quinta-feira, junho 30, 2005

O STRESS E A CIDADE

Embora tenha já uma considerável experiência enquanto argumentista, produtor e realizador televisivo, Paul Haggis só adquiriu maior visibilidade através da escrita do argumento de "Million Dollar Baby - Sonhos Vencidos", o muito aclamado (e sobrevalorizado) filme e Clint Eastwood.

Os trabalhos anteriores de Haggis, no entanto, nem sempre foram alvo de elogios - a sua colaboração na série televisiva "Walker: o Ranger do Texas" não é propriamente um sinal de credibilidade -, por isso era difícil prever se "Colisão" (Crash), a sua estreia na realização de longas-metragens, seria uma obra inspirada ou um desfile de clichés.

Felizmente, o filme não só é convincente como figura, desde já, entre os títulos cinematográficos fulcrais de 2005.
Explorando as interligações de uma extensa galeria de personagens situadas em Los Angeles, "Colisão" é um forte e sensível olhar sobre as vicissitudes das relações humanas e o que nos separa e aproxima uns dos outros.

Abordando com especial ênfase a temática da xenofobia, o filme aposta num elenco multicultural para evidenciar o melting pot de um ambiente urbano onde o ritmo do dia-a-dia é cada vez mais inquietante e acelerado, reflectindo-se nas (progressivamente conturbadas) relações pessoais.

Haggins envereda por um retrato complexo e abrangente, evitando caracterizações simplistas e mensagens edificantes e moralistas, concedendo ambiguidade às personagens sem nunca as julgar nem as tratar como símbolos de uma qualquer etnia ou ideologia.

A soberba direcção de actores é decisiva para que a densidade dramática do filme resulte, e nesse sentido "Colisão" oferece um dos elencos mais coesos do ano.
Entre estrelas mediáticas como Sandra Bullock (num dos seus papéis mais interessantes), Matt Dillon (que encarna aqui um intrigante polícia), Brendan Fraser (que mais uma vez comprova ser um actor a ter em conta) ou Don Cheadle (seguro como sempre), passando por nomes promissores como Ryan Phillipe (encarnando um jovem que aprende a não ver o mundo a preto-e-branco) ou Larenz Tate e o cantor Ludacris (numa dupla de delinquentes), o filme contém uma série de presenças que compõem personagens credíveis e absorventes.

Se o contributo dos actores é um dos pontos fortes de "Colisão", este nem sempre é bem aproveitado, uma vez que há algumas personagens cujo potencial fica algo inexplorado. Haggis poderia, por isso, ter estendido um pouco mais a duração do filme, de forma a que o desenvolvimento das personagens fosse ainda mais conseguido.

Apesar dessa pequena limitação, esta é ainda uma obra bem acima da média, atestando o talento de Haggis não só na criação de argumentos mas também na realização. Apresentando uma sólida gestão do ritmo, com uma eficaz interligação dos múltiplos episódios de um quotidiano em ebulição, o realizador proporciona ainda uma envolvente energia visual, pois a sua perspectiva de uma LA nocturna é tão entusiasmante como a que Michael Mann efectua em "Colateral" (com uma banda-sonora e fotografia notáveis).

Partindo de um início não muito original - um acidente de viação que serve de ponto de partida para que as personagens se entrecruzem, algo que "Amor Cão", de Alejandro Gonzalez Iñarritu, ou "Crash", de David Cronenberg já desenvolveram -, "Colisão" torna-se numa película surpreendente, cativando devido à combinação de vinhetas geralmente cruas e realistas que conseguem despoletar momentos de um intenso impacto emocional sem recorrerem a fórmulas melodramáticas e rodriguinhos fáceis.

Duro mas também emotivo, "Colisão" é um brilhante filme-mosaico, uma equilibrada estreia na realização de um cineasta/argumentista que se distingue aqui como um dos nomes mais promissores do actual cinema norte-americano. Se desse mais tempo e espaço para as suas personagens se revelarem na sua plenitude, "Colisão" poderia ascender ao estatuto de obra-prima. Assim, é "apenas" muito bom, e um dos títulos obrigatórios de 2005. Imperdível.

E O VEREDICTO É: 4/5 - MUITO BOM

BLINKS & LINKS

Obrigado ao Nuno Rodrigues por me blinkar no seu blog Alta Fidelidade. Quem gostar de música, cinema e aparentados só ganha em passar por lá...

REGRESSO AO FUTURO

Depois do concerto de Billy Corgan em Lisboa, fiquei curioso em relação ao primeiro álbum a solo do ex-vocalista dos Smashing Pumpkins (ah sim, e dos Zwan). Mesmo não sendo dos melhores discos em que o músico já colaborou (até está muito longe disso), "TheFutureEmbrace" é suficientemente bom para merecer algumas audições. Agora é só esperar que os rumores sejam verdadeiros e que os Pumpkins regressem :D

Mesmo que não sejam grandes fãs do rapaz, experimentem ouvir o disco gratuitamente aqui. Não perdem nada ;) Em breve falarei do álbum mais detalhadamente...

terça-feira, junho 28, 2005

gonn10.000

Gerado há oito meses, este blog ultrapassou recentemente a fasquia dos 10.000 visitantes :D Obrigado, por isso, a todos os que passam ou passaram por aqui, desde os mais assíduos (que já são alguns) aos esporádicos.
Não sei muito bem se o rumo do blog irá manter-se assim ou sofrer alterações - como de resto também não sabia no primeiro post, em Outubro de 2004 -, mas espero que estejam cá todos para ver no que isto vai dar (conto com vocês para o gonn100.000 LOL)...
Vai um copito de champanhe para festejar (não aprecio muito, mas a ocasião justifica-o)?

SANGUE, SUOR E BALAS

Com uma obra ecléctica, capaz de ir dos contos infantis ao romance de moldes clássicos, o chileno Luís Sepúlveda tem assinalado um respeitável percurso enquanto escritor, evidenciado em títulos elogiados como "O Velho que Lia Romances de Amor", "Nome de Toureiro" e "História de uma Gaivota e do Gato que a Ensinou a Voar".

"Diário de um Killer Sentimental", editado em 1996, é um dos seus livros de culto e segue o quotidiano de um assassino profissional quarentão com um currículo invejável, mas cuja determinação e perspicácia começam a ceder à medida que se envolve emocionalmente com uma jovem francesa.

A situação torna-se mais conturbada quando a sua amada lhe comunica que pretende deixá-lo, notícia que ameaça o seu profissionalismo e lhe dificulta a eliminação da sua nova encomenda, um dúbio filantropo envolvido em actividades misteriosas cujo paradeiro é de difícil determinação (obrigando o protagonista a deslocar-se por Madrid, Istambul, Frankfurt, Paris e Cidade do México).

Apostando na estrutura do romance negro e do policial, Sepúlveda proporciona aqui uma história crua e escorreita, geralmente contaminada por consideráveis doses de ironia e sarcasmo.
O leitor entra facilmente na acção, uma vez que a economia narrativa permite que a leitura seja acessível e absorvente, e o autor constrói um protagonista que, apesar dos ambíguos padrões morais, possui carisma suficiente para que a sua jornada seja minimamente intrigante (o facto da obra ser narrada na primeira pessoa ajuda).

"Diário de um Killer Sentimental" é um livro divertido q.b., mas infelizmente não é muito mais do que isso, ficando aquém daquilo que se esperaria do autor.
As peripécias da personagem central oferecem algumas reviravoltas interessantes e dois ou três momentos bem observados (as corrosivas conversas com os taxistas, a crítica à hipocrisia da sociedade actual), mas falta espessura a esta história e às suas personagens.
O pouco surpreendente desenlace torna o livro ainda menos memorável, enveredando por um twist demasiado previsível, e no fim da leitura do livro sente-se que há aqui uma boa premissa mal aproveitada.

"Diário de um Killer Sentimental" não deixa de ser uma obra agradável e que se lê com algum interesse, mas peca por ser demasiado curta e esquemática, encalhando numa pouco estimulante mediania. Em suma, lê-se bem e esquece-se com a mesma facilidade...

E O VEREDICTO É: 2/5 - RAZOÁVEL

SANGUE NOVO

20 anos depois da morte de António Variações, as canções do singular músico regressaram e tornaram-se no motor de um dos mais curiosos projectos do panorama musical português actual, os Humanos.

Manuela Azevedo (dos Clã), David Fonseca e Camané - juntamente com Hélder Gonçalves (Clã), Nuno Rafael, João Cardoso e Sérgio Nascimento (ex-elementos dos Despe & Siga e colaboradores de Sérgio Godinho) - trabalharam os temas inéditos que Variações deixou e geraram aquele que terá sido o mais elogiado disco português de 2004, "Humanos", bem-recebido pelo público (já vai na tripla platina) e pela crítica.

O (super)grupo apresentará as suas canções ao vivo no Coliseu de Lisboa hoje e amanhã, pelas 21h30m, num espectáculo promissor e aguardado com expectativa q.b.. Se calhar passo por lá...

segunda-feira, junho 27, 2005

VERÃO (CINEMATOGRÁFICO) ESCALDANTE

Até Setembro, os cinemas Nimas e Ávila têm uma programação especial dedicada ao que de melhor se fez nos últimos anos nas àreas do cinema francês e dos independentes norte-americanos.

Os filmes são renovados de dois em dois dias e entre as propostas encontram-se títulos tão recomendáveis como "Não Dou Beijos" e "Juncos Silvestres", de André Téchiné; "Irreversível", de Gaspar Noé; "O Gosto dos Outros", de Agnés Jaoui; "Quem Me Amar Irá de Comboio" e "O Seu Irmão", de Patrice Chereau (no Nimas); ou "Ghost World - Mundo Fantasma", de Terry Zwigoff; "As Regras da Atracção", de Roger Avary; "Tarnation", de Jonathan Caouette e "Antes do Anoitecer", de Richard Linklater (no Ávila); entre muitos outros.

Obviamente, é um programa imperdível para qualquer cinéfilo que se preze. Os horários das exibições de todos os filmes encontram-se aqui. Para hoje destaco "Pedaços de Uma Vida", de Peter Hedges (crítica no post abaixo), às 15h e às 21h30m no Ávila.

A FILHA PRÓDIGA

Peter Hedges não é propriamente um novato, como o atestam trabalhos na área do teatro e literatura.
No campo da sétima arte teve também algumas experiências, através da escrita dos argumentos de "Gilbert Grape", de Lasse Hallstrom, e "Era uma Vez um Rapaz", de Paul Weitz, projectos que lhe deram alguma credibilidade e respeito.
Contudo, Hedges nunca se tinha aventurado na realização, por isso o seu primeiro projecto nessa área despoletou alguma expectativa nos meandros do cinema alternativo em 2003, quando "Pedaços de uma Vida" (Pieces of April) foi gerado.

A premissa do filme não é propriamente genial nem especialmente intrigante: April Burns, uma jovem algo rebelde que vive num bairro nova-iorquino, prepara-se para receber a sua família no Dia de Acção de Graças, mas a confecção do almoço torna-se cada vez mais atribulada à medida que uma série de imprevistos vão ocorrendo.

Tentando não desiludir os seus familiares - com quem, de resto, não tem uma relação muito próspera -, a protagonista envolve-se numa rede de peripécias com os seus vizinhos, procurando alguém que a auxilie na sua tarefa de forma a que o dia não se torne num episódio frustrante.

Acompanhando os dilemas de April e a viagem da sua famíla, "Pedaços de uma Vida" proporciona um olhar agridoce sobre as ambiguidades das relações humanas, adoptando traços de road movie e de história redentora sem cair em estereótipos.
Hedges provou, nos seus trabalhos de argumento anteriores, que sabia retratar habilmente as tensões e dificuldades dos relacionamentos, e aqui o seu talento volta a manifestar-se, transformando o filme numa obra mais interessante do que aquilo que o seu ponto de partida faria prever.

Premiado e nomeado em vários festivais de cinema internacionais - sobretudo devido à convincente interpretação de Patricia Clarkson no papel de Joy Burns, a complexa mãe da protagonista -, "Pedaços de uma Vida" é uma inspirada e refrescante primeira-obra.

Embora siga os moldes da escola do cinema independente norte-americano - não dispensa atmosferas outonais, personagens disfuncionais à deriva, realização seca e despojada (com recurso à câmara à mão), banda-sonora gerada por uma banda indie (no caso, os Magnetic Fields) -, o filme combina drama e comédia de forma muito eficaz, contendo consideráveis doses de sarcasmo e ironia mas nunca ignorado a densidade emocional das personagens.

Se ao sólido argumento e realização se adicionar uma coesa direcção de actores - Katie Holmes surpreende no seu primeiro grande papel , antes de se tornar na namoradinha de Tom Cruise e do novo Batman -, obtêm-se os ingredientes certos para uma apelativa, divertida e absorvente estreia.
Um auspicioso início de um novo cineasta a reter.

E O VEREDICTO É: 3,5/5 - BOM

domingo, junho 26, 2005

(JANTAR) ABERTO ATÉ DE MADRUGADA

Mais um fim-de-semana a dar as últimas. Entre as memórias mais marcantes, fica a noite de ontem, uma saturday night fever que assinalou o reencontro com alguns ex-colegas da fac na casa da Dré.

Entre um acompanhamento musical a cargo dos Placebo, A-Ha, a banda-sonora de "Perto Demais" (com a ala feminina - que a certa altura incluía toda a gente excepto eu - a delirar com o Damien Rice) e salsa (passo!), e uma sessão dupla de cinema com "Antes do Amanhecer" e "Antes do Anoitecer" (este último em versão fast-forward), passou-se uma noite interessante. E daqui a uns meses é a minha vez de ser o anfitrião...

BARALHAR E VOLTAR A DAR

Numa altura em que o cinema oriental parece evidenciar-se cada vez mais, disseminando-se por tudo o mundo e conquistando públicos mais alargados, torna-se não só numa reconhecida influência para o trabalho de cineastas, mas é também influenciado por estes.

"Kung-Fu-Zão" (Kung Fu Hustle), a mais recente película de Stephen Chow, é um esgrouviado combinado de acção, humor, suspense e artes marciais, uma dinâmica paródia a códigos e géneros cinematográficos que tanto satiriza as rebuscadas aventuras de kung-fu como envereda também por paralelismos a obras de ficção científica ou westerns.

Chow, que no currículo contava já com a realização do delirante "Shaolin Soccer", volta a apostar num filme carregado de energia cinética, recorrendo a exageradíssimas sequências de combate numa obra cujo visual estilizado oferece alguns momentos efervescentes, evidenciando os impressionantes progressos do digital.

Ecléctico melting pot de referências, "Kung-Fu-Zão" tanto assenta nas sagas de "Kill Bill" ou "Matrix" como nas tradicionais histórias de kung-fu, passando por uma notória aproximação ao dinamismo dos universos cartoon norte-americanos e anime.

O argumento - que segue as peripécias de um jovem indeciso (interpretado pelo próprio Chow) entre a lealdade ao ameaçador Gang do Machado ou a procura de um caminho mais nobre - dá quase sempre prioridade ao desfile de prodígios visuais, e as personagens nunca vão além da caricatura numa história maniqueísta e formatada.
Contudo, os pequenos achados na concepção de certas cenas conseguem compensar (na medida do possível) a evidente linearidade dramática, tornando "Kung-Fu-Zão" num aceitável entretenimento, que a espaços até entusiasma mas que como um todo é bastante desigual (e sobretudo redundante, pois à medida que o filme decorre o efeito surpresa tende a descrescer).

O que fica? Algumas coreografias e efeitos especiais minuciosamente trabalhados, duas ou três cenas divertidas, uma montagem dinâmica e trepidante e um ritmo escorreito. Longe de revolucionário, é certo, mas dentro do cinema assumidamente lúdico e descartável consegue, ainda assim, elevar-se acima de grande parte da concorrência.
E O VEREDICTO É: 2/5 - RAZOÁVEL

sexta-feira, junho 24, 2005

UMA NOITE SEM PROBLEMAS

Tudo começou com "Goodnight Moon", em 1999, uma sóbria canção entre a folk e o indie rock que possuía a mais-valia de contar com uma voz sedutora e envolvente. O tema, que ainda hoje é o mais emblemático dos norte-americanos Shivaree, despertou curiosidade acerca da banda, que se estreou com o promissor álbum "I Oughtta Give You a Shot in the Head for Making Me Live in This Dump" (só pelo soberbo título, já valia a pena), continuou com "Rough Dreams" e editou recentemente "Who's Got Trouble".

Foi a propósito do lançamento do seu terceiro disco que o grupo regressou a palcos nacionais, finalizando a sua digressão no Café-Teatro Santiago Alquimista, em Lisboa, no passado dia 22.

O concerto durou pouco mais de uma hora, mas o que não ofereceu em quantidade compensou em qualidade, uma vez que a banda exibiu eficácia e coesão, apresentando ao vivo a vertente intrigante e apelativa que transmitem nos discos.

Grande parte da competência do espectáculo deveu-se, sem dúvida, à carismática presença de Ambrosia Parsley, capaz de conquistar o público logo nos minutos iniciais com a sua postura afável e espirituosa.

Incidindo sobretudo em "Whos's Got Trouble", o alinhamento congregou uma série de canções onde a folk, a pop, o altcountry e o indie rock coexistem pacificamente, num registo próximo dos Mazzy Star, Cowboy Junkies ou Elysian Fields.
Grande parte dos novos temas percorre ambientes apaziguados e aconchegantes, pontualmente intercalados por episódios onde as guitarras se evidenciam com maior aspereza e dinamismo.

Desde "Little Black Mess", logo no início, passando por "I Close My Eyes", "New Casablanca" ou a muito acarinhada "Mexican Boyfriend", a noite foi pródiga em momentos cativantes, onde não faltaram regressos ao passado como "Bossa Nova", "Gone Too Far" e, claro, a incontornável "Goodnight Moon".

A aura intimista do concerto foi reforçada pela postura de Ambrosia Parsley, que frequentemente se dirigiu aos espectadores e contou algumas histórias, com destaque evidente para a conturbada relação dos seus avós.
Vestida de negro e mantendo uma pose discreta, a vocalista foi uma mestre-de-cerimónias perspicaz e calorosa, disseminando uma sensualidade natural e conseguindo ser tão inebriante como Shirley Manson ou Fiona Apple.

Conquistando a maioria dos presentes - que não eram assim tantos mas demonstraram um inequívoco entusiasmo, como ficou comprovado em três encores muito aplaudidos - os Shivaree proporcionaram um concerto suficientemente acolhedor, doseando melancolia e descontracção, mas que poderia ter sido mais convincente se não tivesse apostado em dois ou três momentos algo mornos e repetitivos.

Sentiu-se a falta de algumas canções fortes como "Reseda Casino", "Daring Lousy Guy", "Thundercats" ou "Lunch", que poderiam ter complementado um espectáculo agradável, mas que acabou por saber a pouco. Mesmo assim, enquanto durou, deixou boas memórias, evidenciando que esta é uma banda a revisitar sempre que possível.
E O VEREDICTO É: 3/5 - BOM

quinta-feira, junho 23, 2005

INTERPOL & INTERNET

Acabei de chegar do (bom) concerto dos Shivaree, mas por agora o destaque não vai para eles (comentário ao espectáculo em breve), antes para outra recomendável banda dos dias de hoje.

Através de "Turn on the Bright Lights" e "Antics", os Interpol tornaram-se num dos mais interessantes nomes do rock actual, e enquanto o terceiro disco não chega fica aqui uma oportunidade para descobrir algumas canções raras do grupo. Enjoy ;)

NOITE ESCURA

Não sou grande adepto de discotecas, não só porque não gosto de estar envolto numa multidão onde é impossível ter uma conversa audível mas também porque grande parte do cardápio musical de muitos espaços é de gosto duvidoso. Outro factor relevante é a débil formação de algumas pessoas que trabalham nesses locais, como a Dré aponta num artigo que subscrevo quase na totalidade. Vejam se concordam...

quarta-feira, junho 22, 2005

CIDADE MARAVILHOSA

Num período em que Hollywood parece ter descoberto a viabilidade comercial de adaptações cinematográficas de ícones dos comics norte-americanos, era uma questão de tempo até "Sin City - A Cidade do Pecado", série escrita e desenhada por Frank Miller, chegar ao grande ecrã.

Uma das mais elogiadas obras do argumentista/desenhador que redefiniu heróis como Batman ou Demolidor, "Sin City - A Cidade do Pecado" assenta nos códigos do film noir e apresenta uma galeria de personagens, geralmente rudes e agressivas, que tentam sobreviver numa cidade não menos agreste e violenta.

Se a série de BD era alvo de culto e prestígio, o filme promete alargar a esfera de admiradores - e de incontornáveis detractores - já que é alvo de uma divulgação massificada e não é conhecido apenas por um nicho fiel mas restrito. O hype é tão grande que já muitos consideram que esta adaptação é o - ou um dos - melhores filmes do ano, assim como uma das películas mais fiéis à matriz dos comics.

Realizado por Robert Rodriguez e pelo próprio Frank Miller - contando ainda com uma sequência dirigida por Quentin Tarantino - "Sin City - A Cidade do Pecado" manifesta uma absoluta reverência à BD que lhe deu origem, apresentando uma exímia reprodução das nebulosas atmosferas urbanas, marcadas por ambientes nocturnos e inóspitos.

O filme impressiona visualmente ao recorrer a um dos grandes trunfos das graphic novels de Miller: um vibrante contraste cromático entre o preto e o branco, intensificando a carga noir e gerando uma aura peculiar e absorvente. A espaços, algumas manchas de cor estrategicamente escolhidas - vermelhos e amarelos garridos, sobretudo - invadem algumas cenas, concedendo ao filme um estilo único e hipnótico.

Estilo é, de resto, a palavra-chave de "Sin City - A Cidade do Pecado", já que Rodriguez aproveita para regressar aos tons cool que se julgavam já perdidos depois do realizador enveredar por subprodutos como "Spy Kids". O criador de "Desperado" ou "Aberto até de Madrugada" assinala aqui um saudável regresso à forma, misturando bem os ingredientes para criar uma intensa experiência cinematográfica.

Desdobrando-se em três histórias centrais, o filme contém um núcleo de personagens que seriam a pior companhia a encontrar num beco escuro: polícias sem princípios, prostitutas letais e armadas até aos dentes, criminosos à beira da loucura e demais figuras obscuras que se entrecruzam - raras vezes de forma pacífica - nas suas travessias nocturnas. Marcadas pelo amor (ou falta dele), sexo, agressividade e egocentrismo, a maioria dos protagonistas do filme não olha a meios para atingir os fins, por isso quem estiver no seu caminho é só mais um alvo a abater.

Marv (visceral Mickey Rourke), uma criatura gigantesca e ameaçadora, é subitamente tocado pelo amor quando a misteriosa Goldie (Jaime King) passa uma noite com ele. Contudo, esse breve momento não é mais do que um ameno interlúdio na sua vida, uma vez que, ao encontrar a sua amante morta na cama, Marv volta a entrar numa espiral de crueldade em busca de vingança contra os responsáveis pelo assassinato.

O lacónico Dwight (magnético Clive Owen) é forçado a enfrentar o esgrouviado Johhny Boy (Benicio Del Toro, hilariante) para proteger a sua namorada (Brittany Murphy, num desempenho sem grande carisma), mas depois disso terá de auxiliar um grupo de prostitutas - lideradas por um amor antigo, Gail (uma efervescente Rosario Dawson) - a lidar com inimigos bem mais sinistros.

Na terceira história, Hartigan (Bruce Willis, igual a si próprio) protege obstinadamente uma criança de investidas pedófilas, e acaba por se apaixonar por esta ao reencontrá-la anos mais tarde, quando Nancy (Jessica Alba, uma boa surpresa) é já uma mulher.

Protagonizado por um atractivo lote de estrelas - para além das referidas acima pontuam ainda Elijah Wood (macabro como nunca antes), Josh Hartnett (intrigante, mas sem muito para fazer), Nick Stahl ou Michael Clarke Duncan - "Sin City - A Cidade do Pecado" conta com um elenco titânico e só peca por nem sempre saber aproveitá-lo, pois há actores cuja participação é pouco mais do que um cameo.

O problema é de um argumento que, apesar de estimulante, não se preocupa em inserir grande densidade às personagens, reduzindo-as a figuras unidimensionais e estereotipadas. Caso estes anti-heróis tivessem maior complexidade, "Sin City - A Cidade do Pecado" seria não só um filme poderoso, formalmente irrepreensível e com uma energia contagiante, mas facilmente atingiria o estatuto próximo de uma obra-prima. Assim, é uma dinâmica experiência sensorial, carregada de estilo, mas algo desequilibrada na substância que contém.

Este elemento manifestava-se também no sobrevalorizado "Kill Bill - A Vingança", mas Tarantino conseguiu um maior equilíbrio no segundo episódio dessa saga, inserindo-lhe uma vital densidade dramática. Rodriguez, como já é habitual tendo em conta a sua filmografia, aposta apenas na caricatura e no superficial, e embora se saia bem - sobretudo nas electrizantes peripécias que envolvem Clive Owen/ Rosario Dawson/ Benicio Del Toro - não consegue fazer milagres.

O resultado é um divertido, brutal, dinâmico e muito pouco verosímil exercício de estilo, que não desilude mas também não é tão bom ao ponto de ser incensado. Ainda não é desta que Brian Singer ("X-Men", "X-Men 2") e, principalmente, Sam Raimi ("Homem-Aranha", "Homem-Aranha 2") perdem o estatuto de cineastas que adaptaram de forma mais inspirada heróis da BD para cinema nos últimos anos. Talvez Rodriguez atinja esse nível nas sequelas de "Sin City - A Cidade do Pecado", já em preparação.

E O VEREDICTO É: 3,5/5 - BOM

AMBROSIA, APETECE-ME ALGO...

Apresentando ao vivo o seu terceiro registo de originais, "Who's Got Trouble?", os norte-americanos Shivaree actuam esta noite no Café-Teatro Santiago Alquimista, em Lisboa. O trio composto por Duke McVinnie, Danny McGough e, claro, pela encantatória e envolvente Ambrosia Parsley traz um conjunto de canções que oscilam entre o indie rock, a folk, o altcountry e a pop de travo jazzístico.

Depois da auspiciosa estreia com "I Outta Give You a Shot in the Head for Making Me Live in This Dump", de 1999, e de "Rough Dreams" (não tão interessante), de 2002, a banda promete proporcionar uma tranquila e intrigante noite com os seus novos temas. Vou tentar estar lá hoje pelas 22 horas...

CRACKED LCD

Infelizmente não pude ir ao concerto dos LCD Soundsystem, por isso a alternativa mais apelativa foi mesmo rever "Moulin Rouge". Não sou grande apreciador de musicais, mas admito que esta obra de Baz Luhrmann tem o seu carisma e até a achei menos irregular do que no primeiro visionamento. E suspeito que outros bloggers também não perderam mais uma oportunidade de rever o filme...

LINKS & BLINKS

Obrigado aos responsáveis pelo blog Reservoir Movies por me blinkarem. Passem por lá...

terça-feira, junho 21, 2005

VAMOS ADERIR AO SISTEMA?

Para muitos, o primeiro álbum - homónimo - do projecto LCD Soundsystem é já um dos discos essenciais de 2005.

A mistura de indie rock e electrónica, com traços de funk e pós-punk, não é propriamente uma novidade nos dias de hoje, mas James Murphy e Tim Godsworthy geraram uma amálgama peculiar cujo culto se iniciou em Nova Iorque mas também já tem adeptos entre nós.

O single "Daft Punk is Playing at My House" já se disseminou pelas pistas de dança e será seguramente um dos temas presentes no concerto dos LCD Soundsystem hoje e amanhã no Lux, em Lisboa, pelas 23h30m.

Se calhar passo por lá hoje à noite :)

TV MAIS

E pronto, mais um óptimo episódio...Agora que já arrancou de vez, a quarta temporada de "Sete Palmos de Terra" já está a gerar algumas alterações nos protagonistas.

Spotlight para David e Claire, numa interessante e sui generis cena paralela que mostra um desenvolvimento de personagens cada vez mais elaborado. No pólo oposto, o marido da Ruth é cada vez mais irritante o Nate e (sobretudo) a Brenda também não andam muito longe...Ah, e se eu já não gostava de teen pop, a (ex)patroa do Keith deu a machadada final. E o desenlace com os diálogos d' Os Simpsons foi um detalhe de génio :D

Ainda bem que há pelo menos uma estação televisiva que sabe como utlizar o horário nobre e exibe a melhor série do momento a horas decentes...

BLINKS & LINKS

Obrigado ao keyser por me blinkar no notes. ;) Boa sorte com o recém-formado blog...

segunda-feira, junho 20, 2005

GIRL POWER!

Embora relativamente recentes, as Le Tigre são já uma das mais peculiares bandas do cenário musical alternativo norte-americano. Constituído por Kathleen Hanna (das extintas Bikini Kill, um dos nomes centrais do universo riot grrrl), pela realizadora Sadie Benning (entretanto substituída por J. D. Samson) e por Johanna Fateman, criadora de fanzines, o trio estreou-se em 1999 com um álbum homónimo e gerou desde então mais dois registos de originais: "Feminist Sweepstakes", de 2001, e "This Island", de 2004.

O terceiro disco das Le Tigre dá continuidade à postura fusionista que se verifica desde o início do grupo, apostando em domínios lo-fi onde o indie rock, o punk, o electro e a pop se mesclam, fazendo de "This Island" um disco com tanto de experimental como de estranhamente acessível.

As canções, directas e curtas (a maioria vai pouco além dos três minutos de duração), focam os dilemas das relações humanas, a arte ou mesmo a política, contendo uma postura consideravelmente feminista, embora a carga militante, mais ou menos óbvia, nunca retire o carácter lúdico das composições.

"This Island" não inova muito face aos registos anteriores do trio, mas possui uma série de momentos que comprovam que a fórmula das Le Tigre ainda resulta. O primeiro single, "TKO", é tão catchy e trauteável como os melhores temas dos Bis; "Seconds" e "Don't Drink Poison" são portentosas descargas de energia; "Tell You Now" e "Sixteen" percorrem domínios de um intimismo sedutor; "Viz" é um curioso olhar sobre a street culture e a cover de "I'm So Excited", velho hit das Pointer Sisters, é um exemplo de pop simultaneamente reluzente e enigmática.

Aproximando-se da irreverência das Chicks on Speed, da intrigante ambiguidade sexual de Peaches e do eclectismo cosmopolita das Luscious Jackson, "This Island" não desbrava novos territórios mas é suficientemente refrescante para merecer algumas audições, atestando a vitalidade de um projecto a seguir com atenção.

E O VEREDICTO É: 3/5 - BOM

domingo, junho 19, 2005

UM CASAMENTO ATRIBULADO

Mais mediatizado pelo facto de, aparentemente, ter servido de rampa de lançamento para a dissolução do casamento de Brad Pitt com Jennifer Aniston (devido à suposta relação do actor com Angelina Jolie) do que pelo seu valor cinematográfico, "Mr. e Mrs. Smith" (Mr. & Mrs. Smith) obteve um destaque considerável por todo o mundo e era, por vários motivos, um dos blockbusters mais aguardados do Verão de 2005.

Mistura de thriller com drama conjugal, a mais recente película de Doug Liman junta duas das estrelas mais emblemáticas de Hollywood no papel de um casal de assassinos profissionais que nunca revelam um ao outro a sua verdadeira actividade durante seis anos (ou melhor, cinco) de casamento.
Para além de partilharem a mesma actividade sem o saberem, trabalham para organizações concorrentes, o que acaba por originar uma situação conturbada quando ambos são encarregados de eliminar o mesmo alvo.

Partindo de uma premissa curiosa - mas longe de original, uma vez que o filme homónimo de Alfred Hitchcock ou "A Verdade da Mentira", de James Cameron, apresentam motes semelhantes -, "Mr. e Mrs. Smith" não procura ser mais do que um filme-pipoca que se apoia em dois nomes sonantes para proporcionar duas horas de entretenimento despretensioso. E até nem se sai mal, já que Brad Pitt e Angelina Jolie destilam carisma e a combinação de comédia (não raras vezes negra) e megalómanas cenas de acção é competente.

Doug Liman, responsável por "Swingers", "Go - A Vida Começa às Três da Manhã" e "Identidade Desconhecida", confirma-se novamente como um tarefeiro eficaz, apresentando um ritmo com energia cinética q.b. e um dinamismo constante. Infelizmente, o realizador dá prioridade a sequências de tiroteio e explosões, que apesar de minimamente entusiasmantes ficam aquém dos pontuais momentos de ironia presentes nos diálogos entre o casal.

É pena, porque se enveredasse com maior frequência pelos domínios da tensão conjugal e dificuldades de uma vida a dois e não tanto por cenas de acção pouco ou nada credíveis, "Mr. e Mrs. Smith" ocuparia um espaço mais interessante e singular.
Assim, é mais um blockbuster estilizado, efervescente e cool, com uma energia visual por vezes cativante (que, de resto, Liman já está habituado a desenvolver), mas de escassa substância e densidade dramática (por onde anda a criatividade de "Go - A Vida Começa às Três da Manhã"?)...

Mesmo assim, dentro do género cumpre os objectivos, já que nunca se pode pedir mais do que entretenimento a uma película que é, assumidamente, um filme-pipoca. Vê-se com algum agrado mas não deixa grandes saudades...

E O VEREDICTO É: 2,5/5 - RAZOÁVEL

sexta-feira, junho 17, 2005

ELES (AINDA) VIVEM...E RECOMENDAM-SE!

Ocupando um lugar entre as bandas mais relevantes e influentes dos anos 80, através da combinação dos universos do rock e da electrónica efectuada em discos marcantes como "Power, Corruption and Lies" ou "The Brotherhood", os New Order passaram, depois dessa fase áurea, por um período de menor inventividade, reciclando as ideias que haviam exposto nos seus primeiros registos.

"Republic", de 1993, apesar de bons singles como o mediático "Regret", apresentou um nível qualitativo abaixo do esperado, e "Get Ready", de 2001, manteve essa irregularidade, reforçando a carga rock mas não gerando grande entusiasmo, ainda que temas como "Crystal" ou "Vicious Streak" tenham provado que a banda ainda era capaz do melhor.

O recente "Waiting for the Siren's Call", de 2005, não volta a colocar os New Order no grupo dos projectos mais criativos do momento, dadas as escassas cargas de novidade que contém, mas pelo menos consegue ser o álbum mais coeso do grupo desde o emblemático "Technique", de 1987.

Apostando numa pop electrónica que raramente se manifestava no seu antecessor, o novo trabalho da banda não reinventa nada, antes adapta a sonoridade característica do grupo ao presente com competência, proporcionando um conjunto de canções que, embora não estejam ao nível de clássicos como "Blue Monday" ou "True Faith", conseguem constituir um resultado interessante.

O primeiro single "Krafty", New Order vintage, combina eficazmente melancolia e esperança, elemento que se manifesta em grande parte dos temas do álbum. "I Told You So" envereda por coordenadas algo inesperadas, com travos quase reggae; "Dracula's Castle" é uma vibrante pérola pop; "Jetstream", com Ana Matronic dos Scissor Sisters, destaca-se como uma óptima aposta para qualquer playlist com bom gosto; e "Guilt is a Useless Emotion", com um refrão que não destoaria numa canção de Kylie Minogue (!), oferece viciantes atmosferas dançáveis.

Num período em que novos projectos como os Interpol, The Killers ou The Bravery expõem óbvias reminiscências de sonoridades da década de 80, os New Order comprovam que, para além de veteranos influentes, ainda são capazes de criar um álbum que, mesmo não estando entre os seus melhores, também não envergonha ninguém.

"Waiting for the Siren's Call" não é um grande disco, e às primeiras audições até desilude, mas merece ser ouvido com atenção, pois a voz de Bernard Summer e o baixo de Peter Hook continuam profícuos e envolventes.
E O VEREDICTO É: 3/5 - BOM

quinta-feira, junho 16, 2005

APANHEM-NO SE PUDEREM

Uma das melhores surpresas do IndieLisboa 2005, "Salto Mortal" (Somersault) chega hoje a salas nacionais e é um belo filme sobre a adolescência. Não deverá ficar muito tempo em cartaz, por isso aproveitem para o ver enquanto é tempo porque vale muito a pena. Mais pormenores aqui.

quarta-feira, junho 15, 2005

REBELDES COM CAUSA

Nos últimos anos, filmes como "O Pianista", de Roman Polanski, ou "A Queda - Hitler e o Fim do Terceiro Reich", de Oliver Hirschbiegel, têm reavivado a memória do Holocausto, propondo diversas perspectivas sobre uma das catástrofes mais marcantes do século XX.

"Sophie Scholl – Os Últimos Dias" (Sophie Scholl - Die letzten Tage), de Marc Rothemund, volta a centrar-se nessa temática, mais propriamente nas peripécias do movimento Rosa Branca (Weisse Rose), implementado por um grupo de jovens alemães que reagiram, sem recorrer à violência, às medidas nazistas que se disseminaram pela Alemanha nos anos 40.

A película segue o percurso de Sophie Scholl, uma persistente estudante universitária, e do seu grupo de amigos, que distribuem folhetos clandestinamente, apelando a uma revolta contra o sistema ditatorial. Contudo, quando as suas manobras são descobertas, a protagonista é alvo de um exaustivo ataque psicológico por parte dos elementos da Gestapo, vendo a sua vida ameaçada à medida que as acusações vão sendo cada vez mais reforçadas.

Baseado em factos verídicos - Sophie Scholl existiu de facto -, o filme começa bem, apresentando um ritmo escorreito e uma tensão digna de um thriller consistente, pois Marc Rothemund consegue inserir alguma vertigem nas situações que envolvem os planos de oposição dos jovens revolucionários.
Contudo, esta densa vibração nem sempre se mantém, uma vez que "Sophie Scholl – Os Últimos Dias" segue depois moldes próximos de um vulgar telefilme, não dispensando longas e cansativas cenas de redundantes interrogatórios e do estereotipado julgamento. Esta linearidade manifesta-se também nas personagens, que exceptuando a protagonista são pouco aprofundadas.

É pena que estes momentos de previsibilidade dominem grande parte do filme, dado que as atmosferas claustrofóbias e os tons duros e secos concedem a "Sophie Scholl – Os Últimos Dias" uma interessante carga realista e, por vezes, próxima de uma vertente documental.

Premiado com dois Ursos de Prata no Festival de Berlim – Melhor Realizador para Marc Rothemund e Melhor Actriz para Julia Jentsch (numa interpretação sentida e convincente) -, o filme acaba por ser vítima do peso das expectativas, não por ser mal conseguido mas por não ir tão longe quanto poderia.
Honesta e com uma envolvente aura idealista, "Sophie Scholl – Os Últimos Dias" é uma obra meritória e relevante, mas demasiado frágil, não ficando, infelizmente, como um registo especialmente marcante acerca das experiências do regime nazi. Não deixa de ser um filme a ver, ainda assim.

E O VEREDICTO É: 2,5/5 - RAZOÁVEL

OS AMIGOS SÃO (SÓ) PARA AS OCASIÕES?

É curioso como há pessoas que, quando tomamos a iniciativa de contactá-las em diversas ocasiões, raramente demostram entusiasmo mas, quando necessitam, não hesitam em pedir-nos favores, ainda que não se tenham esforçado minimamente por nos contactar em quaisquer outras circunstâncias.
Estranho como conseguem insistir ou perguntar "Posso contar contigo para me ajudares?" quando não se preocuparam em dar sinal de vida durante tanto tempo...Ou então talvez o façam porque contam com a resposta previsível do costume, mas como nada dura para sempre (pelo menos quando não é recíproco), a certa altura a resposta tem mesmo de mudar...
Desculpa, V., mas os anos passam, as pessoas mudam, e eu já não estou para isso...

terça-feira, junho 14, 2005

UM DOMINGO QUALQUER

Mais um nome a acrescentar a uma promissora nova geração de realizadores mexicanos - que inclui cineastas como Alfonso Cuarón ("Grandes Esperanças", "E a Tua Mãe Também"), Alejandro González Iñarritu ("Amor Cão", "21 Gramas") ou Guillermo Del Toro ("Blade 2", "Hellboy") - Fernando Eimbcke estreia-se nas longas-metragens com "Temporada de Patos", um pequeno filme de baixo orçamento elogiado na sua terra-natal, no Festival de Cannes e na primeira edição do IndieLisboa.

Um olhar sobre a banalidade do quotidiano e os dramas da adolescência, a película centra-se em quatro jovens que passam um domingo juntos no apartamento de um deles. Dois rapazes de 14 anos preparam-se para mais uma tarde recheada de videojogos e comida rápida, mas uma falha na electricidade e a presença de dois "convidados" inesperados - a vizinha de 16 anos de um deles que precisa de utilizar o fogão e um entregador de pizzas a quem os dois adolescentes não querem pagar - faz com que o dia não seja, afinal, tão convencional.

Agridoce e minimalista, "Temporada de Patos" é uma discreta comédia lo-fi que assenta na solidão da adolescência e na quebra dos laços familiares para gerar um retrato de quatro personagens que, aos poucos, se vão apoiando mutuamente.
Recorrendo a uma estrutura episódica, com pequenas vinhetas num registo entre o caloroso e o levemente amargurado, Fernando Eimbcke oferece uma obra curiosa, mas desigual, pois o ritmo nem sempre envolve e o argumento é demasiado fragmentado.
A acção é dominada pela inércia, algo que é interessante nos momentos iniciais, na apresentação de cenários do dia-a-dia urbano, mas que se torna repetitivo e monótono, uma vez que a meio da sua duração o filme não sabe que rumo seguir.
"Temporada de Patos" vale essencialmente pelo refrescante quarteto de jovens actores, que irradia uma cativante espontaneidade, e pelo cuidadoso trabalho formal, desde a apelativa fotografia a preto-e-branco até uma dedicada atenção ao pormenor. Contida e pouco ambiciosa, é uma aceitável primeira obra, intrigante a espaços mas que como um todo permanece quase sempre numa mediania apenas promissora. Uma proposta eficaz mas longe de surpreendente.

E O VEREDICTO É: 2/5 - RAZOÁVEL

QUEM CASA QUER CASA...

...mas quem não casa (pelo menos durante os próximos tempos) também quer.
Se há uns dois ou três meses me dissessem que em breve iria assinar o contrato para comprar uma casa, eu não acreditaria. Mas, como a vida é cheia de surpresas, hoje (aliás, ontem), depois de reflectir durante algumas semanas, assinei um. Yup, com isto a minha vida foi alvo de um autêntico twist a la David Fincher...Ainda estou a digeri-lo...

segunda-feira, junho 13, 2005


EM DIRECTO PARA A GRAVAÇÃO

Após um concorrido espectáculo na noite anterior, a 9 de Junho a Aula Magna registou uma nova enchente de espectadores para o segundo concerto consecutivo dos The Gift naquele espaço, assinalando o 6ª aniversário da sua estreia nesse palco singular.

Em 1999, a banda de Alcobaça era um projecto que estava a dar os primeiros passos e a implementar-se no panorama musical português, hoje são um dos grupos da linha da frente da nova geração, como o atestam os três álbuns de originais e uma crescente legião de fãs.

O espectáculo da passada quinta-feira teve a particularidade de ter sido gravado, estando disponível em CD logo à saída do concerto, algo inédito e inesperado que despoletou uma chuva de aplausos quando a vocalista Sónia Tavares o anunciou.

Percorrendo os três discos de originais da banda (e revisitando ainda o EP de estreia "Digital Atmosphere"), a noite foi suficientemente ecléctica, evidenciando as múltiplas facetas e universos do grupo.

Como se esperava, grande parte do alinhamento incidiu sobre o registo mais recente, o duplo "AM-FM", que ofereceu canções como as tranquilas "1977", "Wallpaper", o instrumental "I Am AM" e a envolvente "Are You Near?" - estes de "AM" - e temas mais dinâmicos como "Music", os singles "Driving You Slow" e "11:33" (muito bem recebidos pelo público e dois dos pontos altos do espectáculo) ou o portentoso "You Know", com vibração rock próxima dos The Strokes, cuja intensidade conquistou os espectadores através de um irresistível apelo dançável.

Se as novas canções foram alvo de entusiasmo, as mais antigas não o foram menos, gerando bons momentos como a magnífica "Dream With Someone Else's Dream" (que, apesar de fazer parte de "Vinyl", foi apresentada com um arranjo mais próximo da versão de "Digital Atmosphere") ou a incontornável "OK Do You Want Something Simple", o primeiro êxito da banda, interpretado com texturas mais agressivas.

Os cativantes tons pop de "Question of Love", a aura grandiosa de "Front Of" e a introspecção de "Actress (AM-FM)” foram três dos episódios de "Film" que os The Gift revisitaram, numa paleta sonora que alternou entre ambientes intimistas e outros carregados de altas doses de energia, onde o público aplaudiu de pé e até dançou em várias ocasiões.

"Red Light", "Butterfly" e "Five Minutes of Everything" compuseram, já nos momentos finais, o trio do primeiro encore, e o cada vez mais viciante e hipnótico "So Free (3 Acts)" foi o desenlace perfeito para as cerca de duas horas de música, disseminando uma absorvente onda electrónica à qual foi difícil renunciar.

Proporcionando uma actuação sólida e consistente, com assinalável desenvoltura e versatilidade, os The Gift comprovaram, mais uma vez, a sua eficácia ao vivo num espectáculo que convenceu tanto na vertente sonora como na visual (destaque para o minucioso e elaborado trabalho de iluminação, adaptando-se às atmosferas específicas de cada canção).

A noite não registou a dose de surpresa presente, por exemplo, no concerto no Teatro S. Luiz em Dezembro de 2004, mais acolhedor e intimista e sem as dispensáveis palminhas a acompanhar a maioria das canções, mas foi, de qualquer forma, uma oportunidade de ver uma banda em forma. Esperemos que essa energia se comprove novamente daqui a outros seis anos.

E O VEREDICTO É: 3,5/5 - BOM

BLINKS & LINKS

Obrigado aos responsáveis pelos blogs Port Moresby e The Tracker por me blinkarem ;)

domingo, junho 12, 2005

BEACH BOY

Está inaugurada minha época de praia de 2005 :D

Primeiro dia de praia do ano (enfim, não contando com as férias no Brasil, mas isso já lá vai...), primeiro escaldão. Já é habitual, o Sol nunca gosta muito dos branquinhos, e desta vez nem fiquei assim tão escaldado. E, vá lá, também não fui vítima de assaltos, o que hoje em dia já é uma sorte...Bons mergulhos ;)

DURO DE MATAR

Bart (Bob Hoskins), um dos reis do submundo de Glasgow, conseguiu parte do seu poder devido a uma invulgar arma humana, uma autêntica máquina de matar que é tratada como um cão e até possui coleira.
Danny (Jet Li), criado pelo seu mentor desde a infância, sempre foi ensinado a agir com base na violência e na brutalidade, mantendo uma inequívoca fidelidade a Bart e defendendo os seus interesses.

Contudo, alguns acontecimentos farão como que esta situação comece a alterar-se e, aos poucos, Danny apercebe-se que há outras vias para além daquelas que sempre o orientaram. À medida que vai gerando laços de confiança e amizade, Danny afasta-se cada vez mais dos valores de Bart, atitude que não o poupará a tornar-se alvo de uma persistente tentativa de vingança.

"Danny The Dog - Força Destruidora" (Danny the Dog/ Unleashed) é uma mistura de drama e filme de artes marciais que junta Jet Li a uma conceituada dupla de actores - Bob Hoskins e Morgan Freeman -, apresentando as transformações de um protagonista que foge do seu lado mais primitivo para encontrar conforto na amizade e na arte.

Este ponto de partida parece prometedor nas cenas iniciais, uma vez que o realizador Louis Leterrier consegue proporcionar uma atmosfera urbana crua e negra, estilizada q.b., com uma fotografia rude, assim como sequências de acção razoavelmente coreografadas.
Contudo, durante a maior parte da sua duração, "Danny The Dog - Força Destruidora" segue um rumo demasiado simplista, previsível e forçado, apostando em personagens caricaturais e de escassa densidade. Há tentativas para desenvolver alguma tensão dramática, mas os resultados raramente convencem e o filme segue um caminho pouco credível.

Jet Li oferece uma interpretação esforçada, mas sem grande carisma, nunca dando alma ao seu "boneco", Morgan Freeman encarna um formatado ancião/confidente e Bob Hoskins desperdiça talento num vilão cujo único traço de caracterização é ser um concentrado de ganância e crueldade.

Quem gostar de cenas de combate exageradas e pouco verosímeis poderá entusiasmar-se com o filme, mas para os restantes este habilita-se a ser uma experiência cinematográfica enfadonha e repetitiva, que apenas convence em escassos momentos de energia visual ou devido à interessante banda-sonora dos Massive Attack (ainda assim, longe do seu melhor).
Por isso, entre "Danny The Dog - Força Destruidora" ou qualquer outra película carregada de pirotecnia e acção vertiginosa não há grandes diferenças, tornando este projecto de Louis Leterrier em mais uma obra inócua e indistinta.

E O VEREDICTO É: 1,5/5 - DISPENSÁVEL

sexta-feira, junho 10, 2005

HANGING AROUND

Bom concerto, o dos The Gift hoje (ou melhor ontem, porque já passa da meia noite) na Aula Magna. Só foi pena ter saído disparado do cinema para não chegar atrasado ao concerto, "jantar" à pressa (benditas máquinas de comida do metro lol) e deparar-me com o calor infernal do auditório.
Pior do que isso foi mesmo ter um mau sentido de oportunidade e sentar-me mesmo atrás de uma agitada fã que, além de ter estado de pé durante quase todo o espectáculo, era algo espaçosa (leia-se fortezinha...pronto, gorda) e não parava quieta, por isso ver o palco tornou-se, por vezes, muito complicado.
Também dispensava o exagerado acompanhamento de palminhas que se ouviu ao longo da maior parte das canções, e não apenas no final destas. Mas sim, foi um bom concerto, valeu a pena, e é isso que interessa (comentário mais alargado em breve).

quinta-feira, junho 09, 2005

CAÇA AO TESOURO

Com o considerável sucesso de "O Tesouro", de Jon Turteltaub, e a promessa de um novo episódio da saga de Indiana Jones para breve, o cinema de aventuras parece estar a regressar quando já ameaçava cair no esquecimento geral.

"Sahara", de Breck Eisner, é um exemplo recente dessa tendência, desenrolando-se nos quentes e inóspitos desertos africanos e propondo uma sessão marcada por puro entretenimento despretensioso.

A premissa centra-se na busca empreendida por dois caçadores de tesouros, Dirk Pitt e Al Giordino (interpretados por Matthew McConaughey e Steve Zahn, respectivamente), que pretendem encontrar um antigo navio naufragado no Mali período da Guerra Civil Americana.
Em simultâneo, a médica Eva Rojas (Penélope Cruz), da Organização Mundial de Saúde, tenta descobrir a origem de uma trágica epidemia que afecta a população do mesmo local. Os caminhos dos três protagonistas acabam por se entrecruzar e conduzir a uma série de peripécias marcadas pelo risco e mistério.

Partindo de uma premissa pouco criativa, "Sahara" apresenta uma execução não muito ambiciosa e raramente surpreende, mas contém um ritmo conseguido e oferece algumas eficazes descargas de adrenalina e vibração.
Breck Eisner não expõe traços de inspiração acima da média enquanto realizador, mas também não deixa o filme cair na monotonia, propondo uma aventura que, não sendo antológica, é suficientemente agradável de seguir.

Os desempenhos dos actores são aceitáveis, e a dupla McConaughey/ Zahn suscita alguns bons gags, já Penélope Cruz irradia pouco carisma numa prestação sem chama, embora isso não prejudique muito o filme uma vez que este não se centra nas personagens mas antes na acção e suspense. De resto, William H. Macy, num dos papéis secundários, consegue, apesar de tudo, ajudar a dar alguma credibilidade ao elenco.

Não procurando ser mais do que um blockbuster escapista com propósitos lúdicos (ainda que haja uma mensagem ecológica ou um olhar sobre certas culturas africanas), "Sahara" cumpre os seus objectivos de filme-pipoca, sendo descartável mas nem por isso negligenciável.
Claro que quem esperar personagens com substância sairá defraudado com a unidimensionalidade das caracterizações - sobretudo as dos vilões, figuras demasiado planas -, mas os arquétipos os protagonistas resultam e tornam este projecto de Breck Eisner num curioso "pastiche" de um cinema de outros tempos, sendo a trilogia "Indiana Jones" a referência mais óbvia.
Quem estiver disposto a um desbragamento sem grande profundidade poderá, assim, divertir-se durante duas horas de boa disposição e de escassas aspirações intelectuais.

E O VEREDICTO É: 2,5/5 - RAZOÁVEL

quarta-feira, junho 08, 2005

CYBERBOOKCROSSING

Decididamente, estes questionários culturais pegajosos (no bom sentido) estão mesmo na ordem do dia...Como já respondi a um de música e a outro de cinema, chega agora a vez de falar de livros, com base numa série de perguntas que tirei daqui:

1) Total de livros que eu possuo?

Não faço ideia, mas ainda são alguns (ou muitos). Se considerar os de banda desenhada e as colecções juvenis (tipo "Uma Aventura" e afins) que tenho na arrecadação, então, é mesmo difícil indicar um número...

2) Último livro que eu comprei?

Acho que foi o "Geração X", de Douglas Coupland (que recomendo).

3) Último livro que eu li?

"A Vida Deste Rapaz", de Tobias Wolff (uma semi-desilusão). E ando há meses com "A Pianista" em stand by :S

4) Cinco livros que significam muito para mim:

"1984", de George Orwell: Ficção ou realidade? As fronteiras nem sempre são óbvias

"Por Quem os Sinos Dobram", de Ernest Hemingway: Um grande livro de guerra

"Alta Fidelidade", de Nick Hornby: Engenhosa e hilariante perspectiva sobre o fascínio da cultura pop

"Enquanto a Inglaterra Dorme", de David Leavitt: Para ver o que acontece quando não estamos disponíveis para amar...

"O Jornalista Desportivo", de Richard Ford: Torna-se genial partindo do banal

E também "O Jardim de Cimento", de Ian McEwan, ou "Catch 22 - O Artigo 22", de Joseph Heller, entre outros tantos...

5) Sugira cinco pessoas para preencher este formulário:

Dinis

Dré

gravepisser

Lifechaser

Teco Apple

...E a todos os que queiram responder. Boas leituras ;)


terça-feira, junho 07, 2005

CRÓNICA FEMININA

Se "Beleza Americana", de Sam Mendes; "As Virgens Suicidas", de Sofia Coppola; "Alguém tem que Ceder", de Nancy Meyers e a série televisiva "Donas de Casa Desesperadas" fossem fundidos num só filme, o resultado não deveria andar longe de "O Lado Bom da Fúria" (The Upside of Anger), a mais recente obra de Mike Binder, que para além de realizador ocupa aqui o cargo de argumentista e actor secundário (interpretando o esgrouviado Shep).

Centrado na relação de de uma dupla de protagonistas em crise de meia idade - Joan Allen e Kevin Costner -, o filme combina drama e comédia de forma certeira, nunca se tornando tão depressivo como alguns filmes indie nem caindo nas armadilhas açucaradas de uma formatada comédia romântica.

Os trunfos de "O Lado Bom da Fúria" são o apelativo argumento e, sobretudo, a óptima direcção de actores, que para além do respeitável duo principal conta ainda com quatro jovens e promissoras actrizes que encarnam as filhas da personagem de Joan Allen: Erika Christensen, Keri Russell, Alicia Witt e Evan Rachel Wood (esta última particularmente magnética, dando continuidade às soberbas prestações apresentadas na série "Começar de Novo", de Edward Zick, ou "Treze - Inocência Perdida", de Catherine Hardwicke).

Mike Binder foca a angústia e descontrolo de Terry Wolfmeyer, uma mulher subitamente abandonada pelo marido, cuja amargura a torna cada vez mais neurótica e distante dos que a rodeiam, mantendo uma fricção constante com as suas filhas. Esta espiral descendente será amparada por Denny, radialista e ex-jogador de basebol, velho conhecido da família que se torna cada vez mais próximo e cúmplice dos dilemas de Terry, num relacionamento tenso e contraditório.

Joan Allen e Kevin Costner contribuem muito para a consistência das personagens centrais, oferecendo sólidos desempenhos e gerando uma química irresistível. Allen é especialmente marcante, proporcionando, de resto, uma das interpretações do ano e comprovando que é uma magnífica actriz.

O olhar sobre as realidades suburbanas norte-americanas é cada vez mais recorrente no cinema (e televisão) actual, mas "O Lado Bom da Fúria" ainda consegue ser refrescante dentro desses domínios, pois Mike Binder revela aqui bom gosto na escolha do elenco, banda-sonora e (brilhante) fotografia, assim como na estruturação da narrativa. O suficiente, por isso, para que esta seja uma das boas surpresas do ano.

E O VEREDICTO É: 3,5/5 - BOM

ESTES FRANCESES SÃO LOUCOS...

Cineasta francês com experiência na área das curtas e médias-metragens, Alain Guiraudie estreia-se nas longas com "Os Bravos Não Têm Descanso" (Pas de Repos Pour les Braves).

Se o título é incomum, o respectivo filme não o é menos, fugindo a qualquer tipo de catalogação ou delimitação de géneros, antes mesclando diversas referências e universos aparentemente contraditórios e distantes.

A película centra-se nas peripécias de Basile Matin, um jovem de uma localidade rural francesa que crê que irá morrer se adormecer, premissa que dará origem a uma série de sequências onde as fronteiras entre o real e o imaginário se diluem, assim como as dos estados de vigília e de sono.

Como companheiros de aventuras o protagonista conta com Igor, um adolescente contaminado pela inércia, e Johnny Got, um enigmático investigador com quem Basile estabelece uma peculiar relação de amor/ódio. No entanto, as caracterizações das personagens tendem a variar, uma vez que Alain Guiraudie deixa bem claro que, no seu filme, nada é definitivo e tudo pode ser alterado a qualquer momento.

"Os Bravos Não Têm Descanso" une humor slapstick a atmosferas oníricas, suspense próximo de um thriller a um delírio absurdo e surrealismo com uma discreta tensão sexual (tendencialmente homoerótica).
O argumento evita domínios lineares e aposta numa imprevisibilidade recorrente, onde o espectador fica sem ideia do que se seguirá, o que poderia ser interessante se a narrativa não fosse tão desarticulada e o filme não tivesse personagens tão indefinidas e descartáveis.

Guiraudie aborda temas como a adolescência, a família, o isolamento e a morte, mas raramente consegue tratá-las com a tensão dramática necessária, enveredando antes por uma bizarria que, se até aparenta ser intrigante nos momentos iniciais, logo entra num jogo de ilusões que apenas suscita a descoordenação do espectador.
Por vezes, a interligação entre o mundo da infância e o adulto em que o filme assenta tornam-no próximo de "A Cara que Mereces", do português Miguel Gomes, embora "Os Bravos Não Têm Descanso" seja, ainda assim, um pouco menos auto-indulgente e pretensioso.

Ideias não faltam a Alain Guiraudie, o problema é que nem todas são boas e as que o são encontram-se perdidas numa confusa e inconsequente teia de acontecimentos e reviravoltas. É pena, porque por vezes há aqui bons momentos, e o cineasta apresenta um interessante trabalho de realização, fotografia e banda-sonora, sendo capaz de criar ambientes envolventes. No entanto, sem um argumento à altura não há salvação para o filme, gerando mais uma oportunidade desperdiçada...

E O VEREDICTO É: 1,5/5 - DISPENSÁVEL

BLINKS & LINKS

Obrigado aos responsáveis pelos blogs Magacine (dos meus ex-colegas de faculdade João Tomé e Rui Pedro Vieira) e Pasmos Filtrados por me blinkarem ;)

segunda-feira, junho 06, 2005

O QUE FOI NÃO VOLTA A SER

The Smashing Pumpkins (1988-2000)

O FUTURO COMEÇOU AQUI...

Ansiosamente aguardado há meses por uma considerável legião de fãs, o concerto de Billy Corgan na Aula Magna, no passado dia 1, teve a particularidade de ser o inaugural de uma digressão onde o ex-elemento dos Smashing Pumpkins e dos Zwan apresentará ao vivo o seu primeiro disco a solo, "TheFutureEmbrace".

Autêntico espectáculo de culto, foi um apropriado momento para conhecer as canções do disco do músico e os seus novos rumos mas, ao contrário do que alguns esperavam, não houve espaço para nostalgias, ou seja, Corgan não revisitou temas dos seus projectos anteriores.
De resto, também não foi necessário, uma vez que a apresentação das suas composições a solo não poderia ter tido uma recepção mais calorosa, já que os espectadores presentes comprovaram que o público português quando gosta, gosta mesmo, e não hesita em demonstrá-lo.

Acompanhado por mais três elementos - Brian Liesegang, Matt Walker e Linda Strawberry - e contando com um intrigante trabalho a nível visual, com instrumentos de design sofisticado e um esplêndido painel onde foram projectadas imagens psicadélicas, Billy Corgan foi recebido com inúmeros aplausos e gritos desde o momento em que as luzes se apagaram para dar início ao concerto, num auditório repleto de fãs devotos.

Raramente exibindo traços da efervescência rock dos Smashing Pumpkins ou dos contornos poppy dos Zwan, as novas canções do cantor/compositor enveredaram antes por uma amálgama de domínios industriais, electro e góticos, com uma sonoridade retro-futurista que não escondeu influências dos New Order ou dos The Cure, embora devidamente ancoradas no presente.

Alternando temas vibrantes com outros mais apaziguados, o concerto exibiu um cardápio sonoro interessante, mas um pouco irregular, pois algumas canções (poucas, felizmente) não estiveram à altura daquelas a que Corgan nos habituou ao longo dos anos.
A espaços, a peculiar voz do cantor foi mesmo colocada em segundo plano, uma vez que era quase imperceptível no meio da densa teia de sons. Contudo, momentos como "Strayz" - que o cantor interpretou a solo - permitiram privilegiar a sua singularidade vocal.

O primeiro single "Walking Shade", a muito conseguida "A100" ou outras canções como "M.O.H.", "I'm Ready" e "Now and Then" foram amplamente aplaudidas por um auditório em delírio, e embora não estejam ao nível dos Smashing Pumpkins no seu melhor conseguem ser suficientemente entusiasmantes, gerando ainda mais expectativa em torno de "TheFutureEmbrece".

As versões de "To Love Somebody", dos Bee Gees (!), e de "It’s a Long Way to the Top", dos AC/DC (esta com um apetitoso travo a Nine Inch Nails), foram outros dos pontos altos da noite, a par do breve momento em que os músicos tocaram alguns acordes do muito amado "Today", um dos temas mais emblemáticos do saudoso "Siamese Dream".

Regressando ao palco para dois encores, Billy Corgan e os seus colaboradores foram alvo de mais uma fortíssima expressão de devoção, onde grande parte do público da Aula Magna os aplaudiu de pé. O ex-Smashing Pumpkin, sempre afável, despediu-se do público e cumprimentou muitos dos espectadores da primeira fila do auditório, presenteando assim mais uma prova de fidelidade dos fãs nacionais.

Para recordar fica um bom espectáculo, soberbo na concepção visual mas um pouco desigual na selecção musical, proporcionando três ou quatro canções demasiado mecânicas, frias e arrastadas. Ficará, mesmo assim, como um das boas memórias sonoras de 2005.

Antes da actuação de Billy Corgan coube aos norte-americanos Gliss aquecer o palco, tarefa desenvolvida com arrojo e competência. Praticando um rock alternativo próximo dos Black Rebel Motorcycle Club ou dos The Raveonettes, o trio assegurou uma eficaz apresentação de algumas das suas canções.
Os elementos do projecto trocaram de instrumentos - guitarra, bateria e baixo - ao longo da sua prestação, e mesmo sem serem especialmente surpreendentes foram sempre eficazes, com um vocalista a lembrar um curioso cruzamento vocal entre Chris Corner, dos Sneaker Pimps, e Tim Vanhamel, dos Millionaire. Um projecto promissor a ter em conta...

E O VEREDICTO É: 3,5/5 - BOM