sexta-feira, fevereiro 24, 2006

COMPETÊNCIA PARA AMAR

Um filme baseado num romance de Jane Austen dirigido por um realizador oriundo da televisão não será, à partida, das propostas cinematográficas mais estimulantes, pois traz à memória associações com as muitas séries produzidas regularmente pela BBC, quase sempre competentes mas também algo indistintas e, sobretudo, raramente expondo inventivas ideias de cinema.

“Orgulho e Preconceito” (Pride & Prejudice), a primeira longa-metragem de Joe Wright, destaca-se, contudo, como uma obra refrescante que contorna, em parte, essa tentadora consideração inicial, apresentando méritos suficientes para se sobrepor à insipidez que caracteriza múltiplos objectos aparentados. Não que este filme de época seja especialmente inovador, mas a sua fluidez e leveza imprimem-lhe uma aura contagiante, e embora seja cinema de fácil digestão é elaborado com sensibilidade e alguma imaginação.

Mais próxima da comédia romântica do que do drama, esta adaptação do livro homónimo da autora inglesa narra o percurso dos orgulhosos e obstinados jovens Elisabeth Bennet e Mr. Darcy, apoiando-se em incisivas e por vezes hilariantes trocas de oportunos diálogos, numa realização e narrativa envolventes - bem distantes da monótona rigidez e exagerada teatralidade de inúmeros filmes de época britânicos (a sequência do baile é de antologia) - e num trabalho de reconstituição temporal (de meados do século XIX) que ganha ao fugir ao decorativismo pomposo e à opulência barroca.

Os actores são outro ponto forte, todos credíveis e talentosos, sendo o mais surpreendente o facto dos que se saem melhor nem serem tanto os veteranos já com créditos firmados – Brenda Blethyn cumpre mas abusa do registo histriónico, Judi Dench e Donald Sutherland são seguros porém iguais a si próprios -, mas os mais jovens e inexperientes, em particular o par central, composto por uma desenvolta Keira Knightley (“Colete de Forças” já sugeria e agora confirma-se que afinal há aqui uma actriz) e por um circunspecto e complexo Matthew MacFadyen, não esquecendo uma manipuladora e insinuante Kelly Reilly (em fase de ascensão).

Esta eficaz conjugação de elementos compensa ocasionais deslizes, evidentes no carácter demasiado caricatural de certas personagens secundárias (as da família da protagonista são o caso mais gritante), na previsibilidade do argumento ou em algum simplismo dramático, que não permite profundos mergulhos nas convulsões das relações humanas. Como um todo, no entanto, “Orgulho e Preconceito” é consistente e revela bom-gosto, impondo-se como uma muito aprazível proposta cinematográfica a descobrir.
E O VEREDICTO É: 3/5 - BOM

13 comentários:

Anónimo disse...

Yup, temos actriz :P! Também analisei o filme hoje. Passa pelo meu blog.

Abraço

gonn1000 disse...

Já vi que não temos opiniões muito diferentes, o filme merece. Hasta :)

brain-mixer disse...

Como é que conseguem ir ver estes filmes ao cinema? Não quero dizer que sejam maus, só que em tanta escolha... Não sei :P

(ou talvez seja o milagre da Mula, eh eh!)

Anónimo disse...

Não fiquei nada desiludida. Apesar da quase inevitável falta de inovação, é um filme cheio de encanto interpretado com uma graça apaixonante!

gonn1000 disse...

Brain-Mixer: Isso é orgulho ou preconceito? :P

H: Estamos de acordo, então, pelos vistos gostamos de ver "estes filmes" :)

Flávio disse...

Adorei o filme e o romance da Jane Austen. Mas continuo a preferir a fabulosa série da BBC, com o Colin Firth.

gonn1000 disse...

Não li o romance nem vi essa série, por iso só posso msmo pronunciar-me em relação ao filme, que não desiludiu.

brain-mixer disse...

Eurrr... Da minha parte é falta de dinheiro LOL

gonn1000 disse...

Ah ok, então percebo que não seja uma prioridade...

gonn1000 disse...

Sim, o Ang Lee adaptou um da Austen, mas foi o "Sensibilidade e Bom Senso". Esse que referes não conheço, mas se der com ele depois digo o que achei.

gonn1000 disse...

Bem, confesso que não li nem um nem outro, não me parecem o tipo de romances com que mais me identifico (mas também não descarto a hipótese de os ler um dia).

Randomsailor disse...

O livro lê-se bastante bem e é inteligente e viciante, para além de dar-nos um bom documento da época.
Relativamente ao filme, vê-se bem e tem cenas líndissimas de realização mas a segunda parte é bastante fraca. De qualquer forma a série da BBC é excelente (e nada indistinta)! Melhor e mais complexa do que o filme. Para quem gostou do filme a série é obrigatória e completamente viciante.

gonn1000 disse...

Não achei que a segunda parte fosse fraca, até acho que ao início é que o filme demorou a aquecer...
Mais um voto para o livro e para a série, começo a ficar interessado... :)