domingo, dezembro 24, 2006

UM HOMEM NO CAMPO

Nos últimos anos, Ridley Scott tem apostado em filmes que o confirmam como um dos mais versáteis realizadores em actividade, constituindo uma obra que engloba títulos de vários géneros, mas essa diversidade não tem oferecido, infelizmente, propostas especialmente estimulantes. Do sobrevalorizado "Gladiador" ao desequilibrado "Hannibal", passando pelo inconsequente "Cercados" ou pelo malogrado "Reino dos Céus", não lhe têm faltado projectos com potencial, embora a execução dos mesmos não chegue a ascender a um nível acima da mediania.

"Um Ano Especial" (A Good Year) é mais uma prova do eclectismo de Scott e causa alguma surpresa devido à sua escassa ambição, combinando drama e comédia para contar uma história convencional sem grandes pretensões, não aspirando a mais do que um exercício essencialmente lúdico.

O motor da narrativa é a herança, por parte de um bem-sucedido homem de negócios inglês, de uma propriedade localizada em Provença, deixada pelo tio deste, recentemente falecido e com o qual manteve uma relação próxima durante a infância. A notícia leva-o a deixar por alguns dias a Bolsa de Londres e a viajar até à localidade francesa onde, à medida que a sua estadia vai tendo uma duração mais longa do que a esperada, a sua decisão inical, vender a propriedade, vai sendo reavaliada, em parte devido às acolhedoras memórias do local que vão despontando, mas também por um interesse amoroso que surge inesperadamente.

Uma premissa pouco ousada e inovadora, portanto, que mais não faz do que reaproveitar o conflito entre a consumação do amor e a prosperidade profissional ou a dicotomia campo/cidade, realçando a pureza e serenidade do primeiro e o misto de hipocrisia e competitividade que infecta a segunda.
Esta associação, simplista e redutora, quando associada à tentativa do protagonista se tornar "numa pessoa melhor" redefinindo as suas prioridades, parece sugerir que "Um Ano Especial" se resume a uma colecção de lugares-comuns (como o foi, por exemplo, o recente "Um Homem na Cidade", de Mike Binder).
Ora se é verdade que os clichés estão lá, reconheça-se que o filme não é assim tão meloso e forçado, enveredando por um bem-comportado tom agridoce que nunca faz desta uma experiência cinematográfica acima do aceitável mas também não a torna num objecto a recusar por completo.

Visualmente, Scott volta a suportar-se numa linguagem próxima da publicitária (meio de onde provém), com as suas qualidades (a caracterização dos sofisticados ambientes londrinos, com uma envolvente combinação de azuis e cinzentos) e excessos (o olhar sobre Provença raramente vai além do postal ilustrado, abusando do exibicionismo e de uma carga bucólica pouco genuína, a lembrar alguns anúnicos de vinho, azeite e afins).
A mistura de comédia e drama também tem altos e baixos, dado o humor demasiado brando e a ténue densidade emocional; e Russel Crowe, no papel protagonista, não se sai especialmente bem na conciliação dos dois registos. As melhores interpretações do filme pertencem, aliás, a quem tem menos tempo de antena, casos do veterano Albert Finney e do jovem Freddie Highmore (a promessa de "À Procura da Terra do Nunca" e "Charlie e a Fábrica de Chocolate"), respectivamente tio e sobrinho nos ocasionais flashbacks. Destaque ainda para uma Abbie Cornish em busca de internacionalização depois de "Salto Mortal" e "Candy", insinuante mas com menos carisma do que nesses dois filmes.

Ainda não é com "Um Ano Especial" que Ridley Scott volta a assinar um filme obrigatório, mas admita-se que, embora seja uma obra menor e não mude a vida de ninguém (tirando, claro, a do protagonista), cumpre minimamente aquilo que se propõe, oferecendo duas horas agradáveis e despretensiosas. Não é muito, mas não podia pedir-se muito mais a um feelgood movie.
E O VEREDICTO É: 2,5/5 - RAZOÁVEL

4 comentários:

kimikkal disse...

Bastava ter o russel Crowe para ter motivos para evitar o filme. mesmo que me digam que o filme é bom (o que não é o caso).

é um pouco o que se passa com os Oasis, nesta altura do campeonato poderiam fazer o Álbum do Ano que continuaria a evitar ouvi-los...

gonn1000 disse...

Também não acho o Crowe grande actor, embora goste de alguns dos seus desempenhos. Neste está competente, mas não mais.
Dos Oasis ouço algumas canções muito esporadicamente, e basta.

Anónimo disse...

Crowe não é, de todo, o problema do filme. Nem deste nem de nenhum outro em que participe. Não sendo genial, é contudo um bom actor, acho.
Concordo com a tua opinião acerca do filme. Escrevi sobre ele aqui.
Cumprimentos.

gonn1000 disse...

Não é só por ele, e nem acho que seja mau actor, apenas não me parece que aqui se tenha esforçado muito. Parece-me que gostaste ligeiramente mais do que eu, mas sim, enquanto mero entretenimento é um filme que cumpre.
Cumprimentos e bons filmes.