sábado, março 31, 2007

7 BLOGUES, 6 ESTREIAS, 5 ESTRELAS

A tabela dos bloggers habituais relativa a algumas estreias de Março, em mais uma selecção "knoxvilleira".

sexta-feira, março 30, 2007

ATÉ QUE A MORTE OS SEPARE

Com apenas dois filmes, Darren Aronofsky tornou-se, para muitos, num dos novos realizadores norte-americanos mais entusiasmantes dos últimos anos, com uma linguagem própria e experimental mas quase sempre mais hipnótica do que hermética.
Na sua promissora primeira obra, "Pi" (1998), deu provas de talento, ainda que com alguns desequilíbrios, mas foi o trabalho seguinte, "A Vida não é um Sonho" (Requiem for a Dream, 2000), que o colocou decididamente como um nome a seguir com atenção, ou não fosse esse um dos melhores e mais alucinantes filmes desta década.

Percebe-se, por isso, que fosse muita a expectativa em redor de "O Último Capítulo" (The Fountain), terceiro opus do rapaz-prodígio que, se por um lado confirma a sua singularidade, também se arrisca a ser o que lhe garantirá mais detractores. A estreia mundial no Festival de Veneza foi disso sintomática, gerando mais rejeição do que adesão, e vendo o filme não se estranha que este seja um dos que despoleta reacções muito extremadas.

Ensaio sobre as interligações entre o amor e a morte, a película volta a juntar o realizador a propostas atípicas e arriscadas, centrando-se num romance de um casal que se dilui em três contextos espaciais e temporais diferentes: um na Espanha do século XVI, outro nos EUA dos dias de hoje e um terceiro num plano astral, durante uma época não identificada. Este último será talvez o que mais contribui para que o filme ganhe alguns ódios viscerais ou, pelo menos, olhares de soslaio, uma vez que é o que contém as sequências mais abstractas e de considerável carga simbólica, por vezes resvalando para uma duvidosa fusão de misticismo zen e new age difícil de digerir.

Será, no entanto, injusto ignorar os méritos do filme devido a ocasionais cenas algo pomposas e insufladas, em que Aronofsky se deslumbra com os seus virtuosismos e se arrisca a deixar de fora o espectador. Apesar da notável intensidade plástica que emana de "O Último Capítulo" nem sempre estar ao serviço da narrativa, gera momentos onde este passa de experiência cinematográfica a sensorial, sendo dominado por uma rara e desconcertante energia. A espessura cromática dos tons com variações de dourados potencia imagens de inegável beleza, onde o jovem realizador volta a confirmar-se como um excepcional e imaginativo esteta, criador de um universo fascinante.

Felizmente, o filme não vale só pela sua minúcia visual mas debruça-se numa história de amor épica e absorvente, onde a continuidade da relação de um casal surge ameaçava pelo medo, raiva e obsessão despoletados pela sugestão da morte. O duo protagonista revela uma entrega invulgar, partilhando uma química palpável e dando ao filme uma forte densidade emocional. Rachel Weisz demonstra que a excelente interpretação em "O Fiel Jardineiro" não foi um acaso e volta a compor uma personagem com a qual é difícil não sentir empatia, mas é Hugh Jackman quem mais surpreende, expondo um impressionante romantismo magoado a milhas dos seus mornos desempenhos recentes em "Scoop" ou "O Terceiro Passo".

Clint Mansell, habitual colaborador, volta a encarregar-se da banda-sonora mas afasta-se do drum n' bass de "Pi" e da união de violinos e electrónica de "A Vida não é um Sonho", enveredando antes por sonoridades mais serenas e etéreas onde o piano obtém grande parte do protagonismo. Os Mogwai e o Kronos Quartet também contribuem e o resultado convence, o que não é pouco tendo em conta a importância que a música adquire nos filmes de Aronofsky, sendo muito mais do que um mero adorno da imagem.

"O Último Capítulo" poderá ficar aquém do admirável marco que muitos esperariam (incluindo o realizador), mas tem méritos que compensam plenamente ocasionais escorregões de auto-indulgência e exibicionismo. Afinal, poucos filmes surgidos nos últimos tempos podem orgulhar-se de serem tão desafiantes e de contarem com uma carga poética tão vincada, assim como não serão muitos os novos realizadores que possam consagrar-se já como autores tão peculiares e interessantes como Aronofsky.

E O VEREDICTO É:
3,5/5 - BOM

quinta-feira, março 29, 2007

ESTREIA DA SEMANA: "SLITHER - OS INVASORES"

Chega hoje a salas nacionais aquele que é, provavelmente, o filme mais delirante desde o inclassificável "Snakes on a Plane". "Slither - Os Invasores" (Slither) é uma pequena surpresa que, entre o terror e a comédia, segue a "visita" de estranhas - e repelentes - criaturas extra-terrestres a uma até então pacata cidadezinha no interior dos EUA. Parece familiar? Claro que sim, mas apesar disso - e do realizador, James Gunn, ter sido o argumentista do filme "Scooby Doo" - esta primeira obra acerta mais do que falha. A descobrir, mas convém não ter estômago fraco.

Outras estreias:

"Honra de Cavalaria", de Albert Serra
"Mr. Bean em Férias", de Steve Bendelack
"Os Robinsons", de Stephen J. Anderson
"Premonição", de Mennan Yapo
"Sinal de Alerta", de Andrea Arnold



Trailer de "Slither - Os Invasores"

terça-feira, março 27, 2007

MITOS PREMATUROS

São já conhecidos os frequentes exageros com que a peculiar imprensa musical britânica destaca muitos dos novos artistas, atirando-os para um patamar de genialidade sem igual que só é superada daí a um par de meses (ou de semanas, conforme os casos), quando chega a hora de endeusar novas coqueluches e terminar os quinze minutos de fama das anteriores.

Se no ano passado os Artic Monkeys foram o expoente máximo dessa tendência, para 2007 uma das principais apostas são os Klaxons, jovem trio londrino que já gerou algum burburinho com a edição de singles e um EP em 2006 mas que agora, com o lançamento do primeiro álbum, "Myths of the Near Future", vê alargado o hype.

Admita-se que a banda é um projecto promissor, com um universo de referências mais interessante do que o dos Artic Monkeys, mas ao ouvir o disco é inevitável não ficar com a sensação de que grande parte do que foi escrito colocou a fasquia demasiado alta. O rótulo new rave, com que muitos já o catalogam, é disso exemplo, pois embora tenha surgido a partir de uma piada do vocalista é já utilizado para designar um movimento emergente mas que, a julgar pelo álbum, não parece ter grande fundamento.
De facto, há aqui ocasionais sinais da herança de uns Prodigy e demais representantes da facção inglesa dançável de inícios de 90 - evidentes na sirene de "Atlantis to Interzone" ou na explosão visceral "Four Horsemen of 2012" -, mas fugazes contaminações não chegam para originar um subgénero, a menos que só se considerem as cores garridas das roupas e dos videoclips do grupo.

Curiosamente, a maior parte das canções do disco até se aproxima mais da madchester de finais de 80 e do pós-punk praticado por inúmeras bandas recentes do que de nomes associados à cultura rave, como uns LFO, Fluke ou Orbital. Não há por aqui nada de muito inovador, mas "Myths of the Near Future" até resulta numa fusão relativamente bem conseguida, embora irregular.

Canções como "Gravity's Rainbow", "Forgotten Works" ou "It's Not Over Yet" (contagiante cover do hit dos Grace) funcionam tão bem numa playlist radiofónica como numa pista de dança e, ainda que a banda não exiba uma personalidade muito vincada - "As Above, So Below" poderia ser dos Kaiser Chiefs, por todo o disco há semelhanças com os Happy Mondays ou Infadels, a voz de Jamie Reynolds é um misto de Ian Brown (Stone Roses) e Kele Okereke (Bloc Party) -, gera mais entusiasmo do que indiferença.

Se na música são derivativos, apesar de consistentes, os Klaxons exibem maiores sinais de uma identidade própria nas letras, que ao contrário de muitas bandas recentes de terras de sua majestade não oferecem retratos do quotidiano mas antes devaneios sci-fi e fantasiosos, convocando ciclopes, medusas, aventuras interplanetárias e viagens temporais (o título do disco, por exemplo, é o de um livro de J.G. Ballard). A ideia é original, já o resultado é quase sempre inconsequente, embora o grupo assuma uma postura hedonista e despretensiosa e compense a ligeireza lírica com refrões catchy e eficazes.
Não obstante as muitas arestas por polir, "Myths of the Near Future" prova que faz sentido colocar os Klaxons na selecção de esperanças britânicas, mas não mais do que isso. Nada que os aproxime, por enquanto, de um mito, ainda que não faltem álbuns de estreia que estejam mais longe desse estatuto. Uma banda a acompanhar com alguma atenção...

E O VEREDICTO É:
3/5 - BOM

Klaxons - "Golden Skans"

domingo, março 25, 2007

JUVENTUDE EM MARCHA

Em 1949, um colégio interno de Pequim recebe o seu mais novo morador, Qiang, rapaz de quatro anos que encara com relutância o futuro no seu novo lar. Obrigado a adaptar-se a um novo quotidiano que impõe regras e hábitos diferentes dos que conhece, o protagonista de "Pequenas Flores Vermelhas" (Little Red Flowers / Kan Shang) sofre dificuldades na adaptação a um novo sistema, adoptando uma conduta que destoa da da maioria dos colegas e não sendo, por isso, premiada pelos pelas professoras (com as tais flores vermelhas que dão título ao filme).

Ambientado na China maoísta, a mais recente película de Zhang Yuan é um drama que parte das experiências do pequeno Qiang para relatar como funcionam os sistemas de controlo e os contrastes que reforçam ou diluem entre a esfera individual e colectiva.

Ao conviver com outras crianças educadas de forma distinta da sua, Qiang terá de aderir aos códigos que as orientam sob pena de - e é o que ocorre - ser marginalizado e ignorado, seja por não ter autonomia suficiente ou por ter comportamentos considerados desadequados a certas situações.

"Pequenas Flores Vermelhas" começa por arrancar de forma promissora, já que Yuan consegue delinear uma credível atmosfera realista, com suporte determinante nas convincentes interpretações de todo o elenco (em especial do protagonista, Bowen Dong), o que é um feito notável tendo em conta que este é constituído maioritariamente por crianças.
Seguindo uma estrutura episódica, a narrativa vai seguindo peripécias do dia-a-dia do infantário, de onde sobressai uma rígida rotina que se verifica em todos os momentos, das refeições à higiene pessoal. Embora foque um universo infantil, o filme evita rodriguinhos fáceis e aposta numa salutar secura emocional, ganhando ainda pela caracterização tridimensional das crianças, que nunca são reduzidas a estereótipos.

Um bom desenvolvimento inicial nem sempre leva, contudo, a que uma obra seja plenamente conseguida, e infelizmente "Pequenas Flores Vermelhas" acaba por ir perdendo o rumo à medida que se vai aproximando do desenlace. Depois de um interessante ponto de partida, Yuan parece não ter um programa especialmente trabalhado para o seu filme, repetindo situações desnecessariamente e deixando a narrativa cair na monotonia. Desperdiça-se, assim, a oportunidade de mergulhar num contexto que oferecia interessantes possibilidades, que ficam por concretizar devido a um argumento que se torna circular e inconsequente.

De "Pequenas Flores Vermelhas" guarda-se então o impacto de algumas cenas, de onde sobressai um sóbrio e perspicaz olhar de cineasta, mas lamenta-se que não sejam tão frequentes como seria desejável e que não estejam servidas por uma narrativa mais estruturada e coesa.
Espera-se que o próximo filme de Yuan faça jus aos elogios que apontam a sua filmografia como uma das mais sólidas do novo cinema chinês, porque a julgar pelo seu trabalho mais recente a impressão que fica é a de uma mediania que só seduz pontualmente.

E O VEREDICTO É:
2,5/5 - RAZOÁVEL

sexta-feira, março 23, 2007

VERSÃO 2.0

Uma das interessantes revelações provenientes do Canadá nos últimos anos, os Metric editaram em 2003 "Old World Underground, Where Are You Now?", caracterizado por um apelativo rock de contornos indie, adornos electrónicos q.b. e pontuais temperos new wave, que lhes assegurou uma boa estreia em álbum após as pistas deixadas no EP "Static Anonymity" dois anos antes.
Em "Live It Out", de 2005, a banda não reformula muito a sua proposta sonora, mantendo-se nos mesmos domínios mas sendo ainda capaz de criar canções quase sempre imediatas, com uma precisão pop por vezes invejável.

A voz de Emily Haines adapta-se com facilidade às atmosferas dos temas, ora emanando atitude e visceralidade, ora entregando-se a uma candura absorvente, injectando um considerável cunho pessoal às composições do grupo. A nível instrumental os resultados não são menos coesos, já que a tendência de aliar a energia das guitarras à elegância das electrónicas - utilizadas de forma subtil - revela-se bem conseguida, mesmo que hoje essa prática já esteja longe de ser uma novidade.

À semelhança do seu antecessor, "Live It Out" demonstra que os Metric são músicos e compositores seguros, que aliam sem dificuldade melodias cativantes a um experimentalismo moderado, mas se isso lhes garante uma selecção de boas canções não é suficiente, por enquanto, para os tornar numa banda capaz de grandes feitos.

Há, ainda assim, dois ou três temas de excepção a registar. O primeiro, "Empty", é um deles, e também o que tem a estrutura menos convencional, sendo sereno nos momentos inciais e finais e interrompido por uma inesperada - embora muito bem-vinda - explosão de guitarras, funcionando enquanto uma aliciante entrada para o disco e uma daquelas raras canções que mesmo após várias audições ainda surpreende.
A bilingue "Poster of a Girl", onde Haynes canta em inglês e francês, baseia-se numa feliz junção de teclados e electrónica para gerar o episódio mais dançável do álbum, e apesar de se prolongar em demasia dificilmente será recusado numa pista de dança. O melhor momento surge, no entanto, já na recta final, com "The Police and the Private", canção simultaneamente delicada e arrepiante om uma vocalista em estado de graça.

"Live It Out" não chega a ser um disco brilhante porque não mantém a vibração de temas deste nível, contendo também alguns pouco memoráveis como "Glass Ceiling", suportado num indie rock cru algo genérico, ou "Ending Start", agradável mas apenas regular. O abrasivo "Monster Hospital" remete inevitavelmente para "I Fough the Law", dos Clash, e mesmo sendo uma eficaz descarga de adrenalina fica aquém do que poderia atingir.

Vale a pena, todavia, continuar a acompanhar os Metric, pois embora "Live It Out" não tenha consideráveis avanços em relação ao registo anterior é um disco que exibe solidez e consegue ser muito infeccioso a espaços. Recomenda-se, sobretudo, a quem goste de vocalistas carismáticas envoltas em ambientes nos arredores de uns Furslide, Shivaree, Cardigans ou Yeah Yeah Yeahs.

E O VEREDICTO É:
3,5/5 - BOM

Metric - "Poster of a Girl"

quinta-feira, março 22, 2007

ESTREIA DA SEMANA: "MÚSICA & LETRA"

Numa semana de estreias pouco promissoras, o destaque vai para "Música & Letra" (Music and Lyrics), de Marc Lawrence. Comédia romântica protagonizada por Hugh Grant e Drew Barrymore, não acrescenta muito mas consegue ser um entretenimento simpático e ocasionalmente refrescante. Recomenda-se em especial a quem tenha alguma nostalgia pela década de 80, uma vez que se centra num cantor pop desse período - hoje caído no esquecimento - que vê na escrita de uma canção para uma estrela recente a oportunidade de voltar a ser bem sucedido.
Não sendo uma prioridade, o filme é um aceitável divertimento light que vale essencialmente pela química do par protagonista.

Outras estreias:

"Epic Movie", de Jason Friedberg e Aaron Seltzer
"O Caimão", de Nanni Moretti (precedido pela curta-metragem de animação "História Trágica com Final Feliz", de Regina Pessoa)
"O Homem do Ano", de Barry Sonnenfeld
"Operação Limpeza", de Les Mayfield




Trailer de "Música & Letra"

terça-feira, março 20, 2007

ENTRE INIMIGOS

Depois nos últimos anos ter oferecido um blockbuster, "Ocean's Twelve", e o mais marginal "Bubble" (que em Portugal só foi exibido no Lisbon Village Festival), Steven Soderbergh regressa com um filme que, embora oriundo de um grande estúdio (a Warner) e contendo um elenco de caras mediáticas - George Clooney, Cate Blanchett, Tobey Maguire -, não deixa de ser um projecto arriscado e experimental, confirmando o percurso atípico e imprevisível do realizador norte-americano.

Centrado em Berlim poucos dias depois da Segunda Guerra Mundial, "O Bom Alemão" (The Good German) tem a particularidade de ter sido filmado como uma obra criada na década de 40, recuperando sinais do cinema clássico que influenciam aqui toda a componente formal, desde o obrigatório preto-e-branco à montagem, enquadramentos ou banda-sonora, com uma minúcia que nem deixa de fora as legendas.

Este perfeccionismo mimético não faz, contudo, do filme um trabalho meramente revisionista, já que a acção, que se desenvolve numa ambígua e amargurada atmosfera pós-guerra, acaba por ter ressonâncias sobre a conjuntura actual dos EUA, aproximando "O Bom Alemão" de outros títulos onde George Clooney tem colaborado e que se distinguem também por um forte questionamento político ("Syriana" ou "Boa Noite, e Boa Sorte").

Berlim surge como palco estilhaçado de múltiplas contradições, deixando os sobreviventes do Holocausto com as feridas da guerra, a maior delas o peso da culpa que muitos tentam delegar nos outros. Dominado por personagens de moral dúbia, o filme usa como elo de ligação entre estas um matemático alemão que é procurado por americanos e russos, mas cujo paradeiro apenas é conhecido pela sua esposa, Lena, que entretanto reencontra Jake, um repórter americano com quem manteve uma relação.

Incorporando códigos do film noir, evidentes numa atmosfera estilizada, num argumento intrincado ou na construção de personagens, "O Bom Alemão" arranca de forma intrigante mas aos poucos vai perdendo o fôlego, já que a sofisticação visual não impede que a narrativa se torne cada vez mais mecânica e vá anulando as potencialidades de uma premissa com interesse.

Se o ritmo desigual não ajuda, as personagens também não são uma grande mais-valia, pois nunca conseguem afastar-se de figuras bidimensionais que raramente despertam qualquer empatia. A situação é especialmente penosa quando o elenco tem trunfos fortes como uma enigmática Cate Blanchett, segura na composição de uma dilacerada femme fatale; George Clooney, igual a si próprio mas competente; ou Tobey Maguire, com uma presença mais curta e entregue a uma personagem que talvez merecesse maior desenvolvimento.

"O Bom Alemão" resulta assim numa obra com a qual é difícil lidar: por um lado, tem sequências brilhantes onde Soderbergh esmaga pela mestria com que filma, exibindo um notável savoir faire técnico - ainda mais impressionante tendo em conta que o realizador também se encarregou da montagem e da fotografia, esta última o melhor que o filme tem -; por outro, dilui esse efeito num argumento incapaz de entusiasmar, gerando doses crescentes de distância e indiferença. Do balanço obtém-se uma película mediana e pouco memorável, que não mancha o (igualmente desequilibrado) currículo do cineasta mas também não se junta à lista dos seus títulos mais marcantes.


E O VEREDICTO É: 2,5/5 - RAZOÁVEL

segunda-feira, março 19, 2007

CINE7(X 2)

O Cine7, blog de cuja equipa faço parte, celebra hoje dois anos de existência. Com colaboradores de gostos díspares e, consequentemente, uma selecção ecléctica de filmes destacados (que estão todos na imagem acima), partiu de uma ideia d' O Emissor e desde então teve na sua equipa muitos outros participantes, bloggers ou não. Os meus parabéns e quem quiser colaborar neste projecto ainda está a tempo de aderir.

sábado, março 17, 2007

ROBÔS E ROCK 'N' ROLL

São de Tomar e constituem já uma das boas promessas da música nacional com álbum editado este ano. Na apresentação oficial do mesmo, ontem no MusicBox, em Lisboa, os U-Clic trouxeram uma convincente combinação de rock e electrónica e demonstraram que são um nome a ter em conta também ao vivo.

Passavam cerca de trinta minutos da meia noite quando os U-Clic entraram em palco ao som de "Zumbido at Paradiso", o único tema instrumental do álbum de estreia, "Console Pupils", que motivou a passagem do trio pela capital. Vincado por uma apelativa cadência electro, gerou um eficaz início de concerto e uma proposta dançável que muitos não recusaram.

O convite à dança e descompressão reforçou-se por uma tela onde foram projectadas imagens de cores vivas, e esse suporte visual revelou-se determinante ao longo de todo o espectáculo. Desde a presença de um Rato Mickey "alternativo" em "Ici in Disneyland" às recorrentes imagens de Eusébio em "Euro 2.0.0.4'", passando pelas capas de discos de bandas que influenciaram o grupo em "Unfashionautic Superstars", a componente visual esteve quase sempre de acordo com a musical, adaptando-se às particularidades de cada tema.

Felizmente, esta atenção à imagem - visível também nos fatos brancos do trio e na sua postura maquinal e estática - nunca se sobrepôs ao essencial, ou seja, às canções que os U-Clic vieram apresentar. E "Console Pupils" revelou uma série de temas dignos de nota, que não escondem influências de terceiros mas são capazes de as ultrapassar e demonstrar um projecto com alguns sinais de personalidade.

Se no já referido "Unfashionautic Superstars" a banda enumerou vários nomes que reclama como referências, casos dos Sonic Youth, New Order ou Add N to (X), é possível identificar nas suas canções reminiscências de uns Human League, Gary Numan ou Devo, dada a combinação de guitarras e electrónica aliadas a um travo new wave/pós punk (menos demarcado, contudo, do que noutros grupos recentes que reaproveitaram a herança do género).

A voz de Filipe Confraria aproxima-se por vezes da de Paul Banks, dos Interpol, e o vocoder utilizado em alguns momentos lembra as experiências dos Kraftwerk e descendentes. Não obstante as comparações, os U-Clic evidenciaram solidez na procura de um espaço próprio e o concerto nunca ficou abaixo do competente, oferecendo momentos de entusiasmo considerável como o single "Robot 'n' Roll", com uma energia dificilmente recusável, o muito auspicioso "Like", uma bela canção pop, ou "Sattelite Club", outra sólida proposta dançável.

Ao longo de uma hora, a banda demonstrou que "Console Pupils" possui doses suficientes de proteínas musicais para causar boa impressão e ofereceu uma actuação que nunca perdeu o ritmo. O concerto beneficiaria com a inclusão de mais temas onde o electro apaga o rock, como no primeiro do encore, uma remistura de "When Will I Be Famous", dos Bros, que que colocou quase todos os espectadores a dançar.
De qualquer forma, fica a revelação de um projecto a acompanhar, se possível ao vivo - ou através do blog e do myspace - , que passará nos próximos dias pelo Porto (25 de Março na FNAC de Sta Catarina), Marinha Grande (7 de Abril no Festival Overlive), Maia (13 de Abril na Tertúlia Castalense) e Póvoa de Varzim (14 de Abril no Plastic).

E O VEREDICTO É:
3/5 - BOM


U-Clic - "Robot 'n' Roll"

sexta-feira, março 16, 2007

SEXTA-FEIRA À NOITE NUM VÍDEO (MAIS OU MENOS):


The Sounds - "Tony the Beat"

quinta-feira, março 15, 2007

A UM MÊS DO INDIE...

A quarta edição do IndieLisboa realiza-se de 19 a 29 de Abril em Lisboa e conta com 223 filmes de vários géneros e origens geográficas que em comum têm as raízes independentes. A conferência de imprensa de apresentação do programa decorreu esta manhã no cinema Londres e revelou algumas das principais novidades previstas.

Miguel Valverde, Nuno Sena e Rui Pereira, os organizadores, avançaram hoje com as principais linhas orientadoras da quarta edição do Festival Internacional de Cinema Independente que já se tornou num dos eventos de referência do género.

'A Scanner Darkly', o novo filme de Richard Linklater

Das muitas novidades para este ano, salientou-se a inclusão do cinema São Jorge entre as salas que receberão filmes do festival - espaço onde já tinha decorrido a primeira edição -, mantendo-se as do King, Fórum Lisboa e Londres. Outros elementos inéditos são um autocarro especial que fará o percurso de ida e volta entre a Avenida de Roma e a da Liberdade, gratuito para portadores de bilhete para uma das sessões, ou uma bilheteira centralizada no Fórum Lisboa, onde poderão ser adquiridas entradas para todas as salas.

Rui Pereira destacou que esta edição aposta "não no crescimento mas na consolidação do festival", motivo pelo qual há menos filmes do que no ano anterior - serão 223 em vez de 300 -, mas onde se espera atingir um número recorde de espectadores, dando continuidade ao crescimento contínuo ao longo dos anos. A organização aposta em números na ordem dos 30 mil, ultrapassando os 28 mil registados em 2006.

Um recorde que já se verificou foi no número de obras a concurso, 2500, vistas pela organização e das quais foram seleccionadas 230. As que não foram escolhidas poderão ser vistas na Videoteca FNAC, situada no Fórum Lisboa e de acesso gratuito. Continua a aposta nas curtas-metragens, que o certame defendeu desde o início, e este ano serão exibidas 135, suplantando o número de longas, 88. Destas, 127 são europeias (e 18 portuguesas), 38 asiáticas, outras 38 dos EUA e Canadá, 12 da América Latina e 3 de África.

Entre as secções costam a Competição Oficial, o Observatório, o Laboratório, o Indie Júnior, o Indie Music, Director's Cut, as Antestreias e o Herói Independente. Esta última área destacará o Novíssimo Cinema Alemão e o realizador japonês Shinji Aoyama, cujas cinematografias são praticamente desconhecidas em Portugal.
Cineastas alemães surgidos nos anos 90, como Angela Shanelec, Valeska Grisebach ou Thomas Arslan tornaram-se já incontornáveis no seu país, e a organização acredita que a sua vitalidade merece ser finalmente divulgada em salas nacionais. Igualmente inédito entre nós, Aoyama possui uma obra versátil que percorre géneros e formatos - curtas, longas, documentários - e que o colocou entre os nomes cimeiros do cinema nipónico contemporâneo, com visibilidade em vários festivais internacionais mas, até agora, com apenas um filme ("Eureka") editado em DVD em Portugal.

Outros destaques do IndieLisboa contemplam dois concertos que interligam cinema e música. Em "Life in Loops" os austríacos Sofa Surfers actuarão acompanhados por imagens do documentário "Megacities", de Michael Glawogger, um dos filmes mais aplaudidos da edição do ano passado que surgirá numa versão remix. Já "O Garoto de Charlot", de Charles Chaplin, será complementado com música dos Coty Cream.

'Shortbus', de John Cameron Mitchell

Outras actividades especiais são a mostra dos melhores filmes do L'Alternativa, o Festival de Cinema Independente de Barcelona; a estreia do New Crowded Hope em Portugal, projecto que une várias artes numa homenagem a Mozart; as Lisbon Talks, que concentram seminários, mesas redondas, masterclasses e workshops; animações nocturnas no São Jorge e uma grande festa no Lux; ou as extensões em pelo menos cinco cidades a partir de 30 de Abril (Alcobaça, Angra do Heroísmo, Odivelas, Torres Vedras e Vila Nova de Famalicão estão já confirmadas).

Para além de revelar muitos nomos nomes, o IndieLisboa traz também algumas das obras mais recentes de cineastas já consagrados. É o caso de "Fay Grim", de Hal Hartley - realizador que estará presente no festival -; "A Scanner Darkly", de Richard Linklater; "Angel", de François Ozon; "Shortbus", de John Cameron Mitchell; ou "Rio Turvo", do português Edgar Pêra. Larry Clark, Matthew Barney e Gaspar Noe, entre outros, colaboram em "Destricted", conjunto de curtas-metragens, e o actor Ethan Hawke estreia-se na realização em "The Hottest State".
Muitos filmes a descobrir, portanto, ao longo de dez dias já em Abril.

ESTREIA DA SEMANA: "THE FOUNTAIN - O ÚLTIMO CAPÍTULO"

Finalmente! Após múltiplos adiamentos, estreia agora em salas nacionais o novo filme de um dos mais interessantes realizadores da última década, Darren Aronofsky. O muito aguardado "The Fountain - O Último Capítulo" acumula expectativas devido aos títulos anteriores do cineasta - "Pi" e o brilhante "A Vida não é um Sonho" - e, embora tenha dividido opiniões logo desde a estreia mundial, em Cannes, deverá valer a pena o risco. Hugh Jackman e Rachel Weisz são os protagonistas desta história de amor que percorre séculos e incorpora elementos fantásticos. Fica a sugestão, eu vou segui-la.

Outras estreias:

"Fur - Um Retrato Imaginário de Diane Arbus", de Steven Shainberg
"Norbit", de Brian Robbins
"O Véu Pintado", de John Curran (o realizador do recomendável "Desencontros")
"Os Anjos Exterminadores", de Jean-Claude Brisseau
"Pequenas Flores Vermelhas", de Zhang Yuan
"Suicídio Encomendado", de Artur Serra Araújo


Trailer de "The Fountain - O Último Capítulo"

terça-feira, março 13, 2007

COISAS DOCES COM AÇÚCAR

Uma das agradáveis surpresas de 2006, "We Are the Pipettes" assegura a estreia em disco das Pipettes, trio feminino de Brighton que apresenta aqui uma curiosa proposta de travo retro, sem no entanto deixar de praticar uma sonoridade actual.

Gwenno, Rose e Becki resgatam alguns dos traços das girl bands dos anos 60 e aliam essa pop kitsch, lúdica e swingante a temperos indie, conseguindo um misto quase sempre cativante e recheado de canções trauteáveis. O tema homónimo, que abre o álbum, é uma irresistível porta de entrada para uma sucessão de composições despretensiosas, vincadas por uma leveza que não deve ser confundida com mediocridade, uma vez que a maioria são exemplo de uma bem oleada confecção pop.

Se inicialmente há ecos de umas Luscious Jackson ou Bis, o resto do disco não exibe tanto essas semelhanças, aproximando-se mais de tempos com vestidos às bolinhas e de bailes de liceu com palminhas recorrentes, por vezes pisando a fronteira dos Camera Obscura, The Go!Team ou mesmo dos Cardigans de outros tempos.

"Pull Shapes" é um dos mais eficazes convites à dança, realçando o valor da melodia pela melodia e assumindo uma postura descomplexada, de resto palpável ao longo de todo o álbum. "Why Did You Stay?" assinala a primeira de muitas incursões por relatos boy meets girl, num dos momentos em que a justaposição das vozes das três meninas atinge resultados mais saborosos e convida a audições consecutivas.

E até ao último tema, singelamente intitulado "I Love You", as Pipettes disparam aprazíveis rebuçados de, no máximo, três minutos, com raras pausas para um dinamismo que acaba por contagiar. Contudo, é sabido que altas doses de açúcar podem revelar-se enjoativas, e embora aqui não se chegue a tanto há que reconhecer que a recta final do disco já não emana a mesma frescura, pelo que "We Are the Pipettes" só ganharia em retirar duas ou três canções de um alinhamento que acaba por se tornar repetitivo.

Alguma redundância não estraga, contudo, o que ficou para trás, e apesar do embrulho ligeiro este é um projecto musicalmente coeso, não só pelas apropriadas contribuições vocais do trio mas também pelo trabalho dos Cassettes, os músicos de serviço cuja consistência é evidente (com destaque para os belíssimos arranjos de cordas).

As letras também ajudam a consolidar uma boa impressão, sendo dominadas por um sentido de humor que as afasta de banais reflexões amorososas e apoia-se antes num girl power moderado e auto-consciente (não há por aqui meninas ingénuas), cuja ironia é desde logo sugerida em títulos como "Your Kisses Are Wasted on Me" ou "It Hurts to See You Dance So Well".

"We Are the Pipettes" talvez fosse mais estimulante se apostasse numa maior versatilidade, oferecendo outras canções mais tranquilas e sóbrias como a frágil "A Winter's Sky", mas pode ser que as Pipettes explorem essa via num próximo disco. Assim como está, este não deixa de ser uma estreia capaz de acompanhar - e encorajar - vários serões dançantes.

E O VEREDICTO É:
3/5 - BOM

The Pipettes - "Pull Shapes"

segunda-feira, março 12, 2007

PECADOS ÍNTIMOS

Nos últimos anos, o cinema alemão tem sido pródigo na oferta de interessantes ficções sempre sustentadas no real, em particular na situação conturbada que o país viveu durante e após a Segunda Guerra Mundial. "Adeus Lenine!", "A Queda – Hitler e o Fim do Terceiro Reich" ou "Sophie Scholl - Os Últimos Dias" são alguns dos exemplos mais mediáticos, a que se vem juntar "As Vidas dos Outros" (Das Leben der Anderen), de Florian Henckel von Donnersmarck, vencedor do Óscar de Melhor Filme em Língua Não-Inglesa.

A acção tem início poucos anos antes da queda do muro de Berlim, situando-se na República Democrática Alemã e desenvolvendo uma claustrofóbica teia narrativa ancorada num sistema repressor e totalitário, que envolve os cidadãos numa sociedade de contornos orwellianos. É aí que um dos agentes da Stasi, a polícia política, tem como missão mais recente vigiar e reportar os acontecimentos que marcam o dia-a-dia de um escritor e da sua esposa, cuja conduta os colocou como suspeitos de sabotagem ao regime.

Contudo, à medida que vai conhecendo as vidas do casal que observa e escuta, o solitário oficial vê colocadas em causa as suas convicções e começa a questionar os pressupostos do sistema a que obedece, adquirindo uma familiariedade e empatia crescentes com os dois artistas e a dedicação destes às suas obras.

Abordando de forma complexa e sóbria um contexto facilmente dado a pontos de vista tendenciosos e maniqueístas, "As Vidas dos Outros" alia características do thriller e do drama para consolidar um objecto rigoro e inquietante, que pacientemente vai mergulhando o espectador numa espiral de medo, suspeita e intimidação. Se nos primeiros minutos a atmosfera não difere muito da de uma competente, mas indistinta série televisiva histórica, o filme consegue ir desenhando personagens densas, longe de uma função meramente simbólica, assim como usar a seu favor uma realização despojada e clínica, vincada por uma fotografia de apropriados tons acinzentados e lúgubres.

Embora quase sempre lacónica, à semelhança da postura do agente voyeur, a película nunca se torna fria ou mecânica, uma vez que há suficientes sequências de forte carga emocional construídas com uma sensibilidade digna de registo. As cenas com o casal são particularmente memoráveis, emanando um intimismo caloroso que, mesmo assim, não consegue fugir à interferência e controlo de um regime opressivo. Não menos meritória é a direcção de actores, já que o elenco exibe uma solidez uniforme e é essencial para que a narrativa se desenvolva de forma tão credível.

Há alguns detalhes menos convincentes, como a relativamente rápida mudança de atitude do polícia que vigia o duo de artistas - não muito provável na carreira de um veterano tão obstinado e inflexível -, ou o desenlace do filme, que se arrasta em demasia e apresenta uma solução mais confortável. Estes elementos não chegam, no entanto, para comprometer a consistência de uma obra inspirada e pungente, como "As Vidas dos Outros" claramente é.

E O VEREDICTO É:
3,5/5 - BOM

domingo, março 11, 2007

HEROES

O sinal mais recente do pós-11 de Setembro nos EUA fez-se sentir nos comics, com a morte de um dos seus ícones mais lendários: o Capitão América. O emblemático ícone da Marvel foi a grande vítima da Civil War, guerra que dividiu muitas personagens entre as que eram contra ou a favor do acto de registo de super-heróis. Resta saber se a ideia é para manter ou se se resume a uma manobra de marketing como foi a morte do Super-Homem há anos, da concorrente DC Comics.

sábado, março 10, 2007

UM MOULIN ROUGE EM CENÁRIOS WESTERN

Após a estreia em Portugal no passado dia 3, no Centro de Artes do Espectáculo de Portalegre, os Yard Dogs Road Show estiveram quinta-feira na Aula Magna, em Lisboa. As actuações integram-se na primeira digressão europeia do colectivo norte-americano, que se tem distinguido por uma amálgama de teatro, música e números circenses, reciclando influências díspares para gerar um combinado imprevisível e de difícil catalogação.

Abrangente e dinâmico, o espectáculo contou com sequências musicais, de representação ou de ilusionismo, diluindo as fronteiras das artes performativas e aliando-as ao longo de cerca de hora e meia cujo fio condutor pareceu ser a ausência de limites.

Contendo bailarinas aparentemente recrutadas num saloon texano de há mais de um século, engulidores de espadas, balões (!), fogo (!!) e sabres de luz (!!!), cantores de rock & roll de linhagem clássica e blues regado a álcool, insinuantes femme fatales ancoradas em desencantadas torch songs ou mesmo uma galinha surgida do nada, este road show proporcionou um incomum espectáculo de variedades sempre condimentado por uma consistente banda.

Tamanha diversidade e ousadia são salutares e por vezes intrigantes, mas o colectivo nem sempre conseguiu manter o ritmo e a capacidade de surpresa, demorando a arrancar e deslizando em algumas sequências pouco inspiradas ou mesmo cansativas, caso dos episódios roqueiros, de alguns momentos supostamente cómicos - suportados num burlesco irregular -, ou das canções em que o dinamismo abrandava para dar espaço a alguma modorra.

Mesmo assim, é difícil não reconhecer o profissionalismo e dedicação dos artistas, cuja entrega foi evidente e que pareceram estar a divertir-se tanto como boa parte do público (juntando-se a este para fotos, autógrafos e conversas à saída). Fulcrais para uma maior empatia foram ocasionais diálogos em português, muito além dos habituais agradecimentos e por isso mesmo inesperados.

Dos Yard Dogs Road Show fica então o registo de um competente, ainda que desequilibrado entretenimento offbeat, capaz de articular com segurança (sub)culturas distintas unidas num cabaret desregrado, trazendo à noite de ontem alguma poeira do velho Oeste (por vezes a lembrar a série televisiva de culto "Carnivàle") mas exibindo também ocasionais heranças dos desertos do médio oriente (onde não faltaram as emblemáticas danças do ventre).

E O VEREDICTO É:
2,5/5 - RAZOÁVEL

sexta-feira, março 09, 2007

O FABULOSO CONCERTO DE TIERSEN

Para muitos, Yann Tiersen será sempre obrigatoriamente associado aos filmes "Adeus, Lenine!" e, sobretudo, "O Fabuloso Destino de Amélie", uma vez que as bandas-sonoras que compôs para ambos foram os trabalhos que mais o aproximaram do grande público. É, no entanto, injusto reduzir o artista a esses dois registos, não só porque o músico francês tinha já uma considerável - e sólida - discografia antes dessas colaborações, mas também porque os territórios sonoros que explora são bem mais diversificados do que os que abordou aí.
Esse eclectismo foi evidente no concerto de quarta-feira na Aula Magna, em Lisboa, esgotado há dias e que levou a que Tiersen e a banda de suporte fossem recebidos por uma sala cheia, preenchida por um público de várias faixas etárias.

Com um alinhamento maioritariamente dominado por temas instrumentais - embora o músico tenha cantado em francês e inglês a espaços -, o espectáculo proporcionou uma equilibrada alternância de atmosferas, percorrendo muitas facetas já expostas nos discos. Desta vez, o álbum em destaque foi "On Tour", registo ao vivo que contamina canções já conhecidas com arranjos diferentes, mais apropriados ao palco. E foi isso que se verificou ao longo da noite, uma sucessão de temas - uns mais emblemáticos do que outros - interpretados num formato que procurou fugir ao óbvio.

Felizmente, essa postura experimental revelou-se quase sempre frutífera, o que não foi muito inesperado tendo em conta a mestria pela qual Tiersen já se destacou nos seus concertos. Contrastando cenários de cativante placidez com outros de dinamismo abrasivo, a noite registou um entusiasmante melting pot que interligou os múltiplos universos pisados pelo músico, desde os esperados domínios parisienses, que lhe trouxeram maior mediatismo, passando por incursões pelo indie rock, música clássica, devaneios noise e pontuais aproximações medievais.
Para além da mistura de géneros, o cardápio musical foi igualmente rico a nível instrumental, dando espaço a autênticos vendavais de guitarras distorcidas e espirais de violinos em fúria, não esquecendo a contribuição menos recorrente da bateria, do baixo, da já habitual caixinha de música ou do acordeão (este usado apenas num tema, "Le Banquet", o que terá defraudado as expectativas de muitos que procuravam ali revisitar Amélie).

O cuidado trabalho de iluminação ajudou a reforçar as paisagens distintas de cada canção, apostando em tons ora discretos ora efervescentes, mas sempre elegantes, cruzando tonalidades várias e implementando uma cenografia envolvente, dotada de uma carga quase cinematográfica. Ao longo de duas horas, Tiersen ofereceu um espectáculo surpreendente e desafiante, ainda que nem sempre acessível - alguns momentos sobrepuseram a visceralidade à melodia e outros prolongaram-se excessivamente -, que lhe permitiu confirmar-se - para quem ainda duvidasse - enquanto músico idiossincrático e muito interessante.

Não admira, por isso, que grande parte do público tenha reagido de de forma tão intensa, com ruidosos aplausos que encorajaram os músicos a regressar a palco para dois encores. Pouco importa que Yann Tiersen tenha encetado apenas duas ou três brevíssimas declarações aos espectadores - quase sempre para agradecer -; as palavras que lhes dirigiu pareceram espontâneas, à semelhança de um concerto que não será esquecido tão cedo.

E O VEREDICTO É:
3,5/5 - BOM


Yann Tiersen - "Le Banquet" (ao vivo na Aula Magna)

quinta-feira, março 08, 2007

ESTREIA DA SEMANA: "BRAVA DANÇA"

Documentário sobre um dos mais marcantes grupos da pop cantada em português, "Brava Dança" viaja até ao início da década de 80 para revelar as origens dos Heróis do Mar. Com base em testemunhos dos artistas e de outras personalidades ou imagens de arquivo, José Francisco Pinheiro e Jorge Pereirinha Pires propõem um olhar centrado na banda mas que é também ponto de partida para reflectir acerca a música nacional dos últimos anos. A ver e ouvir.

Outras estreias:

"A Maldição da Flor Dourada", de Zhang Yimou
"Ghost Rider", de Mark Steven Johnson
"O Bom Alemão", de Steven Soderbergh
"O Mundo Encantado de Beatrix Potter", de Chris Noonan
"Pulse - A Última Dimensão", de Jim Sonzero


Trailer de "Brava Dança"

terça-feira, março 06, 2007

FIM-DE-SEMANA (POUCO) ALUCINANTE

Quando, há dois anos, emergiu uma nova geração de bandas com claras reminiscências do pós-punk, os Bloc Party provaram, com o seu primeiro álbum, "Silent Alarm", ser uma das mais promissoras e atípicas. Não negando óbvias influências - Gang of Four, The Cure -, o quarteto londrino também não se limitou a replicá-las, assinando uma estreia já com claros sinais de personalidade.

"A Weekend in the City", o segundo longa-duração, marca agora o regresso, que poderá frustrar as expectativas de quem conhece o grupo por singles de descarga como "Banquet" ou "Helicopter", tendo o primeiro exposto os Bloc Party a um público relativamente vasto devido a uma popular campanha publicitária.
Longe de ser um "Silent Alarm: Parte II", o novo disco aposta em domínios mais apaziguados do que os do registo antecessor, sendo escassos os momentos de euforia dançável e demais manobras de agitação sonora. Se os primeiros temas exibem ainda uma considerável pulsão, sendo quase continuações directas do primeiro álbum, o alinhamento torna-se progressivamente menos dinâmico, salvo ocasionais erupções de energia em alguns refrões.

Se muitas canções de "Silent Alarm" apelavam à pista de dança (tendência ainda mais evidente no sólido disco de remisturas "Silent Alarm Remixed"), "A Weekend in the City" presta-se mais a audições caseiras ou, porque não, a viagens de carro nocturnas - seguindo a sugestão da óptima capa -, em fase de descompressão após uma noite animada. À partida, contudo, torna-se duvidoso saber se a mudança foi positiva, já que estas novas composições são tendencialmente mais convencionais do que experimentais, situação que, de resto, as canções menos frenéticas do disco anterior já acusavam.

Por vezes o grupo ensaia episódios mais ousados, como em "The Prayer", que Kele Okereke inicia com um incomum registo vocal, rodeado por uma aura negra de percussões hipnóticas e coros sorumbáticos, que sugere a influência fusionista de uns TV on the Radio. Contudo, os condimentos sonoros de grande parte do restante álbum são menos aliciantes e aproximam a banda da formatação de uns U2, Snow Patrol - nomes com quem Jacknife Lee, o produtor, já colaborou - ou Coldplay, proporcionando canções mais polidas e lineares.

No entanto, se os Bloc Party são aqui menos aventureiros musicalmente, aprimoram - e muito - a escrita, ainda que neste caso o mérito seja do vocalista, autor das letras. O título do álbum é desde logo emblemático, uma vez que "A Weekend in the City" propõe uma viagem por Londres e, no caminho, oferece um olhar sobre a juventude urbana do novo milénio, que Okereke caracteriza de forma sensível e honesta, ainda que não escape a alguns clichés (como no demasiado óbvio "Uniform", que quase escorrega para um vulgar hino emo).

Os retratos são sentidos e tanto investem na desolação da era da abundância (em "Song For Clay (Disappear Here)", inspirado no livro "Menos que Zero", de Bret Eston Ellis), na abordagem das drogas - sem moralismos nem excessos de irreverência - ("0n"), no racismo ("Where is Home?") ou no terrorismo e consequente alarmismo ("Hunting for Witches").

As melhores reflexões são, todavia, as mais intimistas, tanto na nostálgica "Waiting For The 7.18", que conta ainda com um dos refrões mais emotivos, como na trilogia da recta final do disco, que Okereke dedica às relações amorosas, desde amargurados one night stands ("Kreuzberg"), paixões adolescentes por consumar ("I Still Remember") ou no mais esperançoso "Sunday", porventura a mais bela descrição de um domingo pós-ressaca vivido a dois.

"A Weekend in the City" resulta assim num disco desigual, pois se as melodias e estruturas que se sucedem de tema para tema são demasiado homogéneas, as canções conseguem distinguir-se facilmente se se der às letras a atenção que estas merecem. Os Bloc Party perderam então em frescura o que ganharam em densidade, e neste caso isso está longe de ser mau, só é pena que também não seja tão bom como se esperaria, tendo em conta a banda em causa.


E O VEREDICTO É:
3/5 - BOM


Bloc Party - "I Still Remember"

domingo, março 04, 2007

A ESCOLA DA VIDA

Um professor e uma aluna. Ele, Dan, um dedicado mas algo controverso docente de um liceu de Brooklyn que encontra na sua profissão o único ponto de equilíbrio e motivação; ela, Drey, uma estudante de uma das suas turmas, que apesar de ainda estar a entrar na adolescência já sofreu a dor de um pai ausente e de um irmão preso por tráfico de droga. Entre os dois começa a consolidar-se uma afinidade gerada pela partilha de um segredo - ela encontra-o a inalar droga numa das casas-de-banho da escola - e esta atípica ligação vem tirar algum espaço à solidão e desorientação que marca o dia-a-dia de ambos.

A partir desta premissa simples, mas muito bem aproveitada, "Half Nelson - Encurralados" oferece um complexo e absorvente estudo de personagens ancorado em dois desempenhos notáveis, que catapultam os protagonistas para a lista de actores a ter em conta: Shareeka Epps, uma jovem revelação que surpreende pela expressão de serenidade magoada, e sobretudo Ryan Gosling, actor que já tinha dado provas de talento em títulos como "Crimes Calculados" ou "Stay" mas que oferece aqui uma interpretação quase inexcedível.
Na pele de um homem cujo idealismo é cada vez mais um refúgio de curta duração, Gosling emana raiva, entusiasmo, desencanto, esperança e frustração ao longo de um quotidiano que lhe proporciona escassos pontos de fuga. O mais recorrente acaba por ser a cocaína, da qual se torna indissociável e cuja dependência começa a ameaçar a sua conduta como professor.

Aproximando-se da espontaneidade e vibração de um Edward Norton mais jovem, Gosling é sem dúvida o grande trunfo de "Half Nelson - Encurralados", tendo sido justamente nomeado para o Óscar de Melhor Actor Principal por este desempenho.

Felizmente, o filme tem ainda outras mais-valias, não se esgotando num one man show mas conseguindo enveredar por caminhos ardilosos sem nunca escorregar para um tentador moralismo, cenas de choque gratuito ou um choradinho auto-indulgente assente no triste fado do junkie. Aqui, reconheça-se o mérito de Ryan Fleck, realizador (estreante) e co-argumentista que conduz a sua obra com mão segura e consegue injectar-lhe uma contínua densidade emocional, criando um retrato sóbrio, inteligente e comovente de um jovem adulto incapaz de reestruturar a sua vida mas que tenta, ainda assim, impedir que a sua aluna caia na mesma espiral.

Fleck apresenta uma palpável atmosfera urbana com um acentuado recorte realista, apoiando-se num sólido trabalho de realização, numa outonal fotografia de tons turvos e na escolha de uma determinante (e viciante) banda-sonora, servida pelos Broken Social Scene. Nada mal para uma primeira obra de baixo orçamento, uma das mais estimulantes do cinema independente norte-americano dos últimos tempos e que, por isso mesmo, não merece ficar perdida no meio dos muitos títulos que vão estreando.

E O VEREDICTO É:
4/5 - MUITO BOM


Broken Social Scene - "Stars and Sons"

sábado, março 03, 2007

UM ADMIRÁVEL MUNDO NOVO DE ESCAPISMO

Terceiro romance de Michael Chabon, "As Espantosas Aventuras de Kavalier & Clay" (The Amazing Adventures of Kavalier & Clay) foi o que proporcionou ao escritor norte-americano ganhar o Pulitzer em 2001 na categoria de ficção, cimentando a boa reputação iniciada em "The Mysteries of Pittsburgh" (1988) e continuada em "Prodígios" (Wonder Boys, de 1995), este último adaptado para cinema por Curtis Hanson.

O livro alicerça-se na relação de amizade de dois primos que partilham a paixão pela banda-desenhada e acabam por se tornar numa das principais duplas criativas do género, durante os anos 40. Sam Clay, adolescente residente em Brooklyn, Nova Iorque, recebe uma noite a visita inesperada do seu primo checo que desconhecia, Joe Kavalier, cuja ascendência judia o obrigou a fugir de Praga, controlada pelas tropas nazis durante o início da Segunda Guerra Mundial. Se o primeiro teve até então uma vida pacata na companhia da sua mãe e, esporadicamente, do pai, o segundo foi o único elemento da sua família nuclear que conseguiu emigrar, após uma série de episódios arriscados, mas tem ainda a esperança de conseguir trazer para os Estados Unidos, pelo menos, o seu irmão mais novo.

Apesar de personalidades e vivências díspares, os dois jovens rapidamente travam uma amizade que os interligará durante anos, em parte motivada pela paixão que nutrem pela nona arte e pela parceria profissional que esse gosto comum os leva a gerar. Sam toma a seu cargo os argumentos, Joe ocupa-se do desenho e essa simbiose permite-lhes criar uma série de personagens mediáticas, a maior delas O Escapista, um dos muitos super-heróis que surgiram depois do sucesso de vendas do Super-Homem.

Através do percurso e crescimento dos seus dois protagonistas, "As Espantosas Aventuras de Kavalier & Clay" traça uma envolvente perspectiva sobre as contrariedades do american dream, centrando-se na evolução da cultura popular das últimas décadas, com especial incidência nos comics e no papel que os seus heróis adquiriram durante o Holocausto.
Genuína e cativante ode à capacidade de evasão que esta amálgama de artes gráficas e literárias proporcionou durante a Era Dourada, proporciona uma interessante análise às singularidades deste meio e ao contexto do seu surgimento.

Chabon impressiona pela riqueza histórica palpável ao longo do livro, fruto de uma longa pesquisa onde contactou com muitos argumentistas e artistas que iniciaram as suas carreiras na época, casos de Will Eisner (autor de "Spirit") ou Stan Lee (talvez o mais emblemático criador da Marvel Comics), entre muitos outros.
O escritor baseou-se nestes relatos para desenvolver a história de Joe e Sam, em especial os momentos que se referem aos bastidores editoriais, alguns dos que emanam maior verosimilhança ao longo da acção. Paralelamente, evoca outras figuras reais como Fredric Wertham, o psicólogo cujo livro "Seduction of the Innocent" desencadeou uma caça às bruxas que quase conduziu ao fim dos comics - devido, sobretudo, às supostas conotações sexuais que estes continham, por exemplo na relação "ambígua" entre Batman e Robin - ou Orson Welles, cujo trabalho na realização ajudou a redifinir os cânones da estrutura das pranchas.

No entanto, o livro não se esgota na exploração da natureza da banda-desenhada e oferece um olhar sobre a realidade americana - particularmente a nova-iorquina - da década de 40, focando ainda questões como o tratamento dos judeus, o núcleo familiar ou a homossexualidade, elementos que, com maior ou menor incidência, entrecruzam o caminho dos dois protagonistas.

Michael Chabon com as 'action figures' de Batman, Lanterna Verde e Super-Homem

Chabon nem sempre consegue equilibrar a gestão de tamanha diversidade ao longo das mais de 600 páginas, pois por vezes a acção torna-se demasiado dispersa e há capítulos que se prolongam para além do necessário (como o de Joe na Antárctida). O espaço dado a cada um dos protagonistas também é desequilibrado, uma vez que Sam é uma personagem menos presente do que Joe, embora talvez mais interessante devido aos conflitos com a sua sexualidade, à forma ambivalente com que encara a BD ou à solidão de que não parece conseguir escapar.

"As Espantosas Aventuras de Kavalier & Clay" pode nem sempre conseguir despertar o mesmo entusiasmo, mas nunca se torna previsível ou banal e é resultado de uma evidente paixão do escritor pelas personagens e dedicação aos temas focados. Apresentando uma sólida densidade dramática e uma imaginativa mistura de realismo e fantasia através de uma escrita acessível, embora exigente, é um livro especialmente recomendável a amantes da nona arte mas não deixa de possuir atributos capazes de seduzir um público mais abrangente.

Chabon viria a alargar a sua proximidade com os comics ao assinar o argumento de "Homem-Aranha 2", de Sam Raimi, não por acaso um dos poucos filmes de super-heróis dos últimos anos que funciona plenamente enquanto delicioso e irresistível escapismo. Resta esperar que semelhante impacto se registe caso "As Espantosas Aventuras de Kavalier & Clay" chegue a ser adaptado para cinema - com realização a cargo de Stephen Daldry ("Billy Elliot", "As Horas") -, mas mesmo que tal não aconteça, a (re)descoberta do livro será sempre uma hipótese bastante recomendável.


E O VEREDICTO É: 3,5/5 - BOM

quinta-feira, março 01, 2007

ESTREIA DA SEMANA: "O LABIRINTO DO FAUNO"

Estreia esta semana o muito elogiado "O Labirinto do Fauno" (El Laberinto del Fauno), nomeado para seis Óscares e vencedor de três (Melhor Direcção Artística, Melhor Fotografia e Melhor Caracterização). Depois de títulos como "Blade 2" ou "Hellboy", Guillermo del Toro apresenta aqui o filme que muitos consideram ser já a sua obra-prima, e há mesmo quem diga que é o melhor conto de fadas para adultos desde "Eduardo Mãos de Tesoura", de Tim Burton. Questões a esclarecer a partir de hoje.

Outras estreias:

"Dreamgirls", de Bill Condon
"Diário de um Escândalo", de Richard Eyre


Trailer de "O Labirinto do Fauno"