sexta-feira, dezembro 10, 2004

UM PRESENTE DE ALCOBAÇA EM LISBOA

Aguardado por muitos com grande expectativa, o concerto dos The Gift na noite de 6 de Dezembro no Teatro S. Luiz comprovou que o novo álbum da banda passou com distinção no teste inicial, neste que foi um dos primeiros espectáculos da digressão. Depois da surpresa que foi "Vinyl", em 1998, e da confirmação em "Film", de 2001, o grupo de Alcobaça prova que é um dos mais cativantes e engenhosos projectos musicais portugueses.

O recente disco duplo "AM-FM" foi o ponto de partida para uma inspirada actuação que contou com uma sala repleta e expectante, o que indicia que o número de fãs da banda continua a crescer (as vendas do novo disco também apontam para isso). Começando de forma ténue e discreta com o insinuante "I am AM", o tema instrumental que abre o disco, o grupo ofereceu uma prestação cuja intensidade foi aumentando progressivamente.

As primeiras canções da noite, tendencialmente apaziguadas e melancólicas, foram acompanhadas por um sóbrio e meticuloso trabalho de iluminação, gerando sem dificuldade uma acolhedora atmosfera intimista. Esta fase foi essencialmente dedicada às composições de "AM", introspectivas e serenas, como a excelente "Are You Near?", a melódica "Elisa" ou a enleante "Wallpaper". A apresentação das canções foi acompanhada pelas imagens de um ecrã de fundo que se adaptavam aos ritmos e tonalidades dos temas, exibindo uma curiosa interligação entre a vertente visual e sonora.

Apesar de interessantes, os momentos retirados de "AM" retratam uns The Gift demasiado iguais a si mesmos, onde os momentos do passado parecem repercutir-se de forma agradável mas não muito ousada. A explosão da noite deu-se, por isso, quando a banda se concentrou nos episódios de "FM", mais dinâmicos, enérgicos e aglutinadores de influências e territórios sonoros. "Driving You Slow", o primeiro single do novo álbum, resultou melhor ao vivo do que em disco e constituiu uma das ocasiões de maior empatia entre o grupo e o público.

"11.33", repleto de ambientes r&b e soul, deu ainda mais relevo à expressiva e característica voz de Sónia Tavares e congregou sonoridades até então pouco exploradas pelo grupo. A recepção não poderia ter sido mais calorosa, justificando a manobra de relativo risco ao incluir a canção no álbum. As esferas discretas da primeira parte do concerto deram então lugar à euforia e excitação, capitalizadas em momentos como o vibrante e complexo "Cube".

"AM-FM" possibilitou um cardápio de canções minuciosamente trabalhadas, não tão acessíveis como as de "Vinyl" nem tão uniformes e planas como as de "Film", aproximando o grupo de domínios aparentados de Bjork (a produção - sobretudo de "AM" - lembra a de "Vespertine"), dos Múm ou mesmo dos Postal Service (electrónica ultra-detalhada que não destrói, contudo, o formato canção e uma forte vertente emocional e melódica).


Mas como o melhor fica para o fim, revisitou-se um dos temas fundamentais de "Film", o intenso "Front Of". Brilhante canção, despoletadora de uma arrepiante e épica atmosfera, originou mais uma oportunidade para a voz de Sónia Tavares brilhar e contagiar. Depois da overdose de tensão de "Front Of", houve ainda tempo para recordar, nos encores, outro episódio-chave de "Film", a apelativa e festiva "Question of Love", com uma deliciosa energia descaradamente pop. "Red Lights" foi mais um excerto de "FM", mas o grupo regressaria ainda a "Film" com o hipnótico "So Free", a canção em três partes que disseminou uma viciante onda dançável pelo público e destacou-se como outro dos pontos de eleição da noite.


O concerto regressou, no segundo encore, à calmaria inicial com "Fácil de Entender", o único tema do novo disco cantado em português (e já agora, está escondido antes da primeira faixa de "AM"). Embora não fosse mal pensado recuperar alguns temas de "Vinyl" - e há muitos que o merecem -, a actuação dos The Gift constituiu um óptimo início de digressão, expondo uma banda que se apoia em canções sólidas, intrigantes e imaginativas não dispensando um irrepreensível trabalho a nível visual e cenográfico. O público não teve escolha senão render-se e apreciar as notáveis duas horas de concerto deste peculiar presente – dádiva, para muitos – oriundo de Alcobaça...

E O VEREDICTO É: 4/5 - MUITO BOM

1 comentário:

gonn1000 disse...

Obrigado:)
Também costumo passar pelo(s) teu(s) blog(s) de música regularmente...

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