segunda-feira, abril 17, 2006

IRMÃOS INSEPARÁVEIS

Doloroso e pungente olhar sobre a infância, a família, a solidão e o crescimento, "Ninguém Sabe" (Dare mo shiranai / Nobody Knows), do japonês Hirokazu Kore-eda, é um drama que segue o dia-a-dia de quatro pequenos irmãos abandonados pela mãe num apartamento de Tóquio.

Inspirado num caso verídico, ocorrido em 1988, é um filme simultaneamente duro e sensível, que recusa ceder às armadilhas do melodrama de puxar-a-lágrima mas que não deixa por isso de despoletar um forte impacto emocional, recorrendo a uma impressionante secura e contenção dramática.

Assentando num discreto trabalho de realização, com a câmara agarrada às quatro crianças, "Ninguém Sabe" gera uma atmosfera realista e contemplativa, vincada por silêncios capazes de emanar toda a melancolia que atravessa os muitos dias em que os protagonistas têm de sobreviver sozinhos.

Akira, o irmão mais velho, assume a responsabilidade de coordenar e gerir as tarefas da melhor forma que pode, algo que já fazia, de resto, mesmo quando a sua mãe estava presente, mas quando o dinheiro começa a escassear o apartamento torna-se num espaço cada vez mais inabitável.

Contudo, não obstante as crescentes dificuldades, o jovem quarteto mantém sempre uma surpreendente união, e a cumplicidade que liga as quatro personagens é determinante para que a angústia e o desencanto não se tornem ainda mais desesperantes.

Kore-eda capta este cenário de forma quase documental, com uma sobriedade que percorre todo o filme, mas o ritmo apaziguado da narrativa e certas sequências por vezes repetitivas fazem com que "Ninguém Sabe" nem sempre apresente a intensidade que se esperaria.

Há belíssimos momentos, como aquele em que as crianças saem de casa juntas pela primeira vez e exploram o bairro, evidenciando uma alegria e entusiasmo irresistíveis, contudo o filme é demasiado longo e disperso, com algumas cenas redundantes onde a inércia domina não só as personagens mas também o espectador.

A duração excessiva e algumas cenas cansativas não impedem, no entanto, que "Ninguém Sabe" seja uma recomendável experiência cinematográfica, abordando com seriedade uma situação difícil e apresentando quatro pequenos grandes actores que cativam pela espontaneidade e verosimilhança. Deixam, sim, a sensação de que o filme, sendo suficientemente memorável, poderia ter ido mais longe.
E O VEREDICTO É: 3,5/5 - BOM

19 comentários:

Joana C. disse...

É um filme muito comovedor, muito terno. É daqueles filmes muito simples mas que nos tocam, pelo menos a mim comoveu-me muito.

Anónimo disse...

Ainda não tinha ouvido falar deste filme :|...Acho que vai ficar para DVD.

Abraço!

gonn1000 disse...

Joana C.: Sem dúvida, não merece passar despercebiodo. Pena só ter estreado numa sala, mas enfim...

Mário Lopes: O quê??? Vai já vê-lo ao King antes que saia!!! (aproveitas e compras bilhetes para o Indie) :P

Anónimo disse...

LOL, sim talvez faça isso mesmo :).

A propósito, uma pequena pergunta sobre o Indie: os bilhetes para uma sessão no Forúm Lisboa podem-se comprar (por exemplo) no King?
É que o ano passado vi os filmes todos no King e fiquei sem saber como é :|...

Abraço e continuação de um bom trabalho.

gonn1000 disse...

Acho que não, os bilhetes têm de ser comprados no local onde se situa a sala de cinema. Pelo menos no ano passado foi assim...
Boa sorte para escolheres o que vais ver, porque para mim está a ser difícil :S

Nic disse...

Vou repetir aqui porque acho que faltou uma referencia merecida ao actor principal:

Excelente interpretacao de Yuuga Yagira (na altura com apenas 14 anos) reagiu ao premio atribuido no Festival de Cinema de Cannes - 2004, com uma humildade exemplar:
“Estou muito feliz mas pergunto-me se estara certo receber um premio tao grande, so’ representei o meu papel de acordo com as instrucoes do director”

gonn1000 disse...

Já tinha lido isso, mas obrigado de qualquer forma. Acho que os outros actores não foram piores do que ele, embora tivessem menos destaque.

mr pavement disse...

vou ver se vejo.

gonn1000 disse...

Tenta fazê-lo porque o filme merece o esforço.

Francisco Mendes disse...

Ora bolas!
Este filme que ansiava há muito tempo não estreou numa única sala portuense. Isto é revoltante!
Se não recorremos à «pirataria» como poderemos saciar a nossa curiosidade cinéfila?

gonn1000 disse...

E mesmo em Lisboa só estreou numa sala. Se não pudesse vê-lo lá recorreria à pirataria, e de consciência tranquila.

Anónimo disse...

francisco: exactamente... foi o que fiz :-)

gonn1000 disse...

Não te censuro, pode ser que da próxima se lembrem de colocar o filme em mais salas :)

Anónimo disse...

Este é sem dúvida um dos melhores filmes de 2004! Kore-eda com o seu habitual estilo pausado, trata de um tema que lhe é bastante caro e depois do fantastico "After Life" consegue aqui outro filme altamente recomendável!

Quanto ao "pequeno grande" Yuga Yagira, com este excelente desempenho, parece ter talento para, quem sabe, ser o próximo Asano!

gonn1000 disse...

Foi o primeiro filme do Kore-eda que vi, mas deixou-me curioso quanto à restante obra dele. E sim, o actor parece ter futuro.

Anónimo disse...

comprei-o por 10 euros e não o vendia por 50.

gonn1000 disse...

Por 10 euros foi boa compra :)

Anónimo disse...

Gostaria de saber de fato o que aconteceu com as crianças depois da descoberta. Alguém sabe?

gonn1000 disse...

Acho que "ninguém sabe"...