quinta-feira, dezembro 22, 2005

QUERIDA, ESCONDI OS MIÚDOS

Um dos filmes mais aguardados de 2005, Guerra dos Mundos” (War of the Worlds) é a adaptação cinematográfica do emblemático e influente livro homónimo de H.G. Wells, uma das obras literárias que mais contribuiu para criar os arquétipos de uma já paradigmática vertente da ficção científica: o contacto entre a raça humana e seres alienígenas.

Curiosamente, essa nova perspectiva sobre a obra de Wells foi elaborada por um nome que criou já marcantes títulos cinematográficos que se inserem dentro desse género, Steven Spielberg, por isso estavam reunidos, à partida, os condimentos certos para o filme resultar.

Ora, se não chega a ser uma obra-prima, “Guerra dos Mundos” é, ainda assim, uma das mais estimulantes propostas de ficção científica do novo milénio, revelando um realizador que, apesar de irregular, possui um inegável savoir-faire e sabe como fazer um blockbuster que, embora recorra aos obrigatórios efeitos especiais (fenomenais, diga-se) e contenha múltiplas cenas de acção acelerada, não se limita a seguir os automatismos que orientam muitos tarefeiros dos dias de hoje e que apenas se preocupam em gastar as maiores quantias em explosões megalómanas, desconsiderando tudo o resto.

É certo que a temática das invasões extraterrestres está longe de ser algo novo, e mesmo que Wells tenha sido um percursor uma adaptação da sua obra corria o risco de trazer um sabor a requentado. Spielberg, porém, consegue que o filme não seja um déjà vu e proporciona um intrigante olhar sobre o contacto com o outro, a relação com o medo, a insegurança, o apocalipse e, claro, a família, referência indispensável nos seus trabalhos.

Colocando o espectador como testemunha das peripécias de um pai divorciado e dos seus dois filhos (uma criança e um adolescente) que, para além da sua problemática relação, são obrigados a reagir às repentinas investidas de letais invasores, “Guerra dos Mundos” interliga domínios do drama e da ficção científica, temperados com vitais doses de acção e terror.
Esta mistura, se por um lado revela que a película tenta fazer com que as personagens não sejam meras figuras que percorrem uma série de etapas – algo que debilita muitos blockbusters -, também leva a que os dilemas gerados pelos laços familiares dos protagonistas nem sempre sejam desenvolvidos da forma mais conseguida, uma vez que, apesar dos esforços, as personagens não chegam a ser tão tridimensionais como se esperaria.

Tom Cruise, no papel de um pai cujo temperamento algo difícil não o impede de lutar para proteger sempre a sua família, apresenta um desempenho competente, assim como Justin Chatwin e a pequena Dakota Fanning, que encarnam dois jovens credíveis, contudo estes protagonistas são mais estereotipados do que refrescantes.
A personagem de Chatwin, em especial, carece de maior desenvolvimento, limitando-se a servir as conveniências do argumento e não tanto a definir um espaço singular na acção.

Esta limitação, assim como o desenlace anti-climático e pouco satisfatório, torna “Guerra dos Mundos” num filme irregular, característica que o impede de atingir a excelência que outros dos seus elementos sugerem. Não deixa por isso de ser um grande filme, já que Spielberg oferece um ritmo absorvente, com múltiplos momentos de prodigioso suspense vincado por um criativo trabalho de realização.
Há por aqui vários momentos de antologia, desde a cena em que Dakota Fanning se depara com os cadáveres no rio até ao arrepiante comboio em chamas, não esquecendo, claro, os tensos momentos em que a personagem de Cruise viaja com os filhos no automóvel.

Carregado de uma claustrofobia a que dificilmente se fica indiferente, “Guerra dos Mundos” é uma película arrojada e visceral (excepto no já referido final), que não tem medo de expor o melhor e o pior da humanidade, apresentando as atitudes que emergem quando a própria vida está em risco e todas as acções são orientadas em função disso, para o bem e para o mal.

Possuindo algumas das sequências mais asfixiantes vistas no grande ecrã em 2005, alicerçadas numa exímia gestão de cliffhangers e numa imbatível energia visual, o filme afirma-se como o melhor de Spielberg desde o brilhante “Relatório Minoritário” (este sim, provavelmente o melhor dos melhores), superando sem dificuldades a convencional mediania de “Apanha-me se Puderes” e “Terminal de Aeroporto”.
Não chega a ser o mais impressionante filme do ano, mas dizima todos os outros blockbusters com um profissionalismo à prova de bala (ou, no caso, de alienígenas).
E O VEREDICTO É: 4/5 - MUITO BOM

13 comentários:

Ricardo disse...

Viva,

O que tem piada nestes assuntos da Sétima Arte é eu às vezes ficar a pensar se estão mesmo a falar do mesmo filme que eu vi. Este é um dos casos em que não parece mesmo...

Abraço,

gonn1000 disse...

Não? Hum, estou a ver que então ainda gostaste mais do que eu eheheh...

Sérgio Lopes disse...

Desculpa mas parece-me errada a classificação. O filme tem demasiados buracos quer de argumento quer de realização, para ser considerado uma obra-prima. Pra mim, foi uma das desilusões do ano. À parte dos efeitos especiais, não tem nada. Já viste a classificação no IMDB? Cumprimentos,

Sérgio Lopes.

gonn1000 disse...

Precisamente por ter alguns problemas é que eu escrevi que NÃO o considero uma obra-prima. Reduzi-lo a um conjunto de efeitos especiais é que me parece injusto, porque dentro do género não houve nada tão consistente nos últimos anos (ou houve?). A classificação no IMDB é-me indiferente para analisar o filme.

Anónimo disse...

Não sei o porquê as pessoas gostam tanto desse filme... acho tão medíocre. Só mesmo os efeitos visuais chamam a atenção e a Dakota Fanning que é "cute". De resto... eu daria uma nota 7/10

Ricardo disse...

Sim, sim! Devo ter gostado ainda mais do que tu (tosse convulsiva)...

Abraço,

Daniel Pereira disse...

Apesar de Eastwood e Bergman, o melhor filme estreado em Portugal, este ano!

Sérgio Lopes disse...

Desculpa Gonçalo, mas não entendo... Não o consideras uma obra-prima e classificas-o com 8/10??? Então ukmma obra-prima, no teu entender terá 11/10...LOL. eu daria 6/10. Há que exigir mais de spielberg/Cruise, certo?

1 abraço.

Bom Natal.

Sérgio lopes

magnolias_forever disse...

Lamento discordar! Simplesmente detestei o filme, (fui ver ao cinema ainda por cima), foi tipo bola de neve, quanto mais o filme avançava pior impresão tinha e aquele fim... (no comments). Nada que se compare com "Minority Report". Ainda que noutro registo, gostei muito mais de "Apanha-me se puderes" e "Terminal de Aeroporto"!
Mas gostos são gostos, certo?
:) Feliz Natal

Anónimo disse...

Apesar de ter ficado um pouco desiludido com a visão que Spielberg quis trazer sobre a Guerra dos Mundos, com a fococalização mais em Cruise e o tema da família do que propriamente na invasão...onde apesar de tudo ainda existe uma boa dose dela. Mas numa apreciação geral penso que é um bom filme de entretenimento e destrona muitos (como já foi dito) blockbusters deste ano. Continuo a achar que Spielberg é um grande realizador. Venha Munique para o próximo ano :)

gonn1000 disse...

Teco Apple: Dás 7/10 a um filme medíocre???

Ricardo: Eu sabia... Como diz alguém que aprecias, nunca me engano e raramente tenho dúvidas :P

Daniel Pereira: Não sabia que tinhas gostado assim tanto, mas sim, é bem melhor do que esses dois (o do Bergman então... enfim).

Cine-Asia: Não, a meu ver a obra-prima é mesmo um 10/10, 8/10 é muito bom. Bom Natal :)

magnolias_forever: Certo, não foi um filme consensual. Bom Natal :)

membio: Sim, é um entretenimento capaz de dar arrepios (no bom sentido). Fica bem e boas festas :)

Anónimo disse...

Spielberg é um dos meus realizadores preferidos, Tom Cruise é um dos meus actores preferidos e como tal até gostei do filme, embora esperasse muito mais!
E para mim o Justin Chatwin tinha morrido: que rapaz irritante! Até eu representava melhor do que ele...tenho dito :P!

Abraços e Boas Festas =)

gonn1000 disse...

Pois, o Chatwin também não me convenceu muito, embora o filme também não lhe desse grande relevância.
Boas festas :)