domingo, maio 21, 2006

EM CARNE VIVA

Quando se estreou na realização em 2004, com “A Cabana do Medo”, Eli Roth desde logo gerou reacções díspares, sendo acusado, por muitos, de mero copista de lugares-comuns do terror e do gore, mas também defendido por tantos outros, que nele viram um promissor nome a seguir num género já algo moribundo.
David Lynch ou Peter Jackson foram dois dos cineastas que depositaram confiança em Roth, e na sua segunda obra, “Hostel”, o realizador conta com a estratégica colaboração de Quentin Tarantino, cujos créditos na produção do filme contribuíram para que este fosse um dos mais aguardados de 2006.

Tal como o seu antecessor, “Hostel” é um teen movie on acid, uma vez que, durante grande parte da sua duração, limita-se a seguir as peripécias de três jovens (dois amigos norte-americanos e um companheiro de viagem islandês) pela Europa, que pouco mais procuram do que sexo fácil e drogas em doses generosas.
O oásis desta busca parecia ser Amesterdão, mas aí conhecem um rapaz que lhes recomenda uma pousada na Eslováquia onde a quantidade de hedonismo e luxúria é ainda maior, pelo que o trio rapidamente decide escolhê-la como novo destino.
Contudo, se ao início essa experiência se revela compensadora, o rumo dos acontecimentos é alvo de uma viragem repentina quando cada um dos jovens se torna vítima de torturas várias, sendo aprisionados numa autêntica casa do terror onde não falta quem esteja disposto a pagar quantias avultadas para exercer os seus requintes de malvadez nos turistas mais frágeis e desatentos.

Partindo dos clichés das comédias sobre adolescentes norte-americanos com a libido ao rubro, Roth insere as suas personagens pouco mais do que caricaturais num ciclo de experiências-limite ensopadas em sangue e demais fluidos, gerando episódios sinuosos e doentios bem regados com um cáustico humor negro.
Não se espere de “Hostel” uma narrativa verosímil ou personagens tridimensionais, já que o filme não pede para ser levado a sério, tal como “A Cabana do Medo” já não pedia. Nem pode, dado o exagero de coincidências miraculosas que se encontram na acção, sendo a cena do atropelamento já perto do final a mais delirante.

O que Roth proporciona é apenas um exercício de estilo que, não sendo propriamente original, consegue revelar, mesmo assim, algum savoir faire, como o comprovam as sequências de mutilação e outros actos hediondos, onde o suplício das vítimas deixa o espectador com os nervos em franja, envolto numa claustrofóbica rede de suspense.
A violência é quase sempre bastante gráfica, o que se por um lado não poupa o estômagos também perde alguma eficácia, uma vez que o sugerido tem, muitas vezes, mais impacto do que o que é mostrado (Roth andou a ver os filmes de Takashi Miike, que de resto até tem aqui uma breve aparição).

“Hostel” foca questões que não chega a aprofundar devidamente, como a reacção a ambientes e culturas estranhos e por vezes inóspitos ou a reflexão acerca das motivações dos indivíduos que se envolvem em arrepiantes actos amorais de sadismo, mas não deixa de ser muito eficaz enquanto proposta de terror, com uma tensão recorrente e palpitante, uma boa gestão do ritmo e um curioso cromatismo visual.

Roth pode ainda não ser a next big thing de domínios gore e afins, pois se as suas obras têm sido convincentes, não são imunes a desequilíbrios, mas o entusiasmo do realizador é palpável e, embora por vezes corra o risco de se deslumbrar com a sua própria ousadia e de apostar num choque gratuito e despropositado, percebe-se porque é que um nome como Tarantino decidiu apadrinhá-lo. Roth não está, pelo menos por enquanto, à altura do mestre, mas felizmente também não manchou a sua reputação.
E O VEREDICTO É: 3/5 - BOM

7 comentários:

Anónimo disse...

Depois de ver o "Hostel" fiquei sem vontade de ir á Eslováquia...vá-se lá saber porquê, não é :P?

Boa análise :).

Abraço!

gonn1000 disse...

Eheh... Não sei, porquê?? :P

gonn1000 disse...

Pois, os filmes do Roth pouco consensuais, admito que têm falhas mas mesmo assim gostei.

Flávio disse...

Eu adorei o filme e concordo plenamente com a nota do Gonçalo. Gostei do subtexto político (a globalização, o antiamericanismo que prolifera na Europa) e não desgostei da primeira parte holandesa.

(SPOILERS AHEAD!)

Um dos muitos pormenores saborosos: a personagem mais simpática - o escritor sensível - é das primeiras a morrer!

gonn1000 disse...

Sim, essa parecia ser, ao início, a personagem principal, mas o Roth trocou-nos as voltas.

Cinza disse...

Bom??? Meu Deus devo andar cega... grandes nomes no poster do filme e ele há-de ser "Bom" por força... Um dos piores filmes que vi nos últimos tempos.. Vimos cinquenta vezes os bisturis, as tesouras, os bisturis, as tesouras... Bah! que seca!

gonn1000 disse...

Não é "bom" "por força", nem pelos "grandes nomes" do poster. Aliás, eu já tinha gostado do primeiro filme do Roth, "A Cabana do Medo", que não tinha o nome de outros realizadores no cartaz, e acho que justifiquei porque é que gostei de "Hostel". Percebo que não seja um filme para todos os gostos, mas, tal como tu, tenho o direito de expressar a minha opinião.