Ao ver o filme, percebe-se o motivo pelo qual a realizadora é pouco consensual na Índia, uma vez que "Água" contém uma forte denúncia das condições a que as viúvas são expostas, sendo obrigadas a uma vida de recolhimento em lares.
Nesses locais que as segregam, são impedidas de disfrutar do contacto com qualquer tipo de prazer, usando sempre o mesmo traje e mantendo uma postura lacónica e discreta. Ainda que estejam proibidas de voltar a casar, muitas acabam por ter de se dedicar à prostituição, uma das poucas formas de conseguir sustentar os asilos.
Mehta, contudo, não torna o seu filme num mero grito de revolta tendencioso e manipulador, destinado a despertar e chocar consciências, pois embora esteja presente uma tentativa de revelar situações precárias e pouco expostas da sua terra natal, este retrato surge inserido numa narrativa que permite ao espectador formular os seus próprios juízos e conclusões.
A acção decorre na Índia de finais dos anos 30 e segue o percurso de Chuyia, uma menina de oito anos que, apesar de não ter conhecido o marido, é viúva, e por isso levada para uma casa habitada por outras, que passa a ser também a sua.
Aí é educada a seguir um estilo de vida oposto ao que conheceu até então, cujas diferenças começam quando o seu cabelo é rapado e continuam através de contínuas restrições que não dominavam o seu quotidiano.
A cumplicidade com Kalyani, a mais bela das suas colegas de casa, ajuda-a a superar os primeiros dias, mas a situação torna-se mais conturbada para ambas quando esta decide deixar a prostituição para casar com um jovem advogado, ambição naturalmente dificultada pelas restantes viúvas.
Drama de considerável sensibilidade e envolvência, "Água" é uma sóbria experiência cinematográfica, equilibrada em todos os aspectos, com destaque para o impressionante trabalho de fotografia de Giles Nuttgens (capaz de cenas de rara energia visual, como as da festa da cor) e para a direcção de actores, de onde sobressai Sarala, carismática e comovente no papel da pequena Chuyia.
Inicialmente algo leve e espirituosa, a película torna-se triste e amargurada à medida que a jovem protagonista é obrigada a crescer mais rapidamente do que deveria, sendo por isso os últimos minutos especialmente claustrofóbicos e marcados por algumas sequências arrepiantes.
O desenlace poderá ser de gosto duvidoso para alguns, o filme talvez tenha uns vinte minutos a mais e Mehta é geralmente mais consistente do que genial, mas de qualquer forma "Água" é uma obra bastante meritória e cativante, que não merece passar despercebida entre os títulos estreados em 2006.
E O VEREDICTO É: 3,5/5 - BOM