Com o final do ano a aproximar-se, porque não (re)descobrir alguns dos filmes que passaram por cá? "Shattered Glass - Verdade ou Mentira" foi uma das obras cinematográficas mais injustamente ignoradas do início de 2004, mas este pequeno filme independente está acima de muitos blockbusters mega-promovidos que andam por aí. Here are my two cents...
O primeiro filme de Billy Ray é um pertinente retrato dos meandros do jornalismo e um objecto que convida à reflexão sobre o poder dos media nos dias de hoje."Shattered Glass: Verdade ou Mentira" baseia-se na história verídica de Stephen Glass, um jovem jornalista norte-americano que, nos finais dos anos 90, se tornou num dos nomes mais solicitados para publicações como a "New Republic", a "Rolling Stone", a "Harper`s" ou a "George". No entanto, o sucesso fugaz de Glass terminou quando um jornalista de uma publicação concorrente conseguiu provar que parte dos seus artigos (mais de 40) eram total ou parcialmente inventados e sem base de sustentação real. O acontecimento gerou alguma polémica e voltou a suscitar questões sobre a ética dos jornalistas e as responsabilidades inerentes a esta profissão.
Hayden Christensen ("A Guerra das Estrelas: Episódio II - Ataque dos Clones", "Uma Casa, uma Vida") interpreta Stephen Glass, um contador de histórias nato cujo temperamento oscila entre o de um genial menino-prodígio e o de um indivíduo egocêntrico, imaturo, ingénuo e com uma insegurança quase infantil. Glass encarna um autêntico mentiroso compulsivo, alguém fascinado com as suas histórias e com as apelativas oportunidades profissionais que estas despoletam. Através dos seus originais, lúdicos e entusiasmantes artigos, Glass torna-se numa das estrelas da sua redacção e alvo de múltiplas solicitações para trabalhos como free-lancer em prestigiadas publicações.
Billy Ray apresenta um intenso estudo de personagem e, através deste, oferece um dos casos marcantes de uma geração actual que se move através de uma constante busca de afirmação, sucesso, glória e protagonismo. Glass é assim produto da ambição, por vezes descontrolada, que se encontra em múltiplas áreas das sociedades ocidentais contemporâneas. Ray fornece ainda um olhar sobre os bastidores do jornalismo, focando as relações conturbadas dos seus profissionais, a procura de fama oposta ao espírito de equipa, as precárias condições de trabalho ou a crescente valorização da superficialidade e tabloidização dos conteúdos. Neste misto de thriller, drama e documentário, o realizador apresenta ainda o rigor e elevada exigência necessários a esta profissão, assim como a perspectiva idealista, esclarecedora e cívica que a orienta.
Além de Hayden Christensen, "Shattered Glass - Verdade ou Mentira" conta com as sólidas prestações de Peter Saasgard (o complexo e enigmático editor Chuck Lane, uma das melhores e mais elogiadas interpretações do filme), Chloe Sevigny, Steve Zahn ou Rosario Dawson, que compõem um prestigiado e convincente núcleo de actores.
O filme de Billy Ray possui, no entanto, algumas limitações, uma vez que nunca analisa a fundo a vida privada de Stephen Glass e as suas relações com a família e amigos, deixando o espectador pouco esclarecido quanto aos factores que orientam a sua conduta, escolhas e personalidade. As restantes personagens do elenco (excepto o editor) carecem também de alguma profundidade, e o filme poderia ser um pouco mais longo para trabalhar e complexificar alguns destes factores.
Ainda assim, "Shattered Glass - Verdade ou Mentira" constitui uma interessante, absorvente e estimulante experiência cinematográfica que alia o entretenimento à exploração de temáticas centrais das sociedades contemporâneas.
E O VEREDICTO É: 3.5/5 - BOM
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