soturna e negra, e a direcção de actores revela-se igualmente acertada (em particular pela escolha de Philippe Noiret, Emmanuelle Béart e, sobretudo, do exímio Manuel Blanc, que apresenta uma surpreendente transfiguração).

“Não Dou Beijos” está um pouco abaixo de “Os Juncos Silvestres”, a referência incontornável de Techiné nos anos 90, mas, tal como esse emblemático filme, contém uma fulgurante reflexão sobre o crescimento, as orientações sexuais, os laços familiares e a identidade, tornando-se numa película a reter.

E O VEREDICTO É: 3/5 - BOM

5 comentários:

Gustavo H.R. disse...

Techiné? De ALICE & MARTIN?
Acredito que a produção com Binoche tenha aportado na América há uns 6 anos. O mercado brasileiro/europeu/asiático de filmes aqui no país é cada vez mais suplantado pelo norte-americano.

Anónimo disse...

Techiné? De ALICE & MARTIN?


esse mesmo. j'adore :)

becksfan

gonn1000 disse...

É o próprio. Pois, por aqui o mercado americano também domina, mas de vez em quando há saudáveis alternativas :)

magnolias_forever disse...

Olá,

Consigo encontrar este filme em aluguer???..

Gostei do blog :)

mi

gonn1000 disse...

Não deve ser fácil de encontrar nos clubes de vídeo, mas será reexibido no cinema King nesta quinta...Se estiveres curioso, aproveita:)