Um dos nomes mais elogiados da literatura norte-americana recente, Paul Auster tem consolidado um percurso que extravasa já domínios da literários,através da escrita de argumentos para cinema (como o de “Smoke”, de Wayne Wang) e mesmo experiências na realização (“Lulu on the Bridge”).
“A Trilogia de Nova Iorque” (The New York Trilogy), o seu primeiro livro, editado originalmente em 1985, é um dos seus trabalhos mais aclamados e emblemáticos, reunindo três contos – “Cidade de Vidro”, “Fantasmas” e “O Quarto Fechado à Chave” – que em comum têm enredos baseados nos cânones do policial, mas que não se esgotam numa simples resolução de mistérios, pois são utilizados como ponto de partida para uma reflexão acerca da solidão, efemeridade, tensão, frustração e precariedade das relações humanas nos centros urbanos contemporâneos, em particular as dos ambientes nova-iorquinos, onde a acção decorre.
No primeiro conto, “Cidade de Vidro”, Quinn, um escritor de romances policiais, recebe um telefonema de alguém que procura pelo detective privado Paul Auster e de imediato assume a identidade deste, aceitando a missão de procurar e seguir um homem mentalmente desequilibrado de modo a proteger outro.
No segundo, a premissa é semelhante, e a acção centra-se na mais recente tarefa de Blue, um detective contratado para seguir Black, iniciando uma investigação ainda mais densa e atípica do que a do conto anterior.
No terceiro e último conto, o narrador/ protagonista é procurado pela esposa de um amigo de infância desaparecido que lhe pede para avaliar uma série de textos escritos por este, originando uma viagem por memórias e eventos que marcaram o seu passado e que delimitarão o seu futuro.
Recorrendo a uma narrativa labiríntica e apresentando um conjunto de personagens enigmáticas à beira do colapso, “A Trilogia de Nova Iorque” tem tanto de intrigante e ambicioso quanto de confuso e monótono, uma vez que, embora os seus três contos comecem de forma relativamente entusiasmante, o desenvolvimento e, sobretudo, o desenlace não são muito bem resolvidos, tornando o livro numa obra com momentos inspirados e um igual número de episódios insípidos.
“O Quarto Fechado à Chave” é a excepção, pois contrariamente aos anteriores não é prejudicado por uma teia de acontecimentos supostamente complexos mas que acabam por se tornar inconsequentes e repetitivos. Interessante olhar sobre a escrita, a amizade, o orgulho e a arte, consegue ainda abordar de forma criativa a dualidade e a identidade, temáticas também exploradas em “Cidade de Vidro” e “Fantasmas” mas sem a mesma densidade dramática.
Baralhando as fronteiras entre a realidade e a ficção ou a sanidade e a loucura, “A Trilogia de Nova Iorque” é um livro interessante, que atesta o talento de Auster enquanto observador das angústias do quotidiano e das vias que conduzem à alienação, mas infelizmente a dispersão narrativa e os tons demasiado abstractos e etéreos dos dois primeiros contos tornam-no numa obra que, embora brilhante a espaços, raramente se afasta de uma segura, mas pouco satisfatória mediania.
E O VEREDICTO É: 2,5/5 - RAZOÁVEL
14 comentários:
Percebo o que dizes quando te referes a uma certa inconsequência. Quando acabei de ler esse livro atirei-o ao chão irritado por faltar qualquer coisa. Mais a frio não senti essa falta e adorei o livro pelo mistério, as personagens, o espaço e o estilo de Auster que faz tudo isso funcionar. Aí 7 ou 8 em 10 (toma la um rating).
Também tive vontade de o atirar ao chão em certos momentos, mas o terceiro conto acabou por me reconciliar parcialmente com o livro. 7 ou 8??? No way!!!
nem sei o que diga... o livro é muito bom, as trÊs histórias no final fazem uma história, bastante complexa, com dados autobiográficos... este livro é muito bom, e fez com que comprasse uma resma de livros dele...
É um autor ao qual pretendo dar muita atenção no futuro, depois de despachar muito livro que tenho. E já tenho o "Pensei que o Meu Pai era Deus" para o baptismo, embora seja/não seja dele.
Continuação de boas leituras
PS: Esse do Pat Mackgrath ainda não li, mas já li dele o Spider - A Teia da Loucura que originou o filme do Cronenberg(que ainda não vi). É um bom livro, requer atenção, mas espero que o filme seja ainda melhor.
Lilystrange: Enfim, eu não achei assim tão bom, mas já li pior...
Turat Bartoli: Não li o "Spider" nem vi o filme. "A Casa da Loucura" (Asylum)foi recentemente adaptado para cinema por David Mackenzie, o realizador do (competente) "Young Adam" e deverá estrear em breve entre nós.
Eu senti vontade de não continuar no inicio, achei um livro muito paranóico e que não levava a lado nenhum nas primeira folhas. Mas tudo mudou quando comecei a entrar naquela paranóia, faz impressão como, de facto, existem pessoas assim na nossa sociedade, e é ao mesmo tempo cativante saber que existem... não sei bem porquê, fascina-me. Depois voltei a sentir alguma irritação para o meio e no final voltei a gostar mais.
Mesmo assim não me deslumbrou como, por exemplo, o Admirável Mundo Novo.
JT
Pois, é um livro inconsistente, com muitos altos e baixos. Lê-se, mas não é especialmente marcante...
As personagens não me disseram muito, talvez por isso tenha gostado pouco do livro.
"inconsistente, com muitos altos e baixos"
"razoável?"
Chegaram a perceber o livro?
Se achas que não, poderias dizer-nos qual a tua versão...
O livro é brilhante (no mínimo), escolhi-o para ler durante a minha recente visita a NY, e criou um panorama de fundo que tornou a minha experiência inesquecível... isso and all that jazz :)
Ok, posso tentar lê-lo novamente quando for a NY :P
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Adorei o suspense, a metaforização, a inteligência com que foi escrito, a filosofia do livro e os finais em aberto, deixando o leitor a pensar no livro depois de o ler.
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