"Roda Livre" (Bottle Rocket), "Gostam Todos da Mesma" (Rushmore) e "Uma Comédia Genial" (The Royal Tenembaums) contribuíram para que muitos incluíssem Wes Anderson entre a nova - e criativa - vaga de realizadores norte-americanos, uma geração oriunda dos anos 70 que cresceu a ver Spielberg, Coppola e Scorcese e que nestes se inspira para reformular os códigos cinematográficos.
Tal como Sofia Coppola, Paul Thomas Anderson e Spike Jonze, também Wes Anderson aborda frequentemente a temática da solidão, da família ou da inadaptação, algo que se encontra bem presente no seu novo filme, "Um Peixe Fora de Água" (The Life Aquatic With Steve Zissou). Mais uma vez há um elenco de personagens peculiares e atípicas que oscilam entre o bizarro e o offbeat, vivendo quase sempre numa constante apatia emocional e em esferas de indiferença.
O filme segue as peripécias de Steve Zissou (Bill Murray), um oceanógrafo de meia idade determinado a capturar e eliminar uma criatura marinha responsável pela morte de um dos seus amigos e companheiros de bordo. Na sua jornada será acompanhado por uma diversificada tripulação que inclui, entre outros, a sua gélida esposa (Angelica Houston)o seu recém-descoberto suposto filho (Owen Wilson) e uma instável jornalista que acompanha a expedição (Cate Blanchett).
Pelo meio há um estilo visual muito próprio e facilmente identificável que recupera influências dos anos 70 e revela uma cuidada atenção ao pormenor, tanto nas figuras marinhas animadas digitalmente como em todos os cenários e adereços das personagens. A banda-sonora do brasileiro Seu Jorge apresenta versões em português de canções de David Bowie e é mais uma prova da inventividade de Anderson, capaz de misturar elementos que se julgariam inconciliáveis.
Infelizmente, a criação de um universo singular com consideráveis doses de ironia e provocação não bastam para que um filme resulte, e "Um Peixe Fora de Água" é - como o é toda a a obra do relizador - disso exemplo. A película é mais uma excêntrica dramedy que, embora contenha sequências inspiradas, não satisfaz nem como drama nem como comédia.
A gestão da tensão dramática é no mínimo desequilibrada, uma vez que as cenas sérias são abruptamente interrompidas por momentos de humor corrosivo e vice-versa, gerando uma estranha amálgama que só funciona a espaços. Ora desencantado e melancólico, ora áspero e cínico, o filme congrega episódios tão imprevisíveis quanto qualitativamente desiguais, e em alguns momentos o tom paródico chega a ser ridículo, como na cena de tiroteio com os piratas (despropositada e exagerada, ainda que intencional).
As personagens também não são especialmente intrigantes, uma vez que nunca se afastam da caricatura e não chegam a ser aprofundadas (o que é pena, porque têm potencial). O protagonista será a única excepção, mas é apenas mais uma oportunidade para Bill Murray fazer de...Bill Murray, expondo a pose e trejeitos que já não congregam grandes doses de surpresa e apenas oferecem mais do mesmo.
"Um Peixe Fora de Água" é demasiado "espertalhão" para se tornar envolvente, e por isso as sequências que poderiam suscitar algum impacto emocional soam a falso e não geram reacção, tornando o filme num objecto curioso mas que não é mais do que um irregular concentrado de gags nonsense...
E O VEREDICTO É: 2/5 - RAZOÁVEL
9 comentários:
Grande análise sim senhor :)! Também achei algumas cenas exageradas...Lembro-me de alguns comentários das pessoas que estavam na sala quando o filme acabou: "Mas que porcaria...gastam milhões nestas porcarias", "Estive para sair a meio"...enfim, coisas nada positivas :|...
Lê a minha análise em http://lordofthemovies.blog-city.com/read/1150106.htm
Cumprimentos cinéfilos (e musicais :P)
Na globalidade concordo com a tua análise ao filme. E nesse particular, acho que Wes Anderson esteve melhor com "Rushmore" e "Royal Tenenbaums", que sendo filmes com bastantes semelhanças temáticas e formais a este "Life Aquatic", são mais bem conseguidos. Esta aventura de Steve Zissou é algo flat.
sOlo: LOL...pois. Aconteceu-me isso com o anterior, "The Royal Tenembaums", onde os meus amigos quase me lincharam por ter sugerido o filme...
Duarte: Pois a mim o Wes nunca me convenceu e o novo filme apenas dá continuidade a isso :(
Pois, parece que estamos todos de acordo. "The Life Aquatic" podia ser bem melhor... Pena, até tinha bastante potencial. Como o Duarte e ao contrário de ti, gostei bastante mais do Wes Anderson no "The Royal Tenenbaums". Esse, sim, merecia algumas das críticas e comentários que, agora, têm sido dirigidos a este último filme. A este falta-lhe, essencialmente, profundidade. A relação pai-filho, vista por muitos como sendo o tema central do filme, é tratada com muita, muita superficialidade. O balanço entre comédia e algo mais sério também não é muito bom. Pontos fracos de um filme que podia (e devia) ter sido muito melhor.
Estou muito ansioso em relação à "The Life Aquatic" (que aqui no BRasil ganhou uma tradução ao pé da letra), principalmente porque Wes Anbderson é um dos meus diretores favoritos e considero "Royal Tenenbaums" uma obra-prima (e um dos meus filmes favoritos). Porém, tenho a infeliz impressão que este seu novo filme é inferior às suas produções anteriores (mas confesso que me sentiria realizado se este "The Life Aquatic" possuir o mesmo humor melancólico de Tenenbaums).
Não posso opinar.. Ainda não vi, não me chamou mt a atenção, e pelos vistos não perdi nada fantástico...
Daniel Miguel: Sim, a abordagem à relação pai-filho foi, no mínimo, caricatural...
Rodrigo: Se gostaste dos anteriores não deverás sair defraudado. Eu é que não aprecio muito o estilo...
O Micróbio: Pois, mas há melhor para ver (digo eu)...
JGSC: É melhor julgares por ti próprio, but beware ;)
Eu considero este filme (bem como The Royal Tenenbaums) uma verdadeira delícia cinematográfica. Só tive oportunidade de o ver agora, e gostei imenso. Para além de muito original, tem aquele humor muito especial, característico de Wes Anderson, e também a sua dissecação às vidas que perdem sentido. Talvez só para apreciadores, como disses-te.
Pois, e até agora ainda não faço parte dos apreciadores do trabalho de Wes Anderson, mas pode ser que no futuro me surpreenda.
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