domingo, agosto 28, 2005

A LESTE DO PARAÍSO

A estreia de um novo filme de Michael Bay está longe de ser um acontecimento relevante, pelo menos para quem procura num filme mais do que uma série de sequências de acção repetitivas e exageradas, aliadas a personagens caricaturais e a uma básica construção da narrativa.

Por isso, “A Ilha” (The Island), o mais recente título do realizador norte-americano, não apresentava, à partida, muitos atributos que o distinguissem de obras anteriores, seguindo os moldes de um blockbuster pronto-a-servir.
De resto, o facto de ter sido mal recebido internacionalmente por grande parte do público (que sempre aderiu mais aos filmes de Bay do que a crítica) sugeria que a fórmula usada pelo realizador estava à beira do esgotamento e nem conseguia assegurar um entretenimento competente.

Mas, como por vezes a realidade é mais estranha do que a ficção, até uma película de Michael Bay pode revelar-se surpreendente e interessante, uma vez que “A Ilha”, não sendo um título especialmente inovador, consegue ser uma refrescante proposta de ficção científica, ainda que contaminada com consideráveis – e a espaços excessivas – doses de acção frenética.

Centrado numa sociedade futurista, o filme assenta em dois habitantes de um complexo que protege aqueles que resistiram a uma suposta contaminação que dizimou grande parte da humanidade.
Lincoln Six Echo e Jordan Two Delta, à semelhança dos seus companheiros, vivem um quotidiano rotineiro e pacato onde o único elemento encorajador é a hipótese de, um dia, conseguirem ganhar um sorteio que lhes permitirá viajar para a Ilha, um pequeno paraíso e o único local que escapou à devastadora contaminação.

Contudo, aos poucos, Lincoln começa a questionar os fundamentos e propósitos do sistema ultra-regulado e organizado que o acolhe, procurando respostas que o levam a descobrir que, afinal, a atmosfera aparentemente pacífica em que se insere é parte de um projecto sinistro e assustador.
Quando se apercebe que a convidativa Ilha é apenas um instrumento manipulação dos habitantes do complexo, Lincoln decide escapar, juntamente com Jordan, ao sistema que os enclausura, mas essa atitude torna-os em alvos abater e origina uma vertiginosa rede de perseguições e ataques.

Combinando múltiplas influências de obras de ficção científica – há paralelismos com “Matrix”, “1984”, “Equilibrium”, “A Praia”, “Relatório Minoritário” ou até “A Vila”, entre outras – “A Ilha” não é um filme revolucionário, mas é um blockbuster com mais ideias do que seria de esperar, sobretudo vindo de alguém que gerou películas tão inócuas como “Armaggedon” ou “Pearl Harbour”.

Os primeiros 30/45 minutos são especialmente atípicos quando comparados com as restantes obras de Bay, uma vez que não apresentam o habitual concentrado de pirotecnia mas antes uma promissora introdução a uma intrigante sociedade futurista. Envolventes, embora frios e estilizados, os ambientes oferecem alguns criativos prodígios visuais, recorrendo a um design sofisticado, e até há espaço para seguir o percurso de dois protagonistas interessantes.

É certo que, depois dessa fase, o filme se torna um pouco irregular, oferecendo as esperadas sequências de fugas, tiroteios e explosões que Bay filma de forma algo exibicionista e apressada, mas ainda assim o argumento é suficientemente sólido para que esses episódios mais esquemáticos sejam tolerados.

As interpretações de Ewan McGregor e Scarlett Johansson também contribuem para que “A Ilha” resulte, e mesmo que este não seja um tipo de projecto em que os actores apostem regularmente o balanço é bastante positivo, uma vez que a dupla ajuda a que o espectador se preocupe com o destino dos protagonistas (ainda que não sejam personagens particularmente complexas).

Aliando o entretenimento à exploração de temáticas científicas e éticas actuais, “A Ilha” é mais bem sucedido no primeiro aspecto do que no segundo, mas tem mais substrato do que a maior parte dos títulos género que têm surgido ultimamente, impondo-se como um recomendável filme de acção.
Para além se ser a melhor obra de Michael Bay (o que quer dizer muito pouco já que as restantes são dispensáveis, mas pelo menos esta não contém a vergonhosa manipulação emocional) é um dos mais estimulantes blockbusters do Verão de 2005. Sim, ninguém diria, mas finalmente Michael Bay fez um bom filme, por isso “A Ilha” merece ser visto sem preconceitos.

E O VEREDICTO É: 3,5/5 - BOM

12 comentários:

Gustavo H.R. disse...

Hoje mesmo ia assistir ao filme e pensei: ninguém está vendo essa coisa, todos estão massacrando, não vou perder tempo... Desisti. Acho que o alugarei em DVD. Surpreendeu-me a crítica e nota positivas. Mas algo que você afirmou revela-se verdadeiro: o público em geral tem maior tolerância aos filmes de Bay que os críticos.

Frankenstakion disse...

Apesar das cansativas sequências de acção pelo meio (há que reconhecer que estão bem conseguidas) o filme merece ser visto.`Trata-se de uma boa história de ficção científica que apesar de não ser muito original tem o seu próprio nicho. E depois há a Scarlet...o que é que ela têm que me cativa tanto? Ai...

gonn1000 disse...

Gustavo: Acho que as más críticas de que o filme tem sido alvo são injustas. Não morro de amores pelo Bay, mas desta vez tenho de admitir que fez um bom trabalho...

MYX: Sim, as cenas de acção estão geralmente bem conseguidas, mas dispensava algumas sequências tão abruptas e aceleradas. E os protagonistas eram aparentemente invulneráveis, tendo em conta que sobreviveram a uma série de situações arriscadas...

brain-mixer disse...

As cenas de acção estão como tu dizes na análise: apressadas... Não me parecem tão criativas e elaboradas como nos seus filmes anteriores. Talvez seja da mudança de colaborador, Spielberg talvez lhe tenha suavizado o cérebro, eh eh!

Anónimo disse...

Por motivos pessoais, no dia em que fui ver A Ilha, queria ver um mau filme. O ponto de partida era esse.

O objectivo foi amplamente cumprido.

Discordo totalmente da classificação que deste a este filme.

O argumento não tem pés nem cabeça, pareceu-me o Matrix, versão clone (e eu não sou particular fan dos Matrix), as interpretações são abaixo de cão (o Ewan Mcgregor, em dupla representação, pareceu-me muito abaixo do que seria de esperar), os efeitos especiais mal conseguidos (novamente, na presença dos dois personagens interpretados pelo Ewan McGregor, a desproporção é visível), e os personagens são imortais, a julgar pela capacidade de sairem incólumes dos acidentes por que passam.

Portanto, na tua escala, eu teria usado o 1, e é porque sou simpática :)

E sim, gosto de filmes de ficção científica, têm é de ser minimamente estimulantes.

gonn1000 disse...

Brain-Mixer: Bem, acho que as dos filmes anteriores não eram grande coisa, e estas também não são muito inspiradas mas cumprem a sua função.

Maria João: As comparações com o "Matrix" não me chateiam, achei que as interpretações estavam aceitáveis (o McGregor, em particular, vai muito bem, e a desproporção não me parece assim tão óbvia) e sim, Deus deve gostar muito dos protagonistas, como alguém referiu (a cena da queda dos 70 andares é um POUCO demais, realmente, mas afinal trata-se de um filme de acção).
Mas pronto, se foi um mau filme então esteve à altura das expectativas :)

MPB disse...

Eu acho sinceramente que podia ter sido um bom filme de acção na mesma, mas se fosse explorado um lado ético que andou ali escondido no meio de tanto carro e correria.

E afinal é um filme que vive de uma formula já batida em filmes anteriores de Bay.

Cumps

gonn1000 disse...

Pois, esse aspecto começa a ser explorado no início mas depois o Bay não se preocupa muito com isso, a não ser já no final, ainda que com uma resolução demasiado simplista. Mas tendo em conta o habitual neste tipo de filmes, acho que não está nada mal...

Anónimo disse...

Porque é que dizes que há referências a "The Village"?

Não diria que é um bom filme...é apenas o primeiro filme de Michael Bay digno desse nome :P! Um pouco, muito pouco acima do normal blockbuster.

Cumps. cinéfilos

gonn1000 disse...

Comparo-o a "The Village" já que em ambos os filmes os protagonistas fazem parte de uma comunidade fechada e julgam que não há outros traços de civilização além da realidade que conhecem, e depois descobrem que afinal não é bem assim...

Sim, concordo que é o primeiro filme a sério do Bay, mas acho que está bem acima do típico blockbuster.

Anónimo disse...

é entretenimento...
melhor q alguns e pior q outros.
vale sobretudo pelos actores...

gonn1000 disse...

Tendo em conta os blockbusters deste ano, este até está mais para melhor do que para pior...