segunda-feira, janeiro 14, 2008

OS MELHORES DE 2007: FILMES

Com algum atraso, aqui fica a lista dos filmes estreados por cá em 2007 de que mais gostei. Vi menos do que nos últimos três anos, e por isso perdi obras que talvez merecessem estar aqui, como as mais recentes de Neil Jordan ("A Estranha em Mim"), Billy Ray ("Quebra de Confiança"), Robert Rodriguez ("Planeta Terror") ou Julian Schnabel ("O Escafandro e a Borboleta").

Fica também a ressalva de que a lista não inclui o melhor que vi no cinema, já que só foi exibido no Festival Queer Lisboa e nem sei se chegará às salas - refirou-me a "The Bubble", de Eytan Fox, que foi mesmo o meu preferido (pelo menos até rever "Pecados Íntimos" e "Mysterious Skin - Pele Misteriosa"). Se me esqueci de algum, estão à vontade para me alertar.

1 - "Pecados Íntimos" - pais & filhos
Não têm faltado filmes sobre o quotidiano dos subúrbios, mas isso é mais um motivo para tornar "Pecados Íntimos" numa obra tão peculiar, já que se destaca da maioria. Todd Field, na sua segunda - e melhor - longa-metragem, desenha aqui um brutal e realista retrato das relações humanas, comprovando que os adultos adoptam, por vezes, atitudes tão irreflectidas como as crianças. Abordando questões complexas como a infidelidade ou a pedofilia sem um grama de moralismo, o filme confirma - e de que maneira! - um dos novos realizadores norte-americanos a não perder de vista.

2 - "Mysterious Skin - Pele Misteriosa" - perseguidos pelo passado
Estreou com atraso, mas ainda veio a tempo de se tornar numa das experiências cinematográficas mais absorventes de 2007. Pungente prova de talento de Gregg Araki, um cineasta pouco divulgado por cá, é um dos mais sombrios e inquietantes retratos da juventude dos últimos tempos, debruçando-se sobre a solidão ou a homossexualidade com uma maturidade rara. Não menos relevante é o facto de possibilitar mais uma excelente interpretação ao jovem Joseph Gordon-Levitt, que voltou a convencer depois do também recomendável "Brick".

3 - "As Canções de Amor" - 3 amantes em Paris
"Minha Mãe" e "Em Paris" já tinham sugerido que Christophe Honoré é um dos mais entusiasmantes novos realizadores franceses, impressão que "As Canções de Amor" veio confirmar, ou não fosse o seu melhor filme a estrear em salas nacionais. Soberbo musical, nos antípodas dos que ainda vão chegando de Hollywood, contém também a melhor banda-sonora do ano, com canções interpretadas pelos próprios actores - que estão tão bem a cantar como a representar.

4 - "Half Nelson — Encurralados" - a escola da vida
Uma das mais consistentes surpresas indie do ano, "Half Nelson - Encurralados" é uma montra para um portentoso one man show de Ryan Gosling, actor que tem tudo para se tornar num dos maiores da sua geração. Mas não vale só por isso, já que esta primeira obra de Ryan Fleck tem as doses certas de melancolia e sobriedade, apresentando uma história pouco convencional sobre a amizade entre um professor à beira da depressão e uma aluna que se torna na sua âncora emocional.

5 - "As Vidas dos Outros" - pecados íntimos
O novo cinema alemão tem gerado algumas pérolas nos últimos anos, e "As Vidas dos Outros" é uma das mais fortes a adicionar à lista. Abordando território pantanoso, uma vez que a acção decorre pouco tempo antes da queda do muro de Berlim, Florian Henckel von Donnersmarck evita, contudo, qualquer postura panfletária, já que as suas personagens são figuras tridimensionais e não meras cabeças falantes, conjugando-se com a realização e as óptimas interpretações - em particular a de Ulrich Mühe, que viria a falecer poucos meses depois da estreia. Um justo vencedor do Óscar para Melhor Filme em Língua Não-Inglesa.

6 - "Homem-Aranha 3" - o desafio final (por enquanto...)
E à terceira, Sam Raimi desiludiu muitos... mas não se percebe muito bem porquê, pois se "Homem-Aranha 3" está um pouco abaixo dos antecessores, não tem a culpa que estes tenham exibido um nível qualitativo raríssimo em blockbusters. Mesmo sem o efeito novidade - tirando a exploração do lado negro de Pater Parker, que poderia ter sido mais aprofundada -, este é ainda o mais cativante filme-pipoca de 2007, que nunca deixa de respeitar as suas personagens e encerra bem a melhor trilogia de sempre um super-herói no grande ecrã.

7 - "The Fountain — O Último Capítulo" - até que a morte os separe
A mais recente obra de Darren Aronofsky teve a árdua tarefa de suceder a um dos filmes essenciais dos anos 00, "A Vida não é um Sonho", e se não está no mesmo patamar pelo menos demonstra que o seu autor é um dos mais estimulantes em actividade. História de amor larger than life, vincada por um romantismo atípico, esta experiência sensorial oferece algumas das mais belas sequências do ano com interpretações à altura por parte do par protagonista - os dedicadíssimos Hugh Jackman e Rachel Weisz - e uma bela banda-sonora - mais uma - de Clint Mansell.

8 - "No Mundo das Mulheres" - o vizinho acidental
Tinha tudo para ser mais uma comediazinha romântica de sábado à tarde - romance adolescente, Meg Ryan, um actor da série "The O.C. - Na Terra dos Ricos" -, mas esta estreia de Jake Kasdan na realização vai surpreendendo aos poucos, à medida que desconstrói lugares-comuns e apresenta uma das mais refrescantes e despretensiosas misturas de drama e comédia do ano. Se as aparências por vezes iludem, este é seguramente um desses casos - e no bom sentido.

9 - "À Prova de Morte" - mulheres danadas
Devaneio inspirado e imprevisível, o mais recente filme de Quentin Tarantino aumenta a carga pastiche mas nunca deixa de denunciar o universo peculiar do seu realizador, e para não fugir à regra é mais um concentrado de diálogos e sequências de antologia. Houve quem não gostasse da brincadeira, e não será dos títulos máximos do cineasta, mas é difícil resistir-lhe quando, no meio do aparente caos e arbitrariedade, tudo está tão bem estruturado. Um objecto lúdico a revisitar e reavaliar.

10 - "Shortbus" - o sexo e a cidade
Depois do desequilibrado "Hedwig - A Origem do Amor", John Cameron Mitchell regressa com uma obra mais consistente e novamente alicerçada numa bizarra (ou nem tanto) galeria de outcasts. Tragicómica visão das relações humanas, onde o sexo surge como elemento-chave, "Shortbus" poderá cair em algumas armadilhas de "filmes-choque" mas é suficientemente genuíno e corajoso para as ultrapassar, e deixa curiosidade em relação aos próximos passos de um realizador promissor.

Os 10 seguintes:

"A Rapariga Morta", de Karen Moncrieff
"Eles", de David Moreau e Xavier Palud
"Geração Fast Food", de Richard Linklater
"Alpha Dog", de Nick Cassavetes
"Promessas Perigosas", de David Cronenberg
"Eu Sou a Lenda", de Francis Lawrence
"Os Simpsons - O Filme", de David Silverman
"Zodiac", de David Fincher
"Assalto e Intromissão", de Antony Minghella
"Sunshine — Missão Solar", de Danny Boyle

Melhor filme português: "A Outra Margem", de Luís Filipe Rocha

Melhor actor: Ryan Gosling ("Half Nelson — Encurralados")

Melhor actriz: Kate Winslet ("Pecados Íntimos")

Melhor(es) realizador(es): Darren Aronofsky e Gregg Araki

27 comentários:

joão moço dos recados disse...

o Zodiac e, principalmente, O Eastern Promises mereciam melhores lugares. Ah, e faltam o Control e Superbad a essa lista, enquanto que o Planet Terror continua a ser melhor que o Death Proof, apesar de toda a gente dizer o contrário. :p

gonn1000 disse...

Para mim "Control" vale sobretudo pela fotografia e pela interpretação do Sam Riley, acho que é competente mas foi uma semi-desilusão. "Superbad" é outro alvo de hype a mais, tem os seus momentos embora no geral seja apenas mediano - na minha opinião, claro.
Tenho pena de não ter visto o "Planet Terror".

joão moço dos recados disse...

Parece-me quase impossível não ver o Superbad e não pensar que é uma das grandes comédias dos nossos tempos. Já o vi mais que uma vez e continuo achar um dos melhores filmes que vi em 2007.

gonn1000 disse...

Porquê? Está assim tão acima de "American Pie"? É que não me parece, pelo contrário. O que é que traz de novo aos filmes do género? Das personagens, só o McLovin é que fica na memória e mesmo assim não compensa a fraca dupla de polícias. O filme entretém q.b., como o fazem tantos outros, mas não revoluciona coisa alguma como se tem dito. É verdade que 2007 foi fraco em comédias e que esta talvez ganhe na comparação, mas ainda assim...

Catarina disse...

Dos filmes desta lista não tive oportunidade e ver o segundo nem o terceiro e não gostei de Half Nelson.
Fiquei surpreendida por ver Homem Aranha na lista, pois pela leitura que tenho feito do blog pensava que apreciavas mais os catalogados como filmes independentes.
Finalmente, para dizer que também me surpreendeu bastante o filme In The land of Women que contudo mereceu destaque mas já não apareceu no meu top.

http://significados.livejournal.com

gonn1000 disse...

Gosto de muitos filmes independentes, é verdade, mas não só desses, acho que há alguns mais mainstream que também merecem destaque. "In the Land of Women", por exemplo, está entre uma coisa e outra :)

P.R disse...

Caro Gonçalo,

Tens aí uma lista deveras interessante :)
Alguns confesso que não vi, mas todos os outros (à excepção talvez do aranhiço) são belas sugestões.
3 dos filmes apontados estão tb no meu top 10.

Nós no take a break tb ja começamos com os balancos :)! Dá uma olhadela e contribui para o debate ;)

gonn1000 disse...

Obrigado. Pois, parece que fui dos poucos a gostar do aranhiço, mas mantenho a opinião.

Já espreitei as vossas escolhas, fico à espera das restantes :)

Cataclismo Cerebral disse...

O Little Children é uma daquelas obras que marca mesmo e a Kate Winslet está realmente fenomenal. Permite que destaque também a Ashley Judd e o Michael Shannon no Bug, que estão geniais.

Abraço

gonn1000 disse...

"Bug" foi um dos que não vi, mas já reparei que não são poucos os que o elegem como um dos favoritos. Em relação a "Little Children" subscrevo, claro.

Fica bem :)

Wellvis disse...

SuperBad «não trouxe nada de novo ao género?» Espera, como assim? Quero dizer, nem discordo de ti Gonçalo, pelo contrário mas a originalidade de que falas, o "algo de novo" que tu reclamas em SuperBad, são exactamente as que faltam em vários dos filmes que se encontra nesta tua lista (e tu mesmo aponta-as: ver textos de «Pecados Íntimos» «The Fountain» e principalmente «Homem-Aranha 3» ) O que estou a querer dizer aqui com isto, sem expressar minha opinião pessoal sobre o filme (que tu sabes qual é) é que esse argumento pelo qual não gostaste do filme e pelo qual, parece-me, é o que move tuas escolhas pessoais, é completamente contraditório. O que é que «American Pie» trouxe ao "género"? Pessoalmente, acho AP horroroso e que nem deve se comparar a SuperBad, mas AP nunca trouxe nada a ninguém, a não ser dinehiro ao bolso dos envolvidos.O SuperBad, por sua vez, é uma comédia à moda anos 80, que me faz lembrar inclusive os filmes do John Hughes onde os adolescentes não são caricaturais, estereotipados, sexistas e acéfalos. Muito pelo contrário. Os diálogos são um achado e personagens de uma naturalidade e originalidade (taí, não acho que «originalidade» seja sinónimo de «revolucionário») há muito tempo perdidas no cinema teen americano. Qto ao hype, ja te disse isso anteriormente, nunca li uma linha entusiasmada sequer do filme qdo estreou em salas lisboetas...se calhar me perdi poraí.. o máximo que vi, foi um burburinho no Brasil, na blogosfera, onde ele ja foi despachado para a categoria dos novos filmes de culto. E merecedissimo,na minha opinião.

Abraço Forte.

gonn1000 disse...

Não acho que um filme tenha de ser muito original para ser bom, mas li por aí quem defenda "Superbad" como a salvação da comédia e um prodígio de inspiração... e não concordo. Acho-o eficaz, com algumas boas ideias e diálogos, mas desequilibrado, como expliquei no texto sobre o filme, aqui. Também não acho que "American Pie" tenha trazido muito, por isso não me parece uma heresia compará-los, considero ambos entretenimentos razoáveis mas pouco mais.
E sim, acho que os adolescentes em "Superbad" - e o argumento, já agora - são caricaturais, estereotipados e sexistas q.b., e basta ver a função entregue às personagens femininas. Há momentos que redimem esses aspectos, como as cenas finais, por exemplo, alvo de uma abordagem mais perspicaz e madura, mas não chegam.
E acho os outros três filmes de 2007 que enumeraste mais criativos do que este - "Pecados Íntimos" pode repisar temáticas frequentes do cinema indie mas a abordagem é singular, não se limita a oferecer mais do mesmo, e "The Fountain" então é daqueles filmes inclassificáveis e que dificilmente exibem paralelismos com quaisquer outros, ainda que o tenha achado menos consistente do que o de Todd Field (mas é mais arrojado, característica que não encontro muito em "Superbad"). Admito que "Spider Man 3" seja mais frágil do que os outros dois no que diz respeito a inovação, mas prefiro o retrato que faz dos jovens do que o de "Superbad", e as personagens são bem mais interessantes. Parece-me um belo filme para um público dos 7 aos 7 - mesmo sendo o pior da trilogia -, o que não é assim tão fácil de encontrar.
Quando referi o hype em torno de "Superbad" não falava da imprensa portuguesa, mas da internacional e de alguma blogosfera. E "filme de culto" posso considerar, por exemplo, um "Donnie Darko" ou um "Ghost World", e acho que "Superbad" está muito longe destes.

Abraço e continua a "reclamar" sempre que quiseres :)

Dark Electronic disse...

Não acredito que puseste Spiderman 3 acima do The Fountain =|

Já nao gosto de ti :(

gonn1000 disse...

Ah, mas nesse caso a ordem é um bocado arbitrária, se fosse ao contrário também não estaria mal. E alguém tem que gostar do Spidey, não? :)

Anónimo disse...

"um público dos 7 aos 7"? :P

gonn1000 disse...

LOL
Dá-me um desconto, foi às duas da manhã num dia de semana, a essa foi uma sorte só ter dado essa calinada.

C. disse...

"Shortbus" e "Spiderman 3"... er...

O primeiro não gostei mesmo nada, o segundo foi uma desilusão tendo em conta os outros 2 da (até agora) trilogia. Mas pronto, como tanto se diz, gostos são gostos ;)

gonn1000 disse...

Cá para mim ficaste foi chateada por não te terem oferecido uma camisola e um boné do primeiro :P

DAD disse...

O que escrevi noutro site é válido para este.

Parabéns pelo site. Devo dizer que as suas escolhas denotam que está "preso" ao mundo infeliz e deprimente da crítica. Sobre algumas das escolhas: "Bug" estou para tentar ver este filme há séculos, mas não consegui ainda. Tenho grande respeito pelo realizador. O resto das escolhas sao polticicamente correctas, acho que pouco há a dizer sobre elas, são para lá do circuito comercial. E essa ideia que só se fazem bons filmes no cinema independente já é demasiado "retro" para uma pessoa inteligente.
A escolha mais óbvia é aquela que concordarei mais (o seu primeiro lugar);podemos chamar alternativo a Lync no máximo.

Entretanto, convido-o a aparecer no meu blog para a semana do cinema de 21 a 27 de Janeiro.

Abraço

gonn1000 disse...

Obrigado.
Porque é que estou ""preso" ao mundo infeliz e deprimente da crítica"? Nos meus dez preferidos há filmes que foram mal recebidos pela crítica em geral ("Homem-Aranha 3") e outros que geraram reacções muito díspares ("The Fountain", "Shortbus"), e não me lembro de "No Mundo das Mulheres" ter sido alvo de grandes aplausos ou sequer especial destaque por parte da imprensa.
"Bug" não poderia fazer parte das minhas escolhas porque, como referi uns posts acima, não o vi.
Nunca disse que só se fazem bons filmes no cinema independente, não sou fundamentalista e não ando a reboque dos "queridinhos" da crítica - não sou apreciador de muitos filmes de David Lynch, por exemplo, nem tenho problemas em dizê-lo.
Mas até fiquei com curiosidade em saber que grandes filmes do "cinema comercial" é que me passaram ao lado em 2007.

Cumprimentos (não consegui aceder ao seu blog através do profile)

Joana Amoêdo disse...

Pois eu estou-me a cagar para as etiquetas que colam aos filmes. Não tenho paciência para ler as críticas nos jornais mas gosto de vir ao teu blog. E sim, gostei muito do Little Children. Escreveste sobre o Control? Oh, eu gostei tanto...:-)

gonn1000 disse...

Obrigado :)
Não cheguei a escrever sobre "Control" nem gostei assim tanto. Tirando a fotografia e a interpretação de Sam Riley (e a banda-sonora, mas isso já se sabia) não encontrei mais nada que justificasse tanto burburinho. Gostava de ter gostado mais.

P.R disse...

Oi!

Já colocamos a lista de 2007! Passa por lá ;)

Abraço!

Joana Amoêdo disse...

Eu gostei, sabes porquê? Porque mostra o lado menos bonito do mundo da música, não endeusa o Ian Curtis e é um filme comedido e meio documental. Depois ajuda o facto de gostar muito da Samantha Morton e de ter gostado também da interpretação do Sam Riley (e não só, ehehe).

gonn1000 disse...

P.R.: I will :)

Debbie Harry: Concordo com isso, mas achei que lhe faltou um maior investimento nas personagens. Tudo bem, percebo que é um biopic, mas as personagens secundárias pareceram-me muito superficiais, e embora formalmente esteja tudo no sítio certo a nível emocional fiquei algo indiferente.

Navnit disse...

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Navnit disse...

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