terça-feira, maio 30, 2006

SELECÇÃO DE ESPERANÇAS

Enquanto a brasileira Pitty concentrava atenções no Palco Mundo, os britânicos Kill the Young apresentavam, dia 27 no Hot Stage, o melhor concerto que ninguém viu do Rock in Rio, através de um cruzamento entre brit pop e indie rock bastante decente, com algumas boas canções.
O jovem trio de Manchester editou no ano passado o disco de estreia homónimo e, embora não pareça ter ainda uma personalidade muito vincada (assemelha-se a uma fusão de The Vines e JJ72), merece alguma atenção, como o comprova o single "Origin of Illness".


Kill the Young - "Origin of Ilness"

segunda-feira, maio 29, 2006

A CIDADE DO PECADO

Por vezes as primeiras impressões enganam, e "Medo de Morte" (Running Scared), é um exemplo de como tal ocorre também no cinema, uma vez que o trailer fazia prever um rotineiro e cansativo filme de acção na linha de "Velocidade Furiosa" e derivados, suspeita reforçada pelo protagonista ser Paul Walker, tornado conhecido pela participação nesse tipo de (sub)produtos, e afinal a película está uns furos acima daquilo que inicialmente se esperaria.

Contudo, uma análise à ficha técnica do filme revela também que o realizador do filme se tratava de Wayne Kramer, escolha algo surpreendente tendo em conta que a sua primeira (e anterior) obra, "Má Sorte", gerou algum entusiasmo dentro de domínios indie em 2003.

Neste caso, o papel do realizador foi mesmo decisivo, pois se "Medo de Morte" parte de facto de um argumento mais ou menos indistinto, a diferença encontra-se na forma como Kramer o filma e desenvolve, tornando o resultado final bem mais convincente e singular do que o que se esperaria à partida.

Centrada num gangster, Joey Gazelle, que tem de recuperar a sua arma, roubada por um amigo do filho, a película proporciona uma viagem ao lado mais obscuro e pérfido da noite de New Jersey, povoada por figuras para quem a moral já pouco significa e que se encontram perdidas nos seus desvios e obessões.

O próprio protagonista é um indíviduo de índole duvidosa, pois embora seja um marido e pai dedicado não deixa de enveredar por actividades aparentemente ilícitas, mas quando comparado com os seus bizarros e rudes antagonistas consegue gerar alguma empatia.
Paul Walker não apresenta um desempenho esmagador, mas pelo menos afasta-se das interpretações baças e inexpressivas que apresenta habitualmente, apostando a espaços num registo quase histriónico à medida que Joey se torna cada vez mais lunático devido à desconcertante situação em que se envolve.

Mantendo uma tensão constante, que se pronuncia logo na cena inicial, "Medo de Morte" é um eficientíssimo concentrado de reviravoltas e cliffhangers, contendo uma série de cenas abrasivas e excessivas que perdem em plausibilidade aquilo que ganham em adrenalina e visceralidade.

Ocasionalmente o argumento entra na banalidade, mas a componente visual do filme, caracterizada por um realismo sujo e estilizado, compensa essa limitação, pois Kramer constrói uma atmosfera (ou melhor, selva) urbana com tanto de sinistro como de envolvente.

O ritmo desvairado e alucinante, a par das personagens à beira do limite, dificilmente faz desta uma experiência entediante, e se o filme não vai muito além do entretenimento (quando foca questões sérias, como a pedofilia, a perspectiva é algo moralista e superficial), sai-se muito bem nesse campo, com uma realização mais inventiva do que a maioria da concorrência.

Algures entre Tony Scott, Robert Rodriguez e Michael Mann (os ambientes nocturnos lembram os de "Colateral"), Wayne Kramer oferece uma vibrante amálgama de thriller, humor negro, e acção, que até consegue ser competente no elenco (Walker cumpre no papel principal, mas Vera Farmiga ou o jovem Cameron Bright também convencem).
É certo que há por aqui mais estilo do que substância, mas seria injusto não reconhecer que, mesmo assim, "Medo de Morte" é uma proposta a merecer atenção.

E O VEREDICTO É: 3/5 - BOM

domingo, maio 28, 2006

EU FUI

Sim, fui dos que esteve pelo Rock in Rio dias 26 e 27, e se perdi os D'ZRT (as page-views que vou ganhar ao referi-los...), a Ivete, a Shakira e os Guns n' Roses, ainda vi Jamiroquai num concerto competente, em modo best of, que felizmente ignorou quase todo o material recente, mas onde Jay Kay apenas picou o ponto e nem sempre esteve à altura do entusiasmo emitido pelo público.
"Deeper Underground" terminou em grande um espectáculo que pedia mais vitalidade, mas quem lá estava não parece ter reclamado.

Também o Groove Armada Sound System jogou pelo seguro na Tenda Electrónica, numa noite inegavelmente eficaz mas menos ecléctica do que se esperaria tendo em conta a discografia de Tom Findlay e Andy Cato (na foto).
No Hot Stage, dedicado a novos projectos, os Room 74, Fingertips e Expensive Soul inauguraram as sessões de concertos.
Para a semana há mais com os Mesa, Da Weasel, Kasabian, Red Hot Chili Peppers e também aqueles que aguardo com maior expectativa, os 2 Many DJs.

UM CASO DA VIDA

Poderia uma das entradas da estação de metro do Areeiro ser palco de uma cena digna do início de um episódio de "Sete Palmos de Terra"?
A julgar pelo que me aconteceu na tarde de ontem, não seria difícil, já que tinha acabado de descer as escadas quando, uns três ou quatro segundos depois, ouço um muito pouco discreto "CRASH!" vindo da entrada por onde tinha acabado de passar.
O motivo? Uma televisão estilhaçada, daquelas que já parecia ter uns anitos (se não era a preto e branco, disfarçava bem), que aterrou ali sem pré-aviso.
Meio atónito, tentei procurar um agente do metro, mas não se encontrava por lá nenhum, e quando saí da estação estavam uns vendedores de rua a comentar que um homem se tinha chateado com um responsável pelas mudanças que não quis transportar a sua televisão, pelo que decidiu atirá-la para ali, e que tinha ido para um restaurante ao lado.
Fui outra vez para a estação de metro, e entretanto a funcionária da bilheteira já tinha visto os estragos e avisou a polícia. Os agentes do metro chegaram uns 10 minutos mais tarde, mas não tinham autoridade para agir fora da estação, dizendo que só a polícia podia fazer alguma coisa, pedindo-me que aguardasse que eles chegassem se quisesse apresentar queixa e tentar descobrir o responsável.
Infelizmente - mas não surpreendentemente -, os dois polícias não só demoraram quase uma hora a chegar como nem sequer se deram ao trabalho de sair da estação para procurar eventuais testemunhas ou ir ao tal restaurante, dizendo-me que se eu nem sequer estava ferido não tinha nada com que me preocupar: "Mas o tal homem fez-he alguma coisa? Então, porque é que está tão indignado?? Quer apresentar queixa para quê?? Se a televisão lhe tivesse caído em cima teria motivos para isso, mas assim porque é que está a insistir tanto?".
Eu disse que se me tivesse caído em cima é que provavelmente já não poderia fazer mesmo nada, e quando o guarda mais gordo ainda teve o descaramento de perguntar porquê (pergunta estúpida nº1) e se tinha algum interesse pessoal nisto(pergunta estúpida nº2) voltei lá acima para tentar encontar alguma testemunha, mas os vendedores já não estavam lá e no restaurante não obtive respostas.
"Deixe lá que quem fez isto também não deve ser muito normal", disse o polícia, que ainda apontou os meus dados apesar de eu já não ter apresentado queixa, porque só iria perder mais tempo e paciência.
Enfim, pelo menos ainda deu para esboçar um sorriso com as reacções de algumas pessoas que passavam, como a de uma velhinha que, após ficar uns segundos a olhar para o que restava da televisão, perguntou se estava estragada. Se fosse só a televisão...

quinta-feira, maio 25, 2006

A TERCEIRA MUTAÇÃO

ESTREIA DA SEMANA: "X-MEN 3 - O CONFRONTO FINAL"

Das personagens dos comics norte-americanos adaptadas para cinema, os heróis mutantes da Marvel são dos que conseguiram passar do papel para o grande ecrã com resultados mais estimulantes, tanto em "X-Men" e sobretudo em "X-Men 2" (ou "X2"), ambos dirigidos por Bryan Singer.
"X-Men 3 - O Confronto Final" (X-Men: The Last Stand) encerra a trilogia e, entre os vários subplots, foca uma das histórias essenciais do universo X, a Saga da Fénix (aqui interligada com a de uma "cura" para os mutantes), introduzindo ainda novas personagens como os Morlocks e fan-favorites como Angel ou Beast. Resta saber se Brett Rattner, o realizador de serviço, consegue apresentar um filme à altura dos antecessores.

Outras estreias:

"A Pista", de Eric Valli
"Indian, o Grande Desafio", de Roger Donaldson
"Modigliani", de Mick Davis
"Natureza Morta", de Susana de Sousa Dias
"O Tempo que Resta", de François Ozon
Trailer de "X-Men 3 - O Confronto Final"

A ESTREIA QUE RESTA

Para quem não simpatiza com super-heróis, entre as estreias desta semana destaca-se a chegada do novo filme de François Ozon, que depois do interessante "5X2" se dedicou a este "O Tempo que Resta", muito provavelmente o seu melhor filme até à data.
Motivos? A excelente interpretação de Melvil Poupaud, no papel de um jovem fotógrafo que descobre contar apenas com alguns meses de vida, ou o tom realista e nunca manipulador com que Ozon desenvolve este drama introspectivo e comovente. Nem sempre é um filme brilhante, mas é um dos obrigatórios de 2006. Crítica aqui.

quarta-feira, maio 24, 2006

LUZ ENTRE AS NUVENS

Mais uma das recentes bandas nova-iorquinas a resgatar referências new wave/pós-punk, juntando-lhes pontuais traços indie rock e shoegazer, os The Cloud Room não são um portento de originalidade mas apresentam, no seu disco de estreia homónimo, um conjunto de canções que conseguem um interessante equilíbrio entre o passado e o presente.

Com uma voz situada algures entre a de David Bowie e David Byrne, lembrando ainda a de Alex Kapranos, o jovem quarteto prometeu logo desde o início através do single "Hey Now Now", tema catchy com tendência para se tornar num hino indie e agradável porta de entrada para o álbum. "Waterfall", a canção seguinte, é menos dançável mas igualmente cativante, onde se mantém o bom gosto para a criação de melodias envolventes que não escondem uma aprazível vertente pop.

Nas restantes faixas, "The Cloud Room" demonstra que o grupo nem sempre consegue manter este nível, pois embora não haja nenhum momento medíocre há demasiados que não se afastam muito da mediania.

A banda tem a seu favor o facto de expor alguma versatilidade nas atmosferas, que oscilam entre a placidez introspectiva de "Sunlight Song", onde os The Shins ou os Death Cab for Cutie ecoam nas entrelinhas, ou a carga frenética e efervescente de "Beautiful Mess", aproximando-se aqui dos Franz Ferdinand ou dos Kaiser Chiefs no seu melhor. "O My Love" vai de um extremo ao outro, partindo de ambientes serenos mas acabando por se tornar irriquieto.

Mesmo sendo relativamente eclécticos, os The Cloud Room ainda não conseguem edificar aqui uma personalidade vincada, provando que sabem escrever e interpretar boas canções mas ficando muitas vezes presos nas suas influências.
Contudo, enquanto registo de estreia o disco é uma surpresa apelativa, embora valha mais por algumas partes do que pelo todo e se torne menos entusiasmante na recta final (exceptuando a breve "Sunlight Reprise", tão discreta quanto encantatória).
É também daqueles que convida a audições repetidas devido à sua curta duração (pouco mais de meia-hora) e a experiência recomenda-se, pois no final o balanço é positivo, apesar de deixar a impressão de que há aqui potencial para mais.

E O VEREDICTO É: 3/5 - BOM

segunda-feira, maio 22, 2006

NASCIDO PARA MATAR?

Após atingir, durante a década de 90, o pico da sua carreira no papel do agente secreto mais famoso do mundo, Pierce Brosnan foi recentemente substituído por Daniel Craig e, se à partida poderia ser difícil imaginá-lo num papel distinto do de 007, “O Matador” (The Matador) prova que tal não só é possível como resulta surpreendentemente bem.

Neste misto de drama, thriller e comédia negra, o actor encarna Julian Noble, um assassino profissional que esteve sempre à altura das suas missões, nunca falhando um alvo. No entanto, após vários anos envolvido em homicídios e, nas horas vagas, entregue ao álcool e às mulheres, Julian apercebe-se que, apesar de bem-sucedido dentro da sua área, tem uma vida pessoal pouco preenchida, não podendo contar com quaisquer amigos.

Durante uma tarefa na Cidade do México, trava conhecimento, num bar, com o vendedor Danny Wright, que também se encontra algo deprimido, mas porque tem dúvidas quanto à sua capacidade de consolidar um negócio fundamental. Partilhando momentaneamente as suas solidões, os dois protagonistas estabelecem um laço que os aproximará muito mais do que a conversa descomprometida que encetam nessa noite, gerando uma atribulada mas determinante amizade.

Com um argumento curioso, onde nada é exactamente o que parece, “O Matador” contém algumas boas surpresas, e Richard Shepard apresenta um escorreito trabalho de realização, sem grandes ideias mas também não comprometendo.
O filme, contudo, pertence a Brosnan, que constrói uma personagem atípica e excêntrica, mas irresistível, um loser desbocado e caricato que encontra na amizade uma fuga para a superficialidade que contaminou a sua vida. Greg Kinnear e Hope Davis ajudam a fortalecer o elenco através de desempenhos sólidos, ainda que as suas personagens sejam menos peculiares, e a química entre os actores é evidente, sobretudo entre Brosnan e Kinnear.

Suficientemente divertido e lúdico, “O Matador” não aspira ser muito mais, e por isso resulta dentro dos seus modestos objectivos. Por vezes, há alguma indefinição na escolha do tom, com oscilações demasiado abruptas entre momentos leves e mais sérios (embora o filme nunca chegue a ser profundo), e a narrativa nem sempre tem o mesmo fôlego, contando com algumas sequências onde o ritmo é pouco aliciante.
De qualquer forma, “O Matador” é uma proposta agradável e a espaços estimulante, ainda que não atinja o nível de “Kiss Kiss, Bang Bang”, de Shane Black, imbatível na posição de melhor buddy movie dos últimos tempos.
E O VEREDICTO É: 2,5/5 - RAZOÁVEL

domingo, maio 21, 2006

EM CARNE VIVA

Quando se estreou na realização em 2004, com “A Cabana do Medo”, Eli Roth desde logo gerou reacções díspares, sendo acusado, por muitos, de mero copista de lugares-comuns do terror e do gore, mas também defendido por tantos outros, que nele viram um promissor nome a seguir num género já algo moribundo.
David Lynch ou Peter Jackson foram dois dos cineastas que depositaram confiança em Roth, e na sua segunda obra, “Hostel”, o realizador conta com a estratégica colaboração de Quentin Tarantino, cujos créditos na produção do filme contribuíram para que este fosse um dos mais aguardados de 2006.

Tal como o seu antecessor, “Hostel” é um teen movie on acid, uma vez que, durante grande parte da sua duração, limita-se a seguir as peripécias de três jovens (dois amigos norte-americanos e um companheiro de viagem islandês) pela Europa, que pouco mais procuram do que sexo fácil e drogas em doses generosas.
O oásis desta busca parecia ser Amesterdão, mas aí conhecem um rapaz que lhes recomenda uma pousada na Eslováquia onde a quantidade de hedonismo e luxúria é ainda maior, pelo que o trio rapidamente decide escolhê-la como novo destino.
Contudo, se ao início essa experiência se revela compensadora, o rumo dos acontecimentos é alvo de uma viragem repentina quando cada um dos jovens se torna vítima de torturas várias, sendo aprisionados numa autêntica casa do terror onde não falta quem esteja disposto a pagar quantias avultadas para exercer os seus requintes de malvadez nos turistas mais frágeis e desatentos.

Partindo dos clichés das comédias sobre adolescentes norte-americanos com a libido ao rubro, Roth insere as suas personagens pouco mais do que caricaturais num ciclo de experiências-limite ensopadas em sangue e demais fluidos, gerando episódios sinuosos e doentios bem regados com um cáustico humor negro.
Não se espere de “Hostel” uma narrativa verosímil ou personagens tridimensionais, já que o filme não pede para ser levado a sério, tal como “A Cabana do Medo” já não pedia. Nem pode, dado o exagero de coincidências miraculosas que se encontram na acção, sendo a cena do atropelamento já perto do final a mais delirante.

O que Roth proporciona é apenas um exercício de estilo que, não sendo propriamente original, consegue revelar, mesmo assim, algum savoir faire, como o comprovam as sequências de mutilação e outros actos hediondos, onde o suplício das vítimas deixa o espectador com os nervos em franja, envolto numa claustrofóbica rede de suspense.
A violência é quase sempre bastante gráfica, o que se por um lado não poupa o estômagos também perde alguma eficácia, uma vez que o sugerido tem, muitas vezes, mais impacto do que o que é mostrado (Roth andou a ver os filmes de Takashi Miike, que de resto até tem aqui uma breve aparição).

“Hostel” foca questões que não chega a aprofundar devidamente, como a reacção a ambientes e culturas estranhos e por vezes inóspitos ou a reflexão acerca das motivações dos indivíduos que se envolvem em arrepiantes actos amorais de sadismo, mas não deixa de ser muito eficaz enquanto proposta de terror, com uma tensão recorrente e palpitante, uma boa gestão do ritmo e um curioso cromatismo visual.

Roth pode ainda não ser a next big thing de domínios gore e afins, pois se as suas obras têm sido convincentes, não são imunes a desequilíbrios, mas o entusiasmo do realizador é palpável e, embora por vezes corra o risco de se deslumbrar com a sua própria ousadia e de apostar num choque gratuito e despropositado, percebe-se porque é que um nome como Tarantino decidiu apadrinhá-lo. Roth não está, pelo menos por enquanto, à altura do mestre, mas felizmente também não manchou a sua reputação.
E O VEREDICTO É: 3/5 - BOM

sexta-feira, maio 19, 2006

EURO 2006

Os saudosos Bis substituem a rainha da pop (que passou quase despercebida por aqui) na secção de videoclips, com uma canção que tresanda a sexta-feira à noite e serve de aperitivo para mais logo.
Quem não gritar "EurodiscooOOOoooOOO...!" é um chato :P


quinta-feira, maio 18, 2006

ESTREIA DA SEMANA: "WASSUP ROCKERS - DESAFIOS DA RUA"

Depois de "Kids - Miúdos", "Bully - Estranhas Amizades", "Ken Park - Quem és Tu?" (ignore-se "Um Dia no Paraíso"), o controverso Larry Clark apresenta em "Wassup Rockers - Desafios da Rua" mais uma perspectiva sobre a adolescência, desta vez centrada num grupo de jovens skaters de um bairro latino de Los Angeles.
De forma a fugirem a um quotidiano rotineiro, passado entre a audição de punk rock, namoros ou desportos radicais, os protagonistas viajam até Beverly Hills, e Clark aproveita a oportunidade para se debruçar sobre os contrastes da juventude da América de hoje.
Também estreia esta semana o filme da moda (inspirado no livro da moda), mas esse já tem destaque suficiente noutras paragens...

Outras estreias:

"A Comédia do Poder", de Claude Chabrol
"No Limiar da Verdade", de Craig Rosenberg
"O Maior Penalty do Mundo", de Roberto Santiago
"O Código Da Vinci", de Ron Howard

Dia Internacional dos Museus

Celebra-se hoje a 28ª edição do Dia Internacional dos Museus, com iniciativas especiais, horários de funcionamento até à meia noite e entrada gratuita até domingo. Mais pormenores aqui.

quarta-feira, maio 17, 2006

DEMÓNIOS NA AMÉRICA

Em Outubro de 1998, a América ficou chocada quando foi noticiado que um homossexual de 21 anos, Matthew Sheppard, tinha sido espancado até ficar gravemente ferido, sendo posteriormente amarrado a uma cerca e abandonado num espaço isolado.
Vítima deste ataque por parte de outros dois jovens, Sheppard acabaria por morrer dias mais tarde, já no hospital, e o trágico acontecimento marcou desde então Laramie, a pequena cidade do Wyoming onde o infortúnio ocorreu.

Moisés Kaufman e os restantes elementos do Tectonic Theater Project basearam-se no caso para criar a peça teatral "Laramie", recolhendo testemunhos de mais de 200 habitantes locais, incluindo amigos, familiares e conhecidos de Sheppard e polícias e médicos que lidaram com a situação.

Oferecendo uma perspectiva abrangente e multifacetada sobre a homofobia, a intolerância e a reacção à diferença, a peça foi alvo de aclamação e motivou um filme, "The Laramie Project", também dirigido por Kaufman, um dos títulos independentes mais elogiados de 2002 que, contudo, nunca chegou a salas portuguesas.

A peça teatral, no entanto, pode agora ser vista no Teatro Maria Matos, não a versão original mas a encenada por Diogo Infante, que se mantém fiel à estrutura narrativa em mosaico, onde cada um dos nove actores (Adriano Luz, Fernando Luís, Albano Jerónimo, Flávia Gusmão, Isabel Abreu, Nuno Gil, Paula Fonseca, Pedro Laginha e Teresa Madruga) interpreta várias personagens, cujos diálogos - ou monólogos - foram proferidos pelos cidadãos entrevistados.

Embora "Laramie" retrate dezenas de figuras, quem nunca aparece em cena é Matthew Sheppard, uma vez que o jovem é caracterizado pelo discurso de terceiros, e felizmente a peça não o torna num mártir de um panfleto a favor dos direitos dos homossexuais, optando pela ambivalência em vez de um fácil discurso edificante.

É certo que "Laramie" visa apelar à tolerância, mas geralmente consegue fazê-lo evitando retratos previsíveis e estereotipados (veja-se o caso da Igreja), dispensando maniqueísmos.
Por vezes há, ainda assim, momentos de gosto duvidoso, como a cena algo moralista das asas, com a amiga lésbica da vítima, ou a dos manifestantes a cantar, assim como alguns lugares-comuns nos diálogos (quando se tenta falar "à jovem"), o que desequilibra alguns momentos mas não afecta a consistência global do projecto.

A encenação minimalista é adequada, pois o mais importante aqui é a palavra, e apesar da simplicidade há algumas sequências inventivas como a da cobertura dos media, que se suporta em várias projecções de falsas reportagens em simultâneo.

O elenco combina actores de várias gerações, entre veteranos e nomes menos experientes, e se todos desempenham os seus papéis com competência, há alguns cuja versatilidade os torna dignos de destaque, casos de Isabel Abreu, Pedro Laginha e, sobretudo, Albano Jerónimo, tendo este último a seu cargo as personagens mais díspares.
A solidez da direcção de actores, aliada ao ritmo rápido de uma narrativa fragmentada, mas inteligível, torna "Laramie" numa obra conseguida e envolvente, e acima de tudo plena de actualidade e pertinência.

E O VEREDICTO É: 3/5 - BOM

segunda-feira, maio 15, 2006

ÁFRICA DELES

Embora seja realizador há já alguns anos - o seu primeiro filme, "Scandal", data de 1989 -, Michael Caton-Jones nunca foi dos mais estimulantes, antes um tarefeiro por vezes competente mas cujas obras não apresentam consideráveis doses de inspiração ou personalidade.
"Instinto Fatal 2", estreado este ano, evidencia esse cenário, porém "Shooting Dogs — Testemunhos de Sangue", que chegou recentemente - e de forma bem mais discreta - às salas, está uns furos acima desse e de outros títulos banais de Caton-Jones, como "Doc Hollywood" ou "O Chacal".

Inspirado no massacre ocorrido no Ruanda em 1994, onde cerca de 800.000 tutsis foram assassinados por milícias de etnia hutu, "Shooting Dogs — Testemunhos de Sangue" baseia-se nas experiências de um jornalista da BBC, David Belton, que esteve presente durante os trágicos acontecimentos, e foi filmado nos locais onde decorre a acção do filme, maioritariamente numa escola nos arredores da capital que serviu de quartel-geral provisório para os soldados da ONU.

A película acompanha o empenho de um jovem professor idealista recém-chegado e de um dedicado velho padre há décadas no local em salvar grande parte da população tutsi da zona que se refugiou na escola, o único local que lhes garante alguma segurança, pelo menos enquanto estiver também ocupado por representantes das Nações Unidas.
No entanto, a partir do momento que estes últimos recebem ordens de evacuar o país, nada impedirá que as milícias hutu, que cercam o local, dêm continuidade ao genocídio, colocando em risco não só os ruandeses mas também os estrangeiros que insistam em permanecer no local.

Duro e arrepiante retrato da carnificina resultante de situações extremas, "Shooting Dogs — Testemunhos de Sangue" convence ao aliar o foco de uma questão pertinente a uma abordagem emocionalmente intensa, evitando ceder à manipulação que prejudica, não raras vezes, projectos centrados em temáticas similares.

Conseguindo ser angustiante e reveladora sem recorrer ao sentimentalismo oportunista, a acção do filme desenvolve-se sem se limitar a uma mera ordenação esquemática de acontecimentos, privilegiando o contraste dos conflitos humanos, tanto interiores como exteriores.

O contributo dos dois actores principais é fulcral, e tanto o veterano John Hurt (seguro como sempre) como o jovem Hugh Dancy (com um desempenho que interliga eficazmente ingenuidade, receio e determinação), estão à altura do que lhes é exigido, compondo personagens com as quais é fácil estabeler empatia e cujas inquietações são bem verosímeis.

A realização de Caton-Jones, crua e despojada, próxima de um estilo documental, acentua o sentido de urgência e crispação, consolidando um realismo palpável, contribuindo também para que este seja um dos seus trabalhos mais sólidos.

Marcado por cenas onde emerge o pior e, por vezes, o melhor da natureza humana, "Shooting Dogs — Testemunhos de Sangue" é uma obra sentida e honesta que não merece passar despercebida, ainda que infelizmente, e à semelhança da situação que retrata, esteja quase condenada à indiferença de grande parte do público, pois ao contrário de, por exemplo, "Instinto Fatal 2", não conta com uma grande campanha promocional nem com um nome mediático no elenco.
E O VEREDICTO É: 3,5/5 - BOM

domingo, maio 14, 2006

ESTRANHA FORMA DE FADO

“Acabaram as canções”. Foi esta a última frase que Maria Antónia Mendes (ou Mitó) cantou na noite de sábado durante o concerto d’A Naifa, perante o quase esgotado auditório do Fórum Lisboa. É um dos versos da letra de “Tourada”, canção interpretada há décadas por Fernando Tordo que foi revisitada pela banda, encerrando de forma efusiva um concerto que se manteve quase sempre sóbrio até ao segundo encore.

Mas há, porém, no projecto constituído por Luís Varatojo (Despe e Siga, Linha da Frente), João Aguardela (Sitiados, Megafone), Paulo Martins (Ramp) e a referida vocalista, mais novas canções, e sobretudo mais sinais de consistência para uma pop urbana cantada em português, gerada através de uma interessante fusão de tradição e modernidade.

“Canções Subterrâneas”, o disco de estreia d’A Naifa, editado em 2004, já sugeria que o quarteto procurava encontrar um espaço singular pela combinação de domínios aparentados do fado com atmosferas electrónicas, e o recente “3 Minutos Antes de a Maré Encher”, de 2006, dá continuidade a essa linguagem própria, aliando a tradição do folclore português com um cosmopolitismo impresso através de reminiscências do trip-hop.

Foi a propósito do final da digressão nacional de promoção ao segundo álbum que a banda se apresentou em Lisboa, iniciando o espectáculo com os quatro primeiros temas do alinhamento do mesmo, o curto instrumental “Um” e “Da Uma da Noite às Três da Manhã”, “Monotone” e “Fé”.
Apaziguadas e minimalistas, estas canções foram bem conjugadas com recordações do primeiro disco do projecto, caso do mais dinâmico e dançável “Música” ou de “Rapaz a Arder” e “Meteorológica”.

O contraste da guitarra portuguesa com a bateria e o baixo eléctrico revela-se um dos maiores atractivos das canções d’A Naifa, embora as letras não o sejam menos, uma vez que se tratam de poemas de José Luís Peixoto, Adília Lopes, Rui Lage ou João Miguel Queirós, entre outros, que se adaptam sem dificuldades à sonoridade do grupo.
Apesar destes bons condimentos, o concerto ofereceu alguns episódios mornos, já que a banda se mostrou sempre profissional e rigorosa mas raramente encetou quaisquer contactos com o público. O segundo encore terá sido uma das poucas excepções, onde Mitó convidou o público a dançar e cantar, rompendo com a postura mais formal que manteve até então.

Mesmo desequilibrada, a noite registou suficientes bons momentos, tendo os melhores ficado a cargo do intenso dramatismo de “Todo o Amor do Mundo Não Foi Suficiente”, da cativante energia rítmica de “Señoritas” ou da convidativa versão de “Alfama”, dos Mler Ife Dada.

Convincente a nível vocal e instrumental, A Naifa comprovou ao vivo o que o seu segundo disco já demonstrava, impondo-se como um projecto pleno de referências mas que tem vindo a encontrar um espaço seu.
Lamenta-se, por isso, que o concerto tenha durado pouco mais de uma hora, terminando precisamente no seu momento mais enérgico, onde a maior parte do público insistiu em aplaudir de pé. Mas se aí as canções acabaram mesmo, a julgar pelas reacções não terão sido poucos os que foram redescobri-las nos discos logo de seguida.
E O VEREDICTO É: 3/5 - BOM

Videoclip: "Música"

sábado, maio 13, 2006

O MAL

Projecto de três dos mais aclamados cineastas orientais a emergir nos últimos anos, "3... Extremos" (Three...Extremes) reúne três médias metragens, com cerca quarenta minutos cada, dirigidas por Fruit Chan, Park Chan-wook e Takashi Miike, que em comum têm o facto de apresentarem histórias onde emerge a faceta mais sórdida, perversa e sinistra do ser humano.

"Preciosa Iguaria" (Dumplings), de Fruit Chan, relata até onde está disposta a ir uma actriz que pretende retardar o seu envelhecimento, recuperando a sua juventude através do consumo de bolinhos de massa com ingredientes, no mínimo, pouco convencionais.
Alicerçando-se num saboroso (passe a expressão) humor negro, o realizador de Hong Kong oferece uma perturbante experiência cinematográfica, onde apesar da morbidez das situações o argumento nunca resvala para domínios do choque gratuito, convencendo e intrigando pela sobriedade com que se desenrola.

Se "Preciosa Iguaria" entusiasma pela sugestão doentia, "Corta!" (Cut), do sul-coreano Park Chan-wook, contém cenas de uma violência mais gráfica do que psicológica, centrando-se num conceituado realizador que é aprisionado em casa por um ex-colaborador e forçado a assassinar uma criança a sangue-frio, sob pena de ver os dedos da sua esposa serem decepados um a um.
O mais sangrento dos três contos conquista sobretudo pela energia visual que Chan-wook gera, impressionando com a fluidez da sua câmara, ágil e imprevisível, e pela paleta cromática com que ilustra uma atmosfera claustrofóbica.
O autor de "Old Boy - Velho Amigo" não é, infelizmente, tão bem sucedido na construção do argumento, mais uma história de vingança que por vezes se aproxima da saga "Saw" e peca pelo histerismo exacerbado, originando uma desequilibrada gestão do suspense.

"Caixas" (Box), do japonês Takashi Miike, mergulha nos sonhos - aliás, pesadelos - de uma escritora, que evocam memórias da sua infância e familiares. Inesperadamente contemplativo e sereno - desprovido do travo gore de "Audition" e "Uma Chamada Perdida" -, é um exercício que, ao enveredar por contornos introspectivos e enigmáticos, não consegue ser complexo nem envolvente mas antes maçador e pretensioso.
Miike injecta a espaços algum brilho formal, desenhando promissoras atmosferas oníricas e etéreas, mas a narrativa dispersa e arbitrária torna esta média metragem num esboço dispensável.

Partindo de uma ideia com potencial, "3... Extremos" é demasiado desequilibrado, pois a qualidade decrescente das suas três partes faz do filme um objecto apenas curioso, longe do melhor que o cinema oriental recente tem proporcionado. Arrepia, por vezes quase chega a assustar, mas como um todo é pouco mais do que inconsequente.
E O VEREDICTO É: 2/5 - RAZOÁVEL

sexta-feira, maio 12, 2006

RAY OF NIGHT

Em 1998, com "Ray of Light", Madonna demonstrou, para quem ainda tivesse dúvidas, que não iria deixar tão cedo o seu lugar no trono como rainha da pop, conseguindo nesse disco um dos seus picos comerciais e artísticos, que compensou o percurso menos auspicioso que a marcou depois do lançamento do polémico "Erotica" (1992).

Aliando-se a William Orbit, a cantora surpreendeu ao apostar numa absorvente e refrescante pop electrónica, revelando, mais uma vez, que tinha sentido de oportunidade na escolha dos colaboradores, pois a participação do produtor inglês foi decisiva para que o álbum resultasse e se tornasse no mais conseguido da sua carreira.

O mais dançável "Music" (2000) e o introspectivo e subvalorizado "American Life" (2003) reforçaram o contacto com a electrónica, mas aí Madonna recorreu sobretudo à produção do francês Mirwais, que lhes imprimiu sinais do french touch, através de sonoridades como um house algo encostado aos Daft Punk (no primeiro disco), e uma interessante fusão electroacústica, mais experimental (no segundo), embora fosse sempre a pop a comandar as operações.

Como antecipação para o álbum de 2005, "Confessions on a Dance Floor", foi escolhido o infeccioso single "Hung Up", entrada directa para a lista dos seus temas mais populares, uma canção festiva de irrepreensível eficácia que, samplando "Gimme Gimme Gimme", dos Abba, deixou bem claro que Madonna estava de volta e deixava de novo a sua marca.

Produzido por Stuart Price (mais conhecido como Jacques Lu Cont), elemento dos Les Rythmes Digitales e Zoot Woman, o disco reincide na electrónica mas não é uma repetição da receita dos antecessores, enveredando por ambientes disco-sound e eurodance, deixando claro que este é um party album como a cantora já não fazia desde inícios dos anos 80.

Despretensioso e nocturno, foi criado tendo em vista as pista de dança, como o título indicia, e nesse sentido é um trabalho de assinalável competência, destilando vibração e energia do princípio ao fim, sem pausas entre as canções, exigindo o acompanhamento e rendição do ouvinte.

Se por um lado essa coesão é uma vantagem, pode tornar o disco menos sedutor para audições noutros contextos, já que os temas resultam melhor como um todo do que individualmente e, embora viciantes e acessíveis, não são dos melhores que Madonna já criou.
Há alguns momentos altos, como o portentoso "I Love New York", ode electrorock à cidade que nunca dorme, "Forbidden Love", episódio dream pop próximo dos Air, ou o incontornável "Hung Up", mas de resto não há muitos mais acima de uma sólida mediania.

Menos estimulante e denso do que os três álbuns anteriores, "Confessions on a Dance Floor" é, mesmo assim, um bom regresso, embora a auto-citação da cantora se torne, por vezes, cansativa, já que o refrão de "Push" é primo direito do de "Like a Prayer" e as melodias de "Isaac" lembram, a espaços, as de "Frozen", e a canção até insiste na reflexão espiritual já implementada em "Ray of Light".
O regresso ao passado repete-se na efervescente "How High", em versos como "Nobody's Perfect/ I Guess I Deserve It", que recordam títulos de canções de "Music".

Retrofuturista, kitsch, por vezes algo genérico (com sonoridades vizinhas das de Goldfrapp, Kylie Minogue, Depeche Mode, Gwen Stefani ou Daft Punk) e sempre minuciosamente produzido, "Confessions on a Dance Floor" é um álbum cativante mas cujo impacto emocional é bem menor do que as doses de adrenalina que as suas canções irradiam, equilíbrio francamente mais conseguido no ainda insuperável "Ray of Light". Plenamente satisfatório nas noites que poderá animar, provavelmente esquecível nas manhãs seguintes.
E O VEREDICTO É: 3/5 - BOM

Madonna - "I Love New York"

quinta-feira, maio 11, 2006

ESTREIA DA SEMANA: "TERROR NAS MONTANHAS"

Se na semana passada foi difícil destacar apenas uma estreia, já que a maioria tinha potencial, nesta ocorre o oposto, pois que nenhuma parece especialmente promissora. A sério, ainda alguém tem paciência para Julianne Moore a fazer novamente de coitadinha em "Freedomland - A Cor do Crime"? Ou para a comédia (?) "O Matulão da Vovó"? E para "Lassie"? Repito: "Lassie"???
No meio disto, dê-se o benefício da dúvida a "Terror nas Montanhas" (The Hills Have Eyes), de Alexandre Aja, remake de "Os Olhos da Montanha", de Wes Craven, proposta de terror sobre uma família que se perde no deserto do Novo México e é perseguida por vítimas de radiações de testes nucleares. Faz sentido, com estreias destas é mesmo um salve-se quem puder...

Outras estreias:

"Freedomland - A Cor do Crime", de Joe Roth
"Inocência", de Lucile Hadzihalilovic
"Lassie", de Charles Sturridge
"O Matulão da Vóvó", de Nicholaus Goossen
"O Último Destino 3", de James Wong

quarta-feira, maio 10, 2006

O MATADOR

"Uma História de Violência" (A History of Violence) tem sido caracterizado por muitos como um dos filmes mais atípicos de David Cronenberg, uma vez que aposta em território mais convencional, até mesmo mainstream, cuja premissa não é muito diferente da de muitos outros thrillers, opondo-se assim aos exercícios ousados e trangressores que notabilizaram o realizador canadiano.

Ora, se é verdade que o filme não é contaminado por uma estranheza e bizarria tão acentuadas como em "Crash" ou "Irmãos Inseparáveis", também não deixa de apresentar alguns dos elementos-chave da obra do cineasta, entre os quais a exploração dos meandros mais recônditos e obscuros da natureza humana, das fronteiras entre a sanidade a loucura, dos conflitos entre o instinto e a razão ou, em última instância, da identidade.

Paralelamente a estes, a película centra-se ainda, como o título denuncia, na violência e na relação que o Homem estabelece com esta, tanto a de aproximação como a de repúdio, partindo das experiências de um pai de família cujo apaziguado dia-a-dia como dono de um restaurante de uma pequena vila dos EUA é subitamente colocado em causa.

Após ter assassinado dois assaltantes em legítima defesa, salvando as vidas dos que se encontravam no seu estabelecimento, Tom Stall é subitamente promovido a herói local, mas essa situação irá trazer-lhe contrariedades inesperadas à medida que o seu suposto passado é revelado à sua família, deitando por terra um quotidiano pacato vincado pelo american dream.

Combinação de thriller e drama familiar, "Uma História de Violência" coloca o protagonista e aqueles que lhe são mais próximos à beira do abismo, assombrados por um passado que finalmente vem à superfície revelando uma rede de actos dominados pelos impulsos mais viscerais e primitivos.
À medida que se confronta com a sua natureza, Tom debate-se com figuras que o perseguem em busca de vingança e lida com as reacções pouco abonatórias dos seus familiares, suscitando uma sequência de acontecimentos onde a violência, física ou psicológica, impera como elemento primordial e inescapável.

Por detrás de uma narrativa esquemática, Cronenberg planifica um ensaio sobre a integração da violência na esfera humana, mas, tal como em algumas das suas obras, também aqui a execução fica aquém do conceito.
Se até certo ponto o "Uma História de Violência" causa impacto devido a uma bem gerida carga dramática, onde há espaço para a ambiguidade - vejam-se os contrastes entre as cenas de sexo, dois dos mais interessantes momentos onde a tridimensionalidade das personagens se insinua -, o carácter essencialmente paródico e offbeat da segunda metade do filme (em especial do último terço) desequilibra os resultados.

Pontuadas por um humor negro e um dinamismo gráfico semelhantes aos de Tarantino, as cada vez mais exageradas e inverosímeis cenas de acção tornam Tom Stall num lutador que faria inveja a Chuck Norris e quase o colocam ao lado dos muitos super-heróis (anti-herói, neste caso) que têm sido adaptados dos comics para cinema ultimamente (nem por acaso, o filme foi adaptado de uma graphic-novel).

Além do argumento, também a direcção de actores oscila entre a consistência e a desinspiração, pois se Maria Bello e o jovem estreante Ashton Holmes oferecem desempenhos de alta estirpe e Ed Harris mantém o rigor que lhe é reconhecido, Viggo Mortensen apresenta uma interpretação apática e sem brilho, à semelhança da maioria dos seus papéis (e longe do magnetismo exposto no tão injustamente ignorado "The Indian Runner", de Sean Penn), e William Hurt exagera nas doses de histrionismo cartoonesco, tornando-se cabotino e caricatural.

Com tanto de pertinente como de questionável, "Uma História de Violência" é, à semelhança do seu protagonista, uma obra mutante, indecisa entre proporcionar a abordagem complexa de um drama adulto ou o esgrouviamento de um pastiche western/série B/filme-de-gangsters. Ao optar por ambos, ganha singularidade mas perde, infelizmente, muito do seu efeito.
E O VEREDICTO É: 3/5 - BOM

segunda-feira, maio 08, 2006

RESISTIR-LHE É IMPOSSÍVEL

Quando "A Idade do Gelo" chegou às salas, em 2002, foi encarado por muitos como um parente pobre dos filmes de animação da Pixar/Disney ("Monstros e Companhia") ou da Dreamworks ("Shrek"), uma vez que este produto dos estúdios da 20th Century Fox não apresentava, a nível de técnicas de animação digital e sobretudo do argumento, doses de inovação e criatividade tão grandes quanto esses.

Quatro anos depois, a saga do trio de amigos Manny, Sid e Diego - e das memoráveis peripécias de Scrat e respectiva bolota - tem continuidade em "A Idade do Gelo 2 — Descongelados" (Ice Age: The Meltdown), e felizmente constata-se que o tempo de espera valeu a pena, já que esta despretensiosa aventura, não sendo especialmente inventiva e muito menos revolucionária, contém um equilíbrio que tem faltado à maioria das obras de animação recentes (casos dos decepcionantes "Shrek 2", "Madagáscar", "A Noiva Cadáver" ou "O Castelo Andante").

Desta vez, os protagonistas tentam sobreviver à inundação que ameaça deixar parte do planeta submerso, fruto do aquecimento global que derrete o gelo a um ritmo alarmante. Assim, os três heróis do primeiro filme são forçados a deixar o seu lar e partir em busca de território mais seguro, mantendo a união que os caracteriza e que os ajuda a enfrentar problemas internos e externos.

Pelo caminho, regista-se a adição de três novas personagens, a mamute Ellie e os seus dois irmãos gambás, e as peripécias que se geram em torno desta inusitada ligação familiar despoletam alguns dos momentos mais hilariantes de "A Idade do Gelo 2 — Descongelados".

Leve e cativante, a película surpreende o suficiente para que se torne numa experiência recomendável, já que os gags são quase sempre bem conseguidos e apropriados para um público dos 7 aos 77, recorrendo a um humor simples mas certeiro, que nasce dos conflitos das (irresistíveis) personagens e nunca parece forçado.

As técnicas de animação apresentam solidez e sofisticação, superando as do filme antecessor, e o argumento, embora pudesse ter mais densidade e coesão, não deixa de ser competente, mesclando comédia e algum suspense de forma aprazível.

"A Idade do Gelo 2 — Descongelados" dificilmente ficará na história como um grande acontecimento cinematográfico, pois não é um filme especialmente memorável ou marcante, mas quem tiver um mínimo de sentido de humor não lhe retirará o mérito de delicioso e muito eficaz entretenimento. Venha o próximo!

E O VEREDICTO É: 3/5 - BOM

domingo, maio 07, 2006

sábado, maio 06, 2006

OÁSIS TELEVISIVO

Este sábado, a 2: oferece uma noite marcada por uma muito recomendável oferta cinematográfica e musical.

Às 23h, é exibido "Os Mutantes", de Teresa Villaverde, um dos filmes portugueses mais marcantes da década de 90 com um devastador olhar sobre a adolescência que vale a pena (re)ver.

A seguir, pelas 00h45m, a qualidade mantém-se com "Collected", um especial dedicado aos brilhantes videoclips dos Massive Attack, que nada ficam a dever às suas excelentes canções (deixo um aperitivo ali do lado direito). É por pequenas surpresas como esta que ainda vai valendo a pena ligar a televisão.

sexta-feira, maio 05, 2006

MAIS DIAS INDIE

A terceira edição do IndieLisboa ocupou as salas do King, Fórum Lisboa e Londres entre 20 e 30 de Abril de 2006. Tal como ocorreu em 2005, acompanhei algumas sessões através do Cinema 2000, cujas críticas se encontram nos links abaixo:

"2 Duo", Nobuhiro Suwa
"Carreiras", Domingos de Oliveira
"Géminis", Albertina Carri

"Grain in Ear", Zhang Lu
"Megacities", Michael Glawogger
"Mirrormask", Neil Gaiman e Dave McKean
"M/other", Nobuhiro Suwa
"O Tempo que Resta", François Ozon
"Pavee Lackeen", Perry Ogden
"Play", Alicia Scherson
"Sehnsucht", Valeska Grisebach
"The Death of Mr. Lazarescu", Cristi Puiu
"The Fearless Freaks", Bradley Beesley
"The Wild Blue Yonder", Werner Herzog
"Un Couple Parfait", Nobuhiro Suwa

quinta-feira, maio 04, 2006

ESTREIA DA SEMANA: "O NOVO MUNDO"

Com uma semana carregada de estreias, e muitas delas entusiasmantes, torna-se difícil destacar uma, mas de qualquer forma por aqui aguarda-se com mais expectativa "O Novo Mundo" (The New World).
Enfim, o mediano (para não dizer mau) acolhimento que o novo filme de Terrence Malick tem tido internacionalmente não é muito abonatório, no entanto nada melhor do que tirar as dúvidas a partir de hoje e ver como é que o realizador de "Badlands" e "The Thin Red Line" aborda a relação de Pocahontas e de John Smith, assim como os conflitos entre os nativos americanos e os exploradres europeus.

Outras estreias:

"DR9 - Drawing Restraint 9", de Matthew Barney
"Maria Madalena", de Abel Ferrara
"Missão Impossível 3", de J.J. Abrams
"Movimentos Perpétuos - Tributo a Carlos Paredes", de Edgar Pêra
"Os Aristocratas", de Paul Provenza
"Pele", de Fernando Vendrell
"Shooting Dogs - Testemunhos de Sangue", de Michael Caton-Jones

quarta-feira, maio 03, 2006

METROPOLIS

Especializando-se na realização de documentários e comédia negras, Michael Glawogger tem sido um dos mais prolíficos cineastas austríacos, abordando frequentemente questões polémicas mas socialmente relevantes.

“Megacities”, documentário de 1998, é disso exemplo, e lança um olhar sobre os meandros mais conturbados de quatro grandes cidades mundiais - Bombaim, México, Moscovo e Nova Iorque -, proporcionando uma densa viagem por locais inóspitos e situações inquietantes.

Recorrendo a testemunhos de alguns habitantes destes centros urbanos, o filme fornece um retrato do seu quotidiano e das aflitivas condições de vida que o caracterizam, centrando-se nas experiências daqueles a quem o desenvolvimento das metrópoles não trouxe grande prosperidade.

Com uma narrativa fragmentada, que muda constantemente os indivíduos e peripécias em foco, “Megacities” peca por ser demasiado disperso, pois só a espaços consegue de facto aprofundar o retrato das pessoas e culturas em que se concentra.

Glawogger oferece alguns bons momentos, surpreendendo pela crueza e sentido de observação, mas também deixa dúvidas quanto à relevância de outros, caso das sequências com a dançarina mexicana – provavelmente a mais longa do filme – ou com os alcoólatras russos, onde a denúncia e crítica se confunde com a exploração, apoiando-se num voyeurismo questionável.

Em cenas como essa, “Megacities” contém os vícios de um pomposo filme-choque, preocupando-se sobretudo em impressionar o espectador mesmo que a pertinência das imagens que apresenta seja dúbia.

Entre os elementos mais conseguidos destacam-se os recorrentes travellings sobre as ruas das cidades ou um interessante contraste cromático gerado pela alternância de atmosferas, tornando-o num documentário com uma invulgar e absorvente energia visual.

Irregular mas recomendável, “Megacities” vale pelos episódios em que consegue transmitir a sensação de urgência e claustrofobia de algumas situações que relata sem que para isso se apoie numa exibicionista montra de decadência. Infelizmente, contudo, estes não ocorrem com a frequência suficiente para que o filme chegue ao brilhante retrato cujo potencial sugeria.

E O VEREDICTO É: 2,5/5 - RAZOÁVEL

terça-feira, maio 02, 2006

A VIDA É UM JOGO

Da América do Sul têm chegado, algumas das melhores e mais refrescantes surpresas cinematográficas dos últimos anos, revelando autores promissores do México (Alejandro González Iñárritu, Alfonso Cuarón), Brasil (Fernando Meirelles, Walter Salles) ou Argentina (Lucrecia Martel, Albertina Carri).

A julgar por “Play”, a chilena Alicia Scherson é mais um nome a juntar-se a essa crescente lista de novos realizadores a seguir, uma vez que a sua primeira longa-metragem expõe já convincentes provas de talento e personalidade.

Combinando drama e comédia, o filme é um sólido estudo de personagens que oscila entre o realismo e a fábula pois alterna cenas do quotidiano urbano de Santiago do Chile com pontuais momentos oníricos, onde a imaginação dos protagonistas é um aprazível ponto de fuga para as suas peripécias prosaicas e banais.

Cristina, uma recatada e solitária jovem enfermeira do interior, adapta-se à vida da cidade enquanto trata de um velho húngaro doente, tendo como únicos momentos lúdicos aqueles em que passeia pelo seu bairro ou joga “Street Fighter” no salão de jogos da zona.
Tristán é um arquitecto que não se sente motivado pelo trabalho nem pelo casamento, abandonando ambos e regressando à casa da mãe depois de ser vítima de um assalto onde perde os documentos, o isqueiro, cigarros, fotografias e o IPod.
Contudo, quando Cristina encontra a mala que contém estes objectos, sente um entusiasmo e uma curiosidade que a encorajam a seguir e tentar conhecer o seu dono na esperança de que o seu dia-a-dia se torne menos solitário e rotineiro.

Leve e escorreito, mas não desprovido de substância, “Play” é um olhar agridoce sobre as relações humanas, seguindo o percurso de dois losers que, aos poucos, vão reconstruindo em paralelo as suas vidas, influenciando-se mutuamente sem no entanto chegarem a ter contacto directo (pelo menos até certo ponto).

Scherson apresenta uma obra modesta, mas pontuada por ocasionais singularidades, caso do interessante recurso ao som (a música não tem aqui apenas um papel decorativo) ou dos jogos temporais da narrativa, oferecendo um trabalho formal inventivo e despretensioso.
A direcção de actores é igualmente segura, uma vez que tanto os protagonistas como os secundários são espontâneos e verosímeis, em particular o par central, capaz de dizer muito com as suas expressões e olhares.

Mesmo não atingindo o brilhantismo, “Play” é uma película agradável e inventiva, seduzindo pela elegância com que apresenta uma história simples - ainda que a espaços vincada por uma excentricidade controlada – e personagens tridimensionais, daquelas que poderiam encontrar-se a passar na rua à saída da sessão, e talvez, quem sabe, a seguir discretamente o espectador.

E O VEREDICTO É: 3/5 - BOM

BLINKS & LINKS

Obrigado ao Riccardo do blog Escrever e Ver Cinema por me blinkar :)

segunda-feira, maio 01, 2006

MUNDO FANTASMA

Um dos nomes do recente cinema romeno, Cristi Puiu estreou-se na realização com “Stuff and Dough”, de 2001, e apresenta em “A Morte do Sr. Lazarescu” (The Death of Mr. Lazarescu) a sua segunda longa-metragem, que marca o início das “Seis Histórias dos Subúrbios de Bucareste”, uma série de filmes que têm em comum a temática do amor.

No caso de “A Morte do Sr. Lazarescu”, de 2005, o realizador parte de uma abordagem do amor pelo próximo, ainda que o que amor seja algo que raramente se vislumbra no filme, o relato de uma turbulenta e tensa noite em que um idoso num estado físico cada vez mais débil – o tal Sr. Lazarescu, um homem pacato mas solitário - é transportado de hospital em hospital, sem que no entanto conte com grande ajuda quer dos médicos, quer dos familiares e conhecidos.

Cristi Puiu filma com um rigor clínico e frio esta penosa viagem, onde a vertigem da morte se intensifica pelo olhar quase documental através do qual o cineasta segue o velho doente e a enfermeira que o acompanha entre as urgências dos hospitais.

Caracterizado por um realismo por vezes sufocante, “A Morte do Sr. Lazarescu” dissemina uma aura de tristeza e desencanto pela forma como expõe a indiferença da maioria das personagens quanto ao destino do paciente, pois quase todas se encontram imersas nos seus próprios problemas e prioridades, negligenciando ou subestimando o estado crítico do Sr. Lazarescu.

Movendo-se entre o drama e o humor negro, o filme é um cruel e doloroso retrato dos recantos menos abonatórios da esfera humana, onde o egoísmo, a apatia e um individualismo exacerbado se revelam e disseminam.
A perspectiva que Puiu traça dos médicos e enfermeiros insiste especialmente neste pessimismo visceral, uma vez que todos (excepto a enfermeira Mioara, que acompanha obstinadamente o Sr. Lazarescu) são retratados como figuras cínicas, irresponsáveis, mesquinhas ou egocêntricas, que raramente exibem qualquer sinal de preocupação pela situação do doente.
É válido que o realizador queira criticar a incompetência que se manifesta em muitos dos serviços de saúde, mas proporcionar um olhar tão tendencioso e caricatural não será a forma mais perspicaz e legítima de o fazer.

Para além desta caracterização simplista, o filme é ainda prejudicado pelas suas excessivas duas horas e meia, que contêm muitas cenas desnecessárias e geram um cansativo efeito de repetição.
Piui tenta evidenciar a rotina que marca a passagem do doente pelos vários hospitais ao longo da noite, mas como as reacções dos médicos não são muito diferentes “A Morte do Sr. Lazarescu” vai perdendo o efeito-surpresa e entrando na previsibilidade.
O abrupto e insatisfatório desenlace também não ajuda a que o balanço seja muito auspicioso, traindo um pouco esta experiência cinematográfica relevante e promissora - por vezes capaz de despoletar um perturbante efeito sensorial -, mas demasiado parcial e desequilibrada.

E O VEREDICTO É: 2,5/5 - RAZOÁVEL