Vivendo num estado de constante fadiga e perturbação devido ao facto de não conseguir dormir há mais de um ano, Trevor Reznik sobrevive a um quotidiano marcado pela solidão e algumas alucinações. Um inesperado e quase trágico acidente de trabalho alimenta ainda mais a inquietação do jovem operário fabril, à medida que a culpa e a paranóia se tornam cada vez mais claustrofóbicas e sufocantes.
Em poucas palavras, esta é a ideia-base de "O Maquinista" (The Machinist), o mais recente filme de Brad Anderson centrado na espiral descendente de um homem cujos estados físico e psicológico se tornam cada vez mais frágeis e irregulares.
Christian american psycho Bale dá corpo - literalmente - ao protagonista, e para participar no projecto teve de emagrecer 38 quilos de forma a se adequar ao anoréctico estado físico que a personagem exigia. "O Maquinista" começa por impressionar logo pela debilidade corporal do actor, que aqui se entrega totalmente a um papel difícil e arriscado. Bale consegue condensar uma postura algo lunática e alienada, tornando Trevor Reznik numa figura inquietante que tanto se desdobra em episódios de cruel humor negro como em cenas mais soturnas e perturbantes.
Reznik é o fio condutor deste thriller obscuro, carregado de atmosferas negras, densas e decrépitas, mas estranhamente fascinantes (e aqui, saliente-se o trabalho de Brad Anderson na concepção de convincentes ambientes industriais vincados pelo negrume). Através dele, o filme propõe uma viagem a domínios onde o real e o ilusório se interligam e confundem, gerando uma narrativa com mistérios suficientes para manter o interesse.
Individualista e solitário, Reznik possui uma vida social quase nula e é tratado com suspeita e desconfiança por quase todos os que o rodeiam, devido ao seu arrepiante estado físico e à postura circunspecta e nebulosa que o caracteriza.
Apesar de ser minimamente intrigante, "O Maquinista" perde parte do carisma por se assemelhar a outras obras que já trabalharam anteriormente, e de forma mais criativa, as suas temáticas.
A relação de Reznik com a personagem misteriosa que se depara diversas vezes no seu caminho é alvo de comparações inevitáveis com a dupla Edward Norton/Brad Pitt, de "Clube De Combate" (Fight Club), o marcante filme de David Fincher, e os tons de paranóia que se adensam progressivamente não estão muito distantes das reviravoltas constantes de "O Jogo" (The Game), do mesmo realizador.
Brad Anderson recolhe também traços do cinema de Christopher Nolan, uma vez que "O Maquinista" tem tanto de "Memento" - pela lógica de thriller não linear sobre os efeitos da memória fragmentada - como de "Insónia" (Insomnia) - o permanente cansaço de Bale é motivado pelas insónias, como acontece com Al Pacino nesse filme. Pelo meio, Anderson percorre territórios próximos de David Lynch ("Estrada Perdida", sobretudo) ou David Cronenberg (pela perspectiva algo clínica e árduo teste dos limites humanos).
Embora recolha as melhores influências, "O Maquinista" nem sempre está à altura das mesmas, e o resultado final é mais desequilibrado do que o que a interessante premissa sugeria. O problema é que Anderson nem sempre consegue gerar um ritmo absorvente e entusiasmante e alguns dos mistérios do filme são demasiado óbvios. A película mantém, ainda assim, tons intrigantes e inóspitos, embora abuse do mau gosto a espaços (como na cena do parque diversões, com a criança).
Ainda que esteja marcado por uma apelativa aura de "filme-de-culto", "O Maquinista" cativa mais pelo estilo do que pela substância, dado que o argumento aposta em caminhos já percorridos. Não deixa de ser uma experiência cinematográfica interessante, mas fica aquém do seu potencial.
E O VEREDICTO É: 2,5/5 - RAZOÁVEL
1 comentário:
Total desacordo, acho que é um filme brilhante, com um desempenho extraordinário.
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