quarta-feira, abril 25, 2007

NOITES SUBURBANAS

A proposta não parece, à partida, trazer nada de novo: relatar o quotidiano de um grupo de jovens dos subúrbios entre o fim da adolescência e o início da idade adulta, que enquanto se decidem quanto ao seu futuro vão aceitando empregos em restaurantes de comida rápida ou clubes de vídeo. Esta premissa tanto poderia ser a do livro "Geração X" de Douglas Coupland ou a do filme "Slacker" de Richard Linklater, entre outros exemplos, mas no caso trata-se da de "Analog Days", estreia na realização do norte-americano Mike Ott.

Longe de contar com um ponto de partida especialmente inovador, o filme tem a pequena proeza de contar com uma frescura e genuinidade que nem sempre têm estado presentes em muito cinema indie dos últimos tempos, optando por uma abordagem singular, sensível e complexa de temas recorrentes.

"Analog Days" foca pequenos episódios, decorridos ao longo de vários meses, das vidas de várias personagens de uma pequena cidade da Califórnia. Não encontrando respostas para as suas inquietações num sistema de ensino demasiado limitado e muito menos em jogos políticos manipuladores, os protagonistas encontram refúgios temporários na música, uns nos outros ou em empregos precários à espera de melhores dias, que de mês a mês parecem nunca chegar.

Ott tem a difícil habilidade de definir personagens em poucos minutos, e mesmo que algumas não saiam do estereótipo - o que é compreensível, dado o extenso elenco -, as mais determinantes são figuras tridimensionais com as quais é fácil sentir empatia, ou não fosem as suas dúvidas e problemas tão próximos das de tantos outros. Marcado por uma atmosfera melancólica, mas nunca depressiva ou niilista, "Analog Days" deixa na memória algumas cenas peculiares como uma reveladora conversa à volta da fogueira, provocações numa mesa de café ou uma mais decisiva, sendo repetida e usada como gancho narrativo, em que um amigo cumprimenta outro mas já não o reconhece.

Fulcral para a acção, a óptima banda-sonora inclui canções de muitos nomes recomendáveis - Interpol, Elliot Smith, Joy Division ou Derek Fudesco dos Pretty Girls Make Graves -, mas é "So Here We Are", dos Bloc Party, a que mais brilha, sendo um elemento-chave para que a recta final do filme contenha um sentido de urgência tão belo e envolvente. "Analog Days" pode ter as suas fragilidades, de resto naturais numa primeira obra - o baixo orçamento é evidente num trabalho de realização por vezes amador -, mas sequências de antologia como esta, dominadas por uma fortíssima densidade emocional, permitem compensá-las largamente e tornar o filme numa estreia irresistível, cheia de alma e muito promissora.

E O VEREDICTO É: 3,5/5 - BOM

"Analog Days"
é uma das obras em competição na quarta edição do IndieLisboa e é exibida hoje às 19h no Fórum Lisboa

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