Uma das surpresas do último festival de Sundance, "Uma Família à Beira de um Ataque de Nervos" (Little Miss Sunshine) tem tido uma recepção crítica francamante positiva, tanto a nível internacional como nacional, e se esta estreia nas longas-metragens de Jonathan Dayton e Valerie Faris, casal de realizadores com experiência nos videoclips, tem méritos mais do que suficientes para justificar vários elogios, não é menos verdade que entre estes não se encontra propriamente a reinvenção de códigos que têm começado a formatar o cinema independente norte-americano.
Esta dramedy on the road segue a viagem de uma família (disfuncional, como não poderia deixar de ser) que se desloca numa velha carrinha até à Califórnia para que a filha mais nova, Olive, possa concorrer a um concurso de beleza para crianças. Entre a partida e a chegada, surgem uma série de peripécias através das quais os ténues elos de ligação serão reforçados, levando a que todos os elementos contribuam, voluntária ou acidentalmente, para que a família se torne mais coesa e unida.
Esta dramedy on the road segue a viagem de uma família (disfuncional, como não poderia deixar de ser) que se desloca numa velha carrinha até à Califórnia para que a filha mais nova, Olive, possa concorrer a um concurso de beleza para crianças. Entre a partida e a chegada, surgem uma série de peripécias através das quais os ténues elos de ligação serão reforçados, levando a que todos os elementos contribuam, voluntária ou acidentalmente, para que a família se torne mais coesa e unida.
Se o desenvolvimento desta premissa é geralmente previsível, as personagens não são muito mais surpreendentes, constituíndo uma galeria de outcasts à medida daqueles que o cinema indie tanto tende a privilegiar.
Desde o pai, obcecado pelo sucesso e cujo livro sobre os novos passos para o atingir está prestes a ser editado; passando pelo filho adolescente, em voto de silêncio até conseguir entrar para a escola de aviação; pelo avô, viciado em heroína e de temperamento difícil; ou pelo tio homossexual e especialista em Proust, que tenta reorganizar a sua vida após uma tentativa de suicídio; não faltam aqui protagonistas dominados por alguma bizarria. As excepções acabam por ser as figuras femininas, tanto a mãe, que se esforça por fazer com que a família não desmorone, como a pequena filha, optimista e entregue ao sonho de ganhar o título de "Little Miss Sunshine".
Estas personagens geram uma dinâmica curiosa, mas individualmente é raro ultrapassarem a caricatura, sendo pouco mais do que variações de arquétipos do loser excêntrico em que o cinema independente norte-americano se tem alicerçado.
Felizmente, a direcção de actores joga a seu favor, já que Greg Kinnear, Toni Collette, Steve Carell, Abigail Breslin, Paul Dano e Alan Arkin apresentam interpretações sem falhas que conseguem compensar, pelo menos em parte, a bidimensionalidade a que o argumento de "Uma Família à Beira de um Ataque de Nervos" sujeita os seus papéis, dotando o filme de um dos elencos mais invejáveis do ano. Carrell e Dano são particularmente bem-sucedidos, o primeiro nos antípodas da personagem que o ajudou a celebrizar-se em "Virgem aos Quarenta Anos" e o segundo a mostrar talento e versatilidade depois da boa impressão deixada por "L.I.E. - Sem Saída" e "A Balada de Jack e Rose".
O carisma do elenco é responsável por grande parte do apelo do filme, mas o argumento de Michael Arndt também tem tem mérito ao enveredar por territórios reconhecíveis sem se limitar a repisar lugares-comuns, conseguindo mesmo inverter as expectativas a espaços. Pontualmente escorrega no tom, como nas sequências do hospital e nas que estão dependentes desta (mais apropriadas a filmes como "Fim-de-Semana com o Morto"), contudo a combinação de comédia com drama é quase sempre feita com engenho, exigência e, mais importante, alma, oferecendo algumas cenas ora hilariantes (os gags da buzina são de antologia) ora desencantadas (como nas da revolta da personagem de Dano).
A crítica ao culto do sucesso em terras do tio Sam não é muito subtil nem sequer original (um concurso de beleza é um alvo demasiado fácil) e na segunda metade do filme o auge da união familiar mistura-se com a defesa de uma questionável irreverência desmedida, mas reconheça-se que, não obstante os seus defeitos e a opção pelo template indie, "Uma Família à Beira de um Ataque de Nervos" irradia um encanto próprio e é um dos mais saborosos feelgood movies dos últimos tempos. Não revoluciona, mas é uma primeira obra muito promissora.
E O VEREDICTO É: 3,5/5 - BOM
Desde o pai, obcecado pelo sucesso e cujo livro sobre os novos passos para o atingir está prestes a ser editado; passando pelo filho adolescente, em voto de silêncio até conseguir entrar para a escola de aviação; pelo avô, viciado em heroína e de temperamento difícil; ou pelo tio homossexual e especialista em Proust, que tenta reorganizar a sua vida após uma tentativa de suicídio; não faltam aqui protagonistas dominados por alguma bizarria. As excepções acabam por ser as figuras femininas, tanto a mãe, que se esforça por fazer com que a família não desmorone, como a pequena filha, optimista e entregue ao sonho de ganhar o título de "Little Miss Sunshine".
Estas personagens geram uma dinâmica curiosa, mas individualmente é raro ultrapassarem a caricatura, sendo pouco mais do que variações de arquétipos do loser excêntrico em que o cinema independente norte-americano se tem alicerçado.
Felizmente, a direcção de actores joga a seu favor, já que Greg Kinnear, Toni Collette, Steve Carell, Abigail Breslin, Paul Dano e Alan Arkin apresentam interpretações sem falhas que conseguem compensar, pelo menos em parte, a bidimensionalidade a que o argumento de "Uma Família à Beira de um Ataque de Nervos" sujeita os seus papéis, dotando o filme de um dos elencos mais invejáveis do ano. Carrell e Dano são particularmente bem-sucedidos, o primeiro nos antípodas da personagem que o ajudou a celebrizar-se em "Virgem aos Quarenta Anos" e o segundo a mostrar talento e versatilidade depois da boa impressão deixada por "L.I.E. - Sem Saída" e "A Balada de Jack e Rose".
O carisma do elenco é responsável por grande parte do apelo do filme, mas o argumento de Michael Arndt também tem tem mérito ao enveredar por territórios reconhecíveis sem se limitar a repisar lugares-comuns, conseguindo mesmo inverter as expectativas a espaços. Pontualmente escorrega no tom, como nas sequências do hospital e nas que estão dependentes desta (mais apropriadas a filmes como "Fim-de-Semana com o Morto"), contudo a combinação de comédia com drama é quase sempre feita com engenho, exigência e, mais importante, alma, oferecendo algumas cenas ora hilariantes (os gags da buzina são de antologia) ora desencantadas (como nas da revolta da personagem de Dano).
A crítica ao culto do sucesso em terras do tio Sam não é muito subtil nem sequer original (um concurso de beleza é um alvo demasiado fácil) e na segunda metade do filme o auge da união familiar mistura-se com a defesa de uma questionável irreverência desmedida, mas reconheça-se que, não obstante os seus defeitos e a opção pelo template indie, "Uma Família à Beira de um Ataque de Nervos" irradia um encanto próprio e é um dos mais saborosos feelgood movies dos últimos tempos. Não revoluciona, mas é uma primeira obra muito promissora.
E O VEREDICTO É: 3,5/5 - BOM
13 comentários:
Para mim é um dos melhores filmes do ano. Bom roteiro, ótimo elenco e trilha sonora excelente (Sufjan Stevens e DeVotchka)
Gostei, é um filme cativante e bem feito mas não inventa nada.
A crítica é mais do que subtil, Gonn. Um filme que visita os mitos americanos - à boa maneira dos mavericks de '70 - merece palmas. Um filme que constrói uma narrativa coerente como esta partindo de um grupo disfuncional, merece elogios. Um filme dotado de conta, peso e medido, merce ovação. Tudo isto se pode dizer deste Little Miss Sunshine. É mais do que bom, claro está. Digo eu...
Gostei bastante e acho que é impossível não gostarmos daquela família :P
Hugo Alves: O grupo é disfuncional, mas pouco original, reutilizando clichés indie que já começam a cansar. O filme merece palmas, sim, mas com conta, peso e medida, é bom mas falta-lhe o toque de génio para ser extraordinário.
Joana C.: É uma boa surpresa, mas não muito marcante.
Refrescante... Imperdível... Hilariante... Intelectual. Um dos melhores do ano.
Bem, parece que estou em minoria :)
É mesmo um dos filminhos do ANO!
É um bom filminho, mas...
Acho que estás mesmo em minoria ;)
Oh well... :)
fui ver nestes dias este excelente filme... e como me divirto com a previsibilidade das criticas deste senhor goon, pensei eu :" vamos lá ver o quanto ele falou mal do filme". E não me enganei. Entre outras pérolas, gostei especialmente quando afirma que os personagens raramente ultrapassam a caricatura. Não me parece, eles tornam-se mais reais e proximos de nós exactamente porque oscilam entre o louco e os laivos de consciência que demonstram. Este senhor goon a escrever é que raramente ultrapassa a caricatura. Pra este senhor um filme BOM nunca será feito...porque seria um insulto à sua inteligência.
"(...) não obstante os seus defeitos e a opção pelo template indie, "Uma Família à Beira de um Ataque de Nervos" irradia um encanto próprio e é um dos mais saborosos feelgood movies dos últimos tempos. Não revoluciona, mas é uma primeira obra muito promissora."
De facto, deitei o filme abaixo... Eu sei que comentaste anonimamente, mas mesmo assim escusavas de te sujeitar a figuras dessas, não?
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