quinta-feira, agosto 30, 2007

10 BLOGUES, 5 FILMES, 1 REALIZADOR

A habitual tabela organizada pelo Knoxville, desta vez relativa a algumas das estreias de Agosto. Elegi "Reservoir Dogs" como o melhor Tarantino, mas não ponho as mãos no fogo pela escolha, até porque para estar seguro dela precisava de rever este e outros filmes dele. Já no pior não hesitaria, acho que é mesmo "Kill Bill".

quarta-feira, agosto 29, 2007

PERSEGUIDOS PELO PASSADO

Gregg Araki está longe de ser um principiante na realização, pois "Mysterious Skin" é já a sua oitava obra. No entanto, é a primeira a estrear por cá, facto que não deixa de gerar alguma estupefacção tendo em conta que a ele se atribuem, desde há mais de uma década, algumas das mais idiossincráticas e ousadas pespectivas da adolescência oriundas do cinema norte-americano recente. Mesmo este filme já estreou nos EUA em 2004, mas neste caso vale a pena realçar que mais vale tarde do que nunca, ou não fosse um dos mais estimulantes a chegar ao grande ecrã neste Verão, entrando directamente para a lista de títulos indispensáveis do ano.

Inspirado no livro homónimo de Scott Heim, debruça-se sobre as vidas de dois rapazes de 18 anos, cuja personalidade e estilos de vida dificilmente poderiam ser mais distintos, ainda que os factores que os determinam derivem muito de uma situação que os reuniu quando eram ainda crianças.

Se Neil é irreverente, provocador, arrogante e não hesita em enveredar por rumos sinuosos, Brian é tímido, recatado, responsável e cauteloso, dedicando grande parte do seu dia-a-dia a um hobby que ameaça tornar-se numa obsessão, uma vez que a sua pesquisa sobre temas relacionados com extra-terrestres deriva do facto de julgar ter sido raptado por estes na infância.
Contudo, à medida que vai acumulando informações, Brian conclui que as respostas que procura poderão estar em Neil, que entretanto partiu da pequena cidade-natal de ambos, no interior, para uma aventura em Nova Iorque onde se dedica à prostituição (actividade que já explorava ocasionalmente e que aí se revela monetariamente mais compensadora).

Drama alicerçado nas fronteiras entre a infância e a adolescência e entre esta e a idade adulta, "Mysterious Skin" não teme incidir em vários temas "difíceis" e "controversos", da pedofilia à homossexualidade passando pela prostituição masculina, e o que mais surpreende é o facto de conseguir abordar todos eles com um invejável equilíbrio entre sensibilidade e complexidade. Ao contrário do que ocorreu no seu trabalho anterior, o curioso mas irregular "Esplendor", aqui Araki atinge uma coesão que torna o filme num objecto cinematográfico superior, onde o estilo não anula a substância, antes a sublinha.

O elenco está longe de incluir uma colecção de nomes muito mediáticos, em compensação emana talento em todas as interpretações. Joseph Gordon-Levitt, o elemento mais novo da série televisiva "Terceiro Calhau a Contar do Sol", apresenta um desempenho irrepreensível, nos antípodas de uma marioneta de sitcoms, traduzindo de forma verosímil a muralha emocional que protege Neil.
Mantendo a postura circunspecta que já tinha convencido em "Brick", o aplaudido thriller indie de Rian Johnson, o actor não só aceitou os riscos de uma personagem tão obscura como se revelou uma aposta mais do que segura para a encarnar. Brady Corbet, ainda que não tão impressionante, evidencia-se também como um credível co-protagonista, e as presenças da igualmente promissora Michelle Trachtenberg ou da bem-regressada (e muito pouco vista) Elisabeth Shue comprovam que Araki é um atento director de actores.

Não menos apurada é a escolha da banda-sonora, com composições instrumentais a cargo de Harold Budd e Robin Guthrie (dos Cocteau Twins) e canções dos shoegazers Ride, Slowdive ou Curve (afinal ainda há quem se vá lembrando deles), que não só se adequam ao período temporal onde decorre a maior parte da acção (inícios dos anos 90) como ao ambiente algo etéreo que domina algumas sequências.

Neste aspecto, a realização merece também elogios, edificando uma atmosfera realista que não recusa uma pontual carga onírica, interligando uma crueza por vezes difícil de digerir com cenas de poesia visual sem um grama de presunção. O impacto emocional que daí resulta faz de "Mysterious Skin" um filme a reter, indo do sinistro ao acolhedor sem falhar no ritmo ou no tom, ainda que nos minutos finais se dispensassem algumas revelações que o argumento já havia sugerido.

Tirando estes escassos minutos, Araki demonstra aqui uma discrição a milhas do habitualmente comparado Larry Clark ("Kids - Miúdos", "Bully - Estranhas Amizades"), que com estes temas provavelmente não conseguiria ser menos do que escabroso, e aposta antes em domínios mais próximos dos de um Michael Cuesta, que no também estimável "L.I.E. - Sem Saída" contornou muitas armadilhas no retrato da pedofilia.
Espera-se que "Mysterious Skin" seja capaz de contornar uma ainda maior, a de estrear de forma quase incógnita no meio de tantos blockbusters de Verão, pois tirando os igualmente belos "Pecados Íntimos", de Todd Field, e "Half Nelson - Encurralados", de Ryan Fleck, este ano não chegou cá mais nenhum filme deste calibre.

E O VEREDICTO É: 4/5 - MUITO BOM

terça-feira, agosto 28, 2007

SOZINHO EM CASA

“Paranóia” (Disturbia) tinha, à partida, dois elementos pouco promissores a jogar contra si: o primeiro, ser descrito por muitos como uma versão light e teen de “Janela Indiscreta”, de Alfred Hitchcock; o segundo, ser realizado por D.J. Caruso, tarefeiro cuja filmografia inclui títulos genéricos como “Tirar Vidas” ou “Aposta de Risco”.

E no entanto, apesar dessas condicionantes, o filme não só resulta como é uma das melhores surpresas de um Verão pobre em blockbusters memoráveis, apresentando um ritmo e uma energia que, ficando longe de revolucionários, são pelo menos mais aliciantes do que grande parte das alternativas do género em cartaz.

“Paranóia” centra-se na rotina diária de Kale, um adolescente de dezassete anos que é condenado a três meses de prisão domiciliária por agredir um professor (fruto de um acesso de raiva provocado pela morte recente do pai). Obrigado a usar uma pulseira electrónica que praticamente o impede de ir mais longe do que o seu jardim, o protagonista fica entregue ao tédio que se acentua quando a mãe o impossibilita de aceder a serviços tão essenciais como o i-tunes ou a Xbox, o que o leva a procurar outras formas de entretenimento, com especial destaque para a observação dos vizinhos.

Se inicialmente o que Kale espia se resumea situações mais ou menos prosaicas, de onde se evidenciam os mergulhos na piscina de Ashley, a nova e atraente girl next door, aos poucos vai crescendo a desconfiança em relação ao que outro recém-chegado vizinho, Mr. Turner, esconde na sua garagem, e às actividades que decorrem em sua casa.
À medida que vai juntando pistas, Kale reforça a suspeita de que este é um serial killer procurado pela polícia, e embora consiga fazer com que o seu melhor amigo e até mesmo a idolatrada Ashley o ajudem na procura de respostas acerca dessa desconfiança, as suas investigações apenas lhe trazem mais problemas e alastram a sua fama de “jovem problemático”, levando a que seja encarado pela polícia e vizinhos como alguém à beira da paranóia.

Caruso divide o filme em duas partes distintas cuja união não resulta forçada, dando à primeira um tom ligeiro e espirituoso e trabalhando na segunda atmosferas mais densas e sinuosas. Ambas convencem, já que a aliança entre comédia e suspense surge de forma natural e não causa solavancos na narrativa, ainda que o realizador seja um pouco comedido nos sustos que tenta gerar, pois “Paranóia” não perderia nada se a atmosfera que o domina na segunda parte fosse mais negra e sufocante.
Mesmo assim, o que proporciona é satisfatório, sobretudo nos momentos em que emprega as novas tecnologias no atribulado processo de investigação dos três jovens voyeurs, sendo curioso atentar à forma como este cruza computadores, handycams, telemóveis e os tradicionais binóculos.

O elenco também ajuda, em especial a prestação de Shia LaBeouf, que já tinha sido um dos pontos fortes de “Transformers” e aqui volta a brilhar, e ainda que não haja grandes diferenças no registo adoptado o jovem actor dá mais um passo no caminho que parece levá-lo a tornar-se num dos mais valiosos novos talentos de Hollywood. David Morse, na pele do antagonista, compensa o pouco tempo em cena com uma interpretação apropriadamente sorumbática, e a sua presença arrepiante quase faz esquecer que a sua personagem não tem muita espessura. Carrie-Anne Moss exibe a segurança e elegância habituais e Sarah Roemer e Aaron Yoo são competentes, mesmo que sem desempenhos dignos de registo.

Vincado por uma assinalável eficácia industrial, “Paranóia” pode não ser um grande filme mas pelo menos também não envergonha ninguém, destacando-se como um entretenimento escorreito e inteligente q.b., combinação que vai sendo cada vez mais difícil de encontrar e que D.J. Caruso, desta vez, conseguiu atingir.

E O VEREDICTO É: 3/5 - BOM

segunda-feira, agosto 27, 2007

O QUE É NACIONAL É BOM?

Ao longo desta semana, a programação nocturna da RTP2 inclui alguns títulos do cinema português recente, quase a fazer lembrar os antigos ciclos "5 Noites, 5 Filmes". Assim, hoje é exibido "Daqui p´rá Alegria" (na foto), de Jeanne Waltz (cujo mais recente "Pas Douce" foi dos mais elogiados no último IndieLisboa); amanhã "A Janela", de Edgar Pêra; na quarta "Sem Ela", de Anna de Palma; quinta "Mal", de Alberto Seixas Santos; e sexta "Vai e Vem", de João César Monteiro.

Destes só vi "Mal", do qual não gostei, mas surge aqui uma boa oportunidade para (re)ver alguns filmes difíceis de encontrar. De hoje a sexta, com início entre as 23h30 e a meia-noite, mesmo antes da série "A Letra 'L'".

IRMÃS INSEPARÁVEIS

São duas irmãs gémeas e “The Con” é já o seu quinto disco, a mais recente proposta de uma carreira que há uma década as inscreveu na lista de promessas indie e que agora as aproxima mais de uma confirmação. Pelo menos a julgar pela maturidade que Tegan and Sara exibem em alguns momentos do álbum, consolidando traços de personalidade(s) de uma escrita a quatro mãos onde se evidenciam diferenças nos temas compostos por cada uma das manas Quin mas não tão díspares ao ponto de ameaçar a coesão do disco.

“The Con” é mais um testemunho de como boa parte do rock recomendável que tem surgido nos últimos anos provém de origens canadianas, e mesmo que não seja das obras mais marcantes oriundas desses domínios exibe consistência e interesse suficientes para não merecer passar despercebido.
Dominado por canções curtas – nenhuma vai além dos quatro minutos -, directas e quase sempre imediatas, o álbum dá continuidade ao misto de indie e power pop que já havia sido trabalhado pelas cantoras/compositoras nos registos anteriores, introduzindo-lhe pontuais contaminações folk e new wave.

O cruzamento de géneros nem sempre é bem conseguido, ainda que também não haja falhanços graves a assinalar, até porque a brevidade da duração das canções impede que os momentos menos entusiasmantes se prolonguem. Estes devem-se sobretudo aos temas compostos por Tegan, geralmente os mais upbeat e orelhudos mas por vezes aproximando-se excessivamente de territórios emo e ancorando-se em estruturas mais formatadas e radiofriendly (como no escorregão de “Hop a Plane”).

Catorze canções, embora curtas, é que acabam por ser um pouco demais, sobretudo porque as letras são monotemáticas, insistindo na pouco surpreendente temática do fim das relações. Felizmente, algumas destas são das mais cativantes pérolas indie do ano, caso do single “Back in Your Head”, deliciosa fusão entre uma melodia assente em teclados e voz agridoce, ou dos momentos mais apaziguados da recta final do disco, onde o tom confessional é reforçado e origina belos e lúcidos relatos amorosos como “Call It Off”, uma muito apropriada escolha para tema final. Pelo meio há frases que ficam, como “I felt you in my legs before I ever met you”, em “Nineteen”, mergulho nas recordações de um longínquo one night stand que a memória não quer apagar.

“The Con” convence também pela produção precisa de Cristopher Walla, dos Death Cab For Cutie - não por acaso, o disco partilha algumas atmosferas com “Plans -, capaz de dosear eficazmente elementos eléctricos e acústicos, já que a paleta sonora vai dos sintetizadores a la The Killers da faixa-título ao despojamento de “Floorplan”. E mesmo que assim não fosse, teria sempre a seu favor as acolhedoras vozes das suas autoras, algures entre uma Karen O mais serena (fase “Show Your Bones”, portanto) e uma Emily Haines (dos Metric) mais frágil, duas boas portas de entrada para um projecto que vale por si.

E O VEREDICTO É: 3/5 - BOM


Tegan and Sara - "Back in Your Head"

sexta-feira, agosto 24, 2007

MILAGRES PRECISAM-SE

Steve Carrell é um dos nomes que se tem distinguido na comédia norte-americana recente, acumulando elogios tanto do público como da crítica ao longo de uma carreira que tem ganho consistência em filmes como "Virgem aos 40 Anos", "Uma Família à Beira de um Ataque de Nervos" ou a versão americana da série "The Office".

"Evan, O Todo-Poderoso" (Evan Almighty), contudo, é um dos títulos em que o seu talento surge mais desaproveitado, mal empregue numa comédia com raros (ou mesmo nulos) momentos de humor conseguido e assente num argumento tosco e preguiçoso. Pegando nos pressupostos de "Bruce, O Todo-Poderoso", protagonizado por Jim Carrey, Tom Shadyac conta aqui uma nova versão da parábola bíblica da Arca de Noé, sendo que agora o papel de construtor da mesma cabe a Evan, um congressista recém-eleito que, após mudar com a família para uma casa luxuosa, percebe que os seus novos desafios profissionais serão os menos problemáticos com que se irá deparar.

Inicialmente o protagonista não leva a sério a missão que lhe é incumbida por Deus, com quem vai dialogando em várias ocasiões inesperadas e cuja identidade coloca em causa, mas aos poucos vai verificando que as suas recomendações não só fazem sentido como devem ser cautelosamente seguidas. Por isso, à medida que vários casais de diversas espécies de animais começam a instalar-se perto da sua casa, Evan decide começar a construir a Arca, tarefa que o coloca no epicentro de um considerável aparato mediático e de uma não menos densa crise familiar e profissional.

"Evan, O Todo-Poderoso" é vendido como uma comédia embora não passe de uma inconsequente lição de moral onde a subtileza e a complexidade não marcam presença, investindo num tom ligeiro durante parte da sua duração e tornando-se mais constrangedor quando adopta um tom sério e despropositado. Os gags ora investem num slapstick infantil e forçado ora em one liners de pouca graça, e chega a ser penoso aguentar tantas doses de tropeções, embaraços e escatologia servidos sem qualquer sentido de timing cómico.
As personagens já seriam fracas para uma sitcom indistinta, e limitam-se a passear de cena em cena sem que ganhem qualquer espessura, sendo pouco mais do que cabeças falantes. É certo que há um esforço para que o protagonista ganhe alguma densidade, mas à custa de uma débil gestão da carga dramática, derrapando num sentimentalismo incómodo e enjoativo. Pior estão os seus três filhos, que não chegam a ganhar qualquer personalidade ou função, e o antagonista é um concentrado de lugares comuns na caracterização de políticos fraudulentos.

Shadyac nunca decide se se dirige a crianças ou adultos, oferecendo uma falhada comédia familiar que não merecia os competentes efeitos especiais nem alguns bons actores - além de Carrell, há Morgan Freeman na pele de Deus ou a discreta Lauren Graham como esposa do protagonista, que passa o filme sem ter o que fazer. Nada muito inesperado considerando a filmografia do realizador, que entre outros títulos pouco memoráveis inclui "Patch Adams", "O Professor Chanfrado" ou "O Mentiroso Compulsivo".
Com tantos bons filmes que chegam a Portugal só em DVD (quando chegam), "Evan, O Todo-Poderoso" tem honras de estreia mas está a um nível qualitativo tão raso como os mais anódinos subprodutos que invadem a programação televisiva aos fins-de-semana à tarde. Mais vale, assim, apanhá-lo por lá daqui a uns tempos (se tiver mesmo que ser), uma vez que até os fãs mais acérrimos do actor principal correrão o risco de saírem desiludidos depois de o verem descer tanto a fasquia. É que Evan, apesar de ser Todo Poderoso, não consegue fazer milagres, embora o filme precisasse muito de um.

E O VEREDICTO É: 1/5 - DISPENSÁVEL

quinta-feira, agosto 23, 2007

ESTREIA DA SEMANA: "MYSTERIOUS SKIN"

O filme é de 2004, mas só agora chega cá... Felizmente, mesmo atrasado, não deixa de ser um dos mais surpreendentes que poderemos ver este ano em salas nacionais. "Mysterious Skin" é a mais recente obra de Gregg Araki, o realizador de "Doom Generation" ou "Splendor", que volta a abordar a adolescência e a sexualidade de forma singular e com resultados brilhantes. O elenco é liderado por Joseph Gordon-Levitt, irritante na sitcom "Terceiro Calhau a Contar do Sol", intrigante em "Brick" e aqui próximo da excelência. A banda-sonora inclui Curve, Ride ou Slowdive entre outros nomes de delírio shoegazer e o argumento e realização estão ao mesmo nível. Tudo junto faz deste o melhor filme a estrear por estes lados neste Verão. Muito bom.


Outras estreias:

"A Face Oculta de Mr. Brooks", de Bruce A. Evans
"Licença para Casar", de Ken Kwapis
"Turistas", de John Stockwell




Trailer de "Mysterious Skin"

segunda-feira, agosto 20, 2007

ELAS ESTÃO DE VOLTA

Regressa hoje à RTP2 "A Letra 'L'" (The 'L' Word), série que retrata o dia-a-dia de um grupo de amigas lésbicas de Los Angeles. A segunda temporada será reexibida de segunda a sexta pelas 00h45, e em breve estreará por cá a terceira, que segundo consta acentua - e muito - a carga dramática já evidente na antecessora. Para ver ou rever, pelo menos quem conseguir suportar o horário algo tardio das emissões.
Hoje na 2 passa ainda a também recomendável "Erva" (Weeds), pelas 22h40. Ainda vai havendo serviço público, apesar de tudo...

Além do bom elenco e argumento, um dos pontos fortes de "A Letra 'L'" é a banda-sonora, que entre outros inclui temas das saudosas The Organ, que chegaram a actuar num episódio. Aqui fica a canção em causa:


The Organ - "Brother"

A GRANDE MENTIRA

"Golpe Quase Perfeito" (The Hoax) baseia-se num fait divers do mundo literário, ocorrido em 1971, quando um escritor pouco mediático e reputado, Clifford Irving, alcançou alguma fama ao conseguir o acesso a depoimentos de Howard Hughes, aproveitando-os para escrever uma biografia sobre a lenda da aviação. Foi considerado um contacto quase milagroso, já que o bilionário adoptou, nesse período, uma postura recolhida e avessa a aparições públicas, pelo que as reuniões com Irving constituiram uma surpreendente excepção.
Ou nem por isso, já que veio a comprovar-se que as supostas conversas registadas pelo escritor não passavam de um engodo criado e alimentado pelo próprio, uma grande mentira consecutivamente forjada e muitas vezes alterada ou adaptada, à medida que iam surgindo suspeitas ou mesmo factos que a contrariavam.

O filme segue todo este processo, desde as deambulações iniciais de Irving até aos seus 15 minutos de fama, mergulhando no fascínio que encorajou esse jogo de enganos e, sobretudo, no que daí resultou, assim como no estado de medo e paranóia que acabou por dominar o seu quotidiano.

Lasse Hallström desenvolve esta história com eficácia, injectando-lhe doses moderadas de suspense, drama e humor e assegurando uma narrativa bem conduzida, mesmo que quase sempre linear. Ainda não é desta que comprova, contudo, ser um realizador especialmente interessante, pois se "Golpe Quase Perfeito" é um objecto correcto também não arrisca muito, limitando-se a cumprir razoavelmente o seu programa sem conter uma perspectiva mais pessoal que se destaque ou uma ideia de cinema que fique na memória.

O filme transpira profissionalismo, é certo, desde a sólida reconstituição de época - com uma impecável atenção ao vestuário, penteados e demais pormenores visuais - à não menos consistente direcção de actores - Richard Gere não desaponta na pele do protagonista, embora não mostre qualidades interpretativas marcantes; Alfred Molina convence como o seu inseguro e fiel melhor amigo; Hope Davis só não faz melhor porque a sua personagem carece de desenvolvimento.
Menos entusiasmante é o facto de pretender ser um denso estudo de personagens quando raramente consegue superar uma mediania industrial de bons valores de produção e elenco de luxo - onde figuram ainda Stanley Tucci, Marcia Gay Harden ou Julie Delpy, sem muitas oportunidades para demonstrarem o seu talento.
O retrato da vertente inebriante da mentira, da sede de fama e reconhecimento está lá mas nunca envereda por domínios muito arrojados, o que juntamente com uma duração algo excessiva (o filme poderia apenas ter hora e meia em vez das quase duas) torna "Golpe Quase Perfeito" numa obra tão promissora e interessante como pouco aliciante e memorável.


E O VEREDICTO É: 2,5/5 - RAZOÁVEL

sábado, agosto 18, 2007

domingo, agosto 12, 2007

BE RIGHT BACK

Vou só ali a Paredes de Coura e já volto. Se quiserem ver o que andarei a fazer, passem por aqui. Até já ou até lá, e entretanto os Sonic Youth e os Crystal Castles, dois nomes do cartaz do festival, vão animando o blog:



Crystal Castles -"Air War"

sexta-feira, agosto 10, 2007

A FEBRE AMARELA, VINTE ANOS DEPOIS

Tudo começou em 1987, quando Matt Groening e James L. Brooks criaram curtas de animação de trinta segundos sobre uma peculiar família norte-americana, emitidas em "The Tracey Ullman Show". Três anos mais tarde, o crescente sucesso de Homer, Marge, Bart, Lisa e Maggie levou a que os Simpsons ganhassem a sua própria série televisiva, dando incício a um fenómeno que se alastrou da América para o mundo e fez não só destas cinco personagens mas dos restantes habitantes amarelos de Springfield ícones incontornáveis da cultura pop recente.

Dezoito temporadas e vinte anos depois, a série mantém o carisma e contribuiu para que surgissem múltiplas concorrentes que não escondem a sua influência, reforçando o seu papel de autêntica pedrada no charco no panorama televisivo das últimas décadas. O motivo? Ser uma proposta de animação capaz de agradar a um público infantil sendo contudo susceptível de segundas leituras que apelam a uma faixa adulta, fruto de um humor versátil, corrosivo e sempre actual.

Há muito falado mas também adiado, o filme chegou finalmente ao grande ecrã e diferenciou-se logo por uma campanha promocional atípica e imaginativa. Do acordo com as lojas Seven Eleven, que as transformou em Kwik-E-Mart com produtos presentes na série; ao site oficial, onde é possível criar uma réplica simpson à imagem do utilizador; ou no desenho de Homer no sul de Inglaterra, ao lado do Gigante de Cerne Abbas; o marketing foi certeiro no aguçar dos apetites para a primeira longa-metragem centrada na popular família. Apetites e também expectativas, que não eram poucas dadas as duas décadas de espera que os muitos fãs tiveram que suportar para verem os habitantes de Springfield no cinema.

"Os Simpsons: O Filme" (The Simpsons Movie) não está à altura da genial campanha promocional que o antecedeu, mas encontra-se igualmente longe de ser um trabalho que desiluda, já que contém os atributos que fizeram da série uma referência: personagens fortes e gags que conseguem um equilíbrio perfeito entre ligeireza e contundência, disparando críticas à conjuntura política, social e ambiental recente.

A escrita preserva a inteligência e acessibilidade habituais, e a equipa conseguiu fazer com que estes 90 minutos fossem um pouco mais do que um mero episódio longo, inserindo na narrativa alguns pormenores curiosos relacionados com essa diferença de formatos. Estes, assim como a qualidade reforçada da animação digital, permitem que o filme resulte numa experiência singular q.b., já que no argumento não se encontram grandes elementos que justificassem uma longa-metragem.
O ponto de partida é a fuga dos Simpsons de Springfield, após a cidade ter sido envolta por uma indestrutível redoma gigante e condenada à destruição devido a um incidente gerado por Homer, que aumentou os seus níveis de poluição. Embora mudem de residência para o Alaska, os cinco elementos da família regressam a casa na tentativa de salvar a população, tarefa que se avizinha árdua quando os adversários são os serviços secretos dos EUA.

O que se conta em "Os Simpsons: O Filme" não é nada que não coubesse nos trinta minutos semanais, mas a película tem fôlego suficiente para entreter e suscitar alguma reflexão enquanto dura, ganhando ainda pela densidade emocional na abordagem à importância da família.

O argumento não é especialmente surpreendente, embora também nem precise, pois a sua desenvoltura e eficácia fornecem o ritmo adequado para que se embarque sem medos nesta aventura, onde vários sorrisos vão sendo garantidos à medida que os protagonistas tentam salvar a sua cidade-natal.
Talvez fosse desnecessário um enfoque tão forte em Homer, já que a personagem acaba por eclipsar as restantes, assumindo-se como o centro dos acontecimentos e deixando-as entregues a enredos secundários e pouco desenvolvidos (como o do namoro de Lisa com o ambientalista Colin). Mesmo assim, todos os elementos da família Simpson têm espaço para brilhar, o que já não ocorre tanto com os restantes habitantes de Springfield, a que não é alheio o facto de grande parte da acção decorrer fora da cidade - de qualquer forma, seria difícil dar algum tempo de antena a todos eles, dada a vasta galeria criada na série.

Não acrescentando muito ao universo da criação de Matt Groening - tirando, claro, presença do porco de Homer e respectivos alter-egos -, "Os Simpsons: O Filme" é contudo uma comédia de animação conseguida e uma das mais recomendáveis do ano, conduzida com solidez por David Silverman, que se estreia na realização de longas-metragens a solo depois da colaboração em "Monstros e Companhia". E é também uma daquelas a ver mesmo do princípio ao fim, uma vez que entre as pequenas surpresas incluídas durante os créditos consta a primeira palavra dita por Maggie (e esta, de facto, só faria sentido num filme).
Uma boa forma de celebrar os vinte anos da família amarela mais famosa do mundo, que a julgar pelo que aqui se apresenta tem vitalidade para durar muitos outros.

E O VEREDICTO É: 3,5/5 - BOM

quinta-feira, agosto 09, 2007

ESTREIA DA SEMANA: "THE HOST - A CRIATURA"

Monster movie com aura de culto, "The Host - A Criatura" (Gwoemul) é um dos títulos recentes do cinema coreano que tem gerado algum burburinho, contando com um bom acolhimento em Cannes e por onde mais tem passado. Entre sustos e risos, o filme segue a onda de terror gerada por uma gigantesca criatura assassina e a estratégia dos que tentam impedi-la se não forem devorados entretanto. Fica a sugestão, bom apetite.

Outras estreias:

"Evan, O Todo Poderoso", de Tom Shadyac (CUIDADO: é um dos piores filmes do ano)
"Muito Bem, Obrigado", de Emmanuelle Cuau


Trailer de "The Host - A Criatura"

quarta-feira, agosto 08, 2007

FESTA A MEIO GÁS

Mika fez-se notar através de “Grace Kelly”, single que tomou de assalto rádios e televisões com uma atitute pop ostensiva e desavergonhada, tanto pelas piruetas vocais do cantor como pela melodia que não escondia a descendência de Freddie Mercury ou Elton John. É uma daquelas canções que, goste-se ou odeie-se (e é bem capaz de gerar reacções díspares), insiste em não sair da cabeça tão cedo, característica presente em muitas outras de “Life in Cartoon Motion”, álbum de estreia do jovem cantor e compositor anglo-libanês.

O disco segue a tendência garrida desse cartão de apresentação, apostando numa pop imediata e eficaz, embora geralmente mais banal do que inventiva, onde a preocupação parece ser evidenciar a produção limpinha, a voz do cantor e não tanto as suas capacidades na composição.
O imaginário fantasioso, delirante e criativo sugerido pela apelativa capa raramente ganha forma, ainda que se encontrem aqui dois ou três momentos promissores. “Love Today”, solarengo hino ao amor, é uma contagiante canção feelgood, e “Relax (Take It Easy)” é outro tema que se destaca pela fórmula pop apurada, soando a uma hipotética versão dos Scissor Sisters de um single clássico dos Frankie Goes to Hollywood.

“Big Girl (You Are Beautiful)”, mais um episódio minimamente infeccioso; “Lollipop”, que recorre a coros infantis; ou “Billy Brown”, irónica crónica da vida de um homem com medo de “sair do armário”; são outros temas curiosos, mesmo que longe de memoráveis.

Se quando o ritmo é dinâmico e a atmosfera é animada Mika até nem se sai mal, os resultados são menos auspiciosos quando se centram na melancolia e desilusão - é o caso das desinspiradas baladas “Happy Ending”, “Over My Shoulder” e sobretudo “My Interpretation”, que convocam a faceta mais convencional e preguiçosa de um Robbie Williams ou mesmo de um James Blunt (e isto sim, já é bem preocupante).
Felizmente, estes momentos surgem com menor frequência, e por isso “Life in Cartoon Motion” ainda consegue ser um aceitável disco de pop comercial e sazonal, com capacidade para oferecer alguns hits antes de cair num quase inevitável esquecimento geral. Excepção feita, claro, aos que acreditam em parte da imprensa britânica, que diz ter encontrado aqui uma das próximas next big things

E O VEREDICTO É: 2/5 - RAZOÁVEL



Mika - "Love Today"

terça-feira, agosto 07, 2007

O PIANISTA

Filmes sobre jovens prodígios têm surgido sempre com alguma regularidade, e em alguns casos são material abraçado pelos Óscares e demais premiações, como o comprovam "Uma Mente Brilhante", de Ron Howard; "O Bom Rebelde", de Gus Van Sants; ou "Shine", de Scott Hicks. Muitas vezes, investem num melodrama duvidoso de tons demasiado agridoces e edificantes, onde as capacidades dos protagonistas os tornam mais em mártires do que iluminados, daí que "Vitus", do suíço Fredi M. Murer, surja como uma aparente lufada de ar fresco ao resistir a alguns lugares-comuns.

Retrato de uma criança com um talento inato para o piano, o filme investe na forma como a sua família vai descobrindo e reagindo aos seus dons, e se os pais o pressionam para que continue a aprimorá-los o avô é menos incisivo, deixando-o à vontade na sua oficina onde pode agir como um rapaz normal.
"Vitus" consegue, ao longo da primeira hora, trabalhar de forma contundente e tridimensional as inquietações que vão dominando o seu protagonista, pois à medida que este evolui no desenvolvimento intelectual (as suas capacidades acima da média vão muito para além da habilidade para o piano) vai sendo cada vez mais ostracizado pelos colegas, sendo incapaz de estabeler elos de ligação com alguém da sua idade.

Para os seus progenitores, contudo, o pequeno Vitus é um concentrado de potencialidades, incorporando o triplo da genialidade que o seu pai, inventor, sempre sentiu possuir mas que não conseguiu aproveitar como ambicionava. O problema é que, embora o protagonista possua capacidades cognitivas apuradas, emocionalmente não difere muito das outras crianças, e esse desfasamento que os pais parecem ignorar acaba por colocá-lo à beira de um abismo sem soluções em vista.

Até aqui, Murer desenvolve o filme aliando uma consistente densidade dramática a um argumento razoavelmente surpreendente, que não desbrava novos territórios mas também não cai em clichés. O pior é o último terço, que contraria a boa impressão até então sedimentada e desfaz quaisquer traços de negrume, oferecendo soluções fáceis, e sobretudo implausíveis às personagens e implementando uma aura feelgood que combina mal com a perspicácia e verosimilhança que havia sustentado o argumento.

Os tons realistas do arranque do filme são francamente mais convincentes do que a forçada atmosfera de fábula que domina os momentos finais, e é pena que Murer não se decida em relação ao que pretende fazer em "Vitus", pois tanto o aproxima de uma séria e inteligente experiência cinematográfica como de uma fantasia pronta-a-agradar cuja subtileza não é maior do que a de uma vulgar fita hollywoodesca.
O elenco, que inclui o veterano Bruno Ganz, defende bem as suas personagens e a realização não compromete, mas este impasse narrativo leva a que o filme passe de intrigante a desapontante. Interessante, ainda assim, embora menos do que se esperaria.

E O VEREDICTO É: 2,5/5 - RAZOÁVEL

domingo, agosto 05, 2007

PRANCHAS E VINHETAS NO PEQUENO ECRÃ

“Salvem a chefe de claque, salvem o mundo”. Esta foi uma das frases que ajudou a que “Heroes” se tornasse numa das séries televisivas mais populares e aclamadas dos últimos anos, resultado de um considerável fenómeno “passa-a-palavra” que gerou expectativa em torno de um projecto com uma premissa intrigante.
Na sequência de múltiplos filmes inspirados nas aventuras de super-heróis dos comics, a série transportou esse universo para a televisão, e mesmo não sendo das primeiras a fazê-lo – ícones como Batman ou Super-Homem, por exemplo, já asseguraram lá presença desde há muito – conseguiu injectar ao género doses de criatividade e entusiasmo como raramente se têm encontrado nas adaptações cinematográficas.

Não é que Tim Kring, o seu autor, apresente aqui nada nunca antes visto. Pelo contrário, “Heroes” é bastante devedor de inúmeras referências da BD, adoptando características de personagens já conhecidas dentro desse meio - os poderes especiais dos protagonistas da série são todos decalcados de super-heróis já existentes – ou a sua lógica narrativa – o modo como os episódios estão estruturados, terminando sempre com um cliffhanger decisivo, é herdado dos issues de muitos comics, assim como a construção dos subplots.
A mais-valia está na forma como a série mistura essas influências na criação de uma nova mitologia que consegue ser refrescante, apresentado uma galeria de personagens carismáticas que se cruzam num argumento eficaz e surpreendente q.b.. De resto, Kring nem pretende enganar ninguém e é o primeiro a assumir as suas influências, ou não fosse uma série de banda-desenhada criada por um dos protagonistas, o desenhador Isaac Mendez, uma das peças essenciais para fazer arrancar a história.


Os próprios desenhos das telas de Isaac foram criados por Tim Sale, nome familiar para quem acompanha o universo dos comics, e o argumentista Jeph Loeb, do mesmo meio, foi um dos consultores executivos. Chris Claremont, nome incontornável na evolução das aventuras dos X-Men, é também homenageado ao partilhar o apelido com um empregado de uma loja, e até há um cameo de Stan Lee, outra figura histórica da Marvel Comics.

Embora contenha pormenores deliciosos para os adeptos da nona arte, “Heroes” está muito longe de ser um objecto dirigido somente a esse público, não contendo quaisquer restrições para que outros o possam apreciar.
As personagens, todas cidadãos aparentemente normais, não demoram a gerar familiaridade, e por isso é difícil não aderir aos vários arcos narrativos que vão sendo criados em torno delas à medida que vão descobrindo e reagindo às suas capacidades especiais. Do inimitável e adorável Hiro Nakamura, protagonista algumas sequências que, mais do que comics, respiram influências manga, aliando dinamismo e humor; à chefe de claque Claire Bennet, que do estereótipo só mantém o facto de ser loura; aos irmãos Peter e Nathan Petrelli, que não poderiam ser mais diferentes; ou ao misterioso e calculista Noah Bennet, que parece saber mais sobre os heróis do que eles próprios; não faltam aqui personagens interessantes, e vai sendo viciante acompanhar o seu processo de descoberta.

Um dos factores mais elogiados em “Heroes” é a ausência dos tradicionais uniformes e nomes de código, uma vez que os protagonistas nem sabem como lidar com os seus poderes e têm, ainda assim, de os adaptar à rotina do dia-a-dia, encontrando-se muito longe do papel de super-heróis tradicionais. Este elemento torna a acção mais verosímil e reforça a identificação do espectador com as personagens, já que também estas agem como pessoas normais – embora vão descobrindo que há algo que as distingue da maioria e não envolve necessariamente capacidades sobre-humanas.
Mais uma vez, esta tridimensionalidade não é novidade neste universo, tendo em conta que foi o que distinguiu as aventuras de Peter Parker/Homem-Aranha das de tantos outros super-heróis, e mesmo a inexistência de uniformes e identidades secretas já foi uma tendência na BD, sobretudo na década de 90, tanto nos comics mais alternativos – a linha Vertigo da DC – como mainstream – quando personagens como Jubileu ou Gambit aderiram aos X-Men (e até ocorreu no cinema, como o comprova “O Protegido”, de M. Night Shyamalan). Esta ausência de exclusividade em nada compromete, contudo, a consistência de “Heroes”, que possui um lado humano suficientemente vincado e onde as demonstrações dos poderes dos protagonistas nunca se sobrepõem à carga emocional que se vai desenvolvendo.

Nesta primeira temporada, intitulada “Genesis”, a incidência é sobretudo neste processo de auto-descoberta das personagens, e talvez por isso no final fique a sensação de que funciona principalmente enquanto porta de entrada para uma saga de maior fôlego e intensidade. É quase sempre entusiasmante seguir estas aventuras, mas lamenta-se que não haja maior interacção entre os vários heróis, que vão seguindo pistas diferentes e acabam por se reunir num acontecimento fulcral já no desenlace e antecipado muitos episódios antes.
A resolução da temporada é, de resto, um dos aspectos menos conseguidos, pois se nos últimos episódios há uma atmosfera de suspense bem construída o capítulo derradeiro termina de forma demasiado abrupta e anti-climática, o que gera alguma decepção considerando que grande parte da acção foi desenvolvida em função desse momento. Claro que isso não coloca em causa os muitos bons momentos ocorridos ao longo da série, alguns de antologia, mas acaba por reduzir algum do impacto desta enquanto um todo.
Tirando este aspecto, “Heroes” é uma série bastante recomendável, lúdica e desafiante como poucas, entretenimento inteligente capaz de agradar a um público alargado. E o melhor é que, a julgar pelo sugestivo epílogo, a segunda temporada promete ir ainda mais além, oferecendo oportunidades ilimitadas para o percurso de pelo menos um dos protagonistas. Enquanto esta não chega, vale a pena ir vendo e revendo a primeira.


E O VEREDICTO É: 3,5/5 - BOM

10 BLOGUES, 5 FILMES, 1 REALIZADOR

Com algum atraso, mas em compensação com colaborações extra, fica aqui a tabela de estrelas referente a algumas das estreias cinematográficas de Julho (made by Knoxville, como habitual). A propósito da estreia de "Transformers", ficou o desafio de escolher o melhor filme do realizador, Michael Bay (ou o menos mau, vá lá). Por estes lados escolheu-se "A Ilha", quem quiser saber porquê espreite aqui.

sábado, agosto 04, 2007

JACKSON THREE (OU FOUR)

Não deixa de ser algo caricata a edição de um "Greatest Hits" das Luscious Jackson, já que por muito boa vontade que se tenha o único sucesso radiofónico da banda terá sido apenas "Naked Eye", e mesmo assim teve uma passagem fugaz em 1997 (a melhor posição que conseguiu no Top40 norte-americano foi a 36ª). "Best of" talvez fosse, por isso, uma denominação mais apropriada para o disco que faz a retrospectiva da carreira do trio (inicialmente quarteto) nova-iorquino, embora seja discutível se o que nele se encontra corresponde, de facto, ao que de melhor o grupo criou no seu EP e três álbuns.

Apadrinhadas pelos Beastie Boys, as jovens Jill Cunniff, Gabby Glaser, Vivian Trimble e Kate Schellenbach estrearam-se com a edição do EP "In Search of Manny", em 1992, o primeiro registo não relativo à banda de Mike D lançado pela editora Grand Royal. À semelhança destes, notabilizaram-se pela fusão de estilos das suas canções, unindo hip-hop e new wave ou funk e indie rock sem nunca deixarem de exibir um forte apelo pop, o que as tornou tão experimentais como acessíveis.
Em "Natural Ingredients" (1994) deram continuidade às sonoridades do EP, em "Fever In Fever Out" (1996) não as esqueceram mas optaram por tons mais jazzy e atmosféricos (fruto da produção de Daniel Lanois) e em "Electric Honey" (em 1999, após a desistência de Vivian Trimble) alargaram o espectro, reforçando a carga electrónica. Infelizmente, este seria o seu último disco de originais, tendo as duas vocalistas (Cunniff e Glaser) seguido carreiras a solo.

Neste "Greatest Hits" recuperam-se alguns dos momentos mais relevantes do percurso da banda como o inevitável "Naked Eye", sintomático da atitude e frescura das Luscious Jackson; "Citysong", exercício funk onde a carga urbana da música do grupo é mais evidente; a acelerada "Here", com saudáveis contaminações disco; "Nervous Breakthrough", um delicioso convite à festa; ou "Ladyfingers", irrepreensível canção pop onde o sentido melódico da banda surge mais apurado do que nunca.

Lamenta-se que o alinhamento incida pouco nos primeiros registos, sobretudo no EP, do qual apenas consta "Let Yourself Get Down", e não se percebe a presença de "Friends" e "Beloved", precisamente as duas composições mais fracas de "Electric Honey". Pouco estimulantes são também a maioria das remisturas aqui incluidas, todas aquém da que os Bentley Rhythm Ace fizeram para "Under Your Skin" (superior ao original) mas que, contudo, ficou de fora.

Estas escolhas são compensadas por alguns bónus, casos da da elegante versão de "69 Anée Érotique", de Serge Gainsbourg, ou da interessante "Love Is Here", retirada da banda-sonora de "Vidas Diferentes", de Danny Boyle. Pena a ausência de "Roses Fade", um dos temas do filme "O Santo", de Phillip Noyce, atípica canção da banda seguidora da tradição singer/songwriter.

"Greatest Hits" não é, assim, a compilação mais consistente que poderia surgir a partir da obra das Luscious Jackson, embora o que oferece seja ainda suficientemente representativo de um grupo que, mesmo não sendo essencial, deixou uma discografia equilibrada que se mantém apelativa e até influente - nomes como os New Young Pony Club, Le Tigre ou Lily Allen que o digam, por exemplo. E este pode ser só o final da sua primeira fase, já que a banda considera reunir-se para um novo álbum a editar para o ano. Se mantiver a solidez registada até aqui, valerá a pena aguardá-lo.


E O VEREDICTO É: 3/5 - BOM



Luscious Jackson - "City Song"

sexta-feira, agosto 03, 2007

ENCALHADA AOS 40 ANOS

Não têm faltado estreias de blockbusters mega-promovidos neste Verão, como de resto é habitual, o que estranhamente não tem chegado com tanta frequência é outro tipo de filmes que possuem também alguma força para levar público às salas, como é o caso das comédias românticas. "Nem Contigo...Nem Sem Ti!" (I Could Never be Your Woman) é uma dessas excepções, e traz logo um trunfo ao assinalar o regresso de Michelle Pfeiffer ao grande ecrã, após uma ausência de cinco anos (o último filme em que tinha participado foi o discreto "A Flor do Mal", de Peter Kosminsky).

Esta não se destaca como o único nome forte do elenco, uma vez que o co-protagonista, Paul Rudd, mesmo sem um peso mediático comparável, é uma óptima escolha. Infelizmente, os dois actores e a química que surge entre eles acabam por ser o que de mais memorável o filme deixa, pois a realizadora Amy Heckerling não o conduz da forma mais interessante.

Retrato da relação de uma produtora de televisão de 40 anos com um jovem aspirante a actor, "Nem Contigo...Nem Sem Ti!" não inova nesta premissa mas tenta fazê-lo ao alicerçar-se num argumento que aborda ainda, transversalmente, o relacionamento entre pais e filhos, os dilemas dos bastidores televisivos, a entrada na adolescência, crises de meia idade ou as tentações do estrelato.
Os temas são interessantes, o modo como são trabalhados nem tanto, sobretudo porque Heckerling prefere apostar quase sempre na caricatura em vez de conferir alguma densidade às situações. Não faz muito sentido disparar críticas aos clichés e humor elementar de séries televisivas juvenis quando os gags que o filme apresenta também são, geralmente, mais óbvios do que sofisticados. Óbvios e, por vezes, de mau gosto, como numa cena em que a dupla protagonista ridiculariza as operações plásticas feitas por actrizes e cantoras de forma a que Pfeiffer surja mais beneficiada na fotografia.

Têm sido poucas as comédias românticas capazes de fugir aos lugares-comuns nos últimos anos, e não é "Nem Contigo...Nem Sem Ti!" que vem assim mudar o cenário, uma vez que segue a regra e esquadro a estrutura boy-meets-girl (neste caso, na variante boy-meets-woman) mais tipificada. Por vezes há aqui tentações de irreverência, logo desfeitas por cenas de artificial moralismo, e no final não se percebe se este é um produto que se dirige mais a um público adolescente ou adulto, dada a mistura de registos (o que se calhar nem é de estranhar, vindo de alguém que no currículo inclui a realização de "Olha Quem Fala", "Clueless" ou episódios da versão americana de "The Office").

O filme funciona, no entanto, enquanto montra em que Paul Rudd demonstra o seu perfeito sentido de timing numa interpretação que respira espontaneidade, sendo responsável pelas sequências mais conseguidas. Sem ele, esta seria provavelmente uma película mortiça e em piloto automático, ainda que Pfeiffer não tenha perdido o charme e sirva uma interpretação competente. Há mais bons actores por aqui, como Steve Pemberton ou Mackenzie Crook, entre outras caras conhecidas da britcom, não têm é grande coisa para fazer e o seu talento é assim desperdiçado. Dispensavel era a presença de Tracey Ullman na pele de Mãe Natureza, amiga imaginária da protagonista, num papel sem graça nem relevância.

No geral, "Nem Contigo...Nem Sem Ti!" não é melhor nem pior do que tantos outros chick flicks feitos em linha de montagem. Tem algumas boas sequências de humor, muita previsibilidade, um par romântico que funciona e uma banda-sonora curiosa, que é quase um best of dos Cure interrompido pela canção que lhe inspirou o título (na versão original): "Your Woman", que fez dos White Town one hit-wonders há dez anos. Ou seja, à falta de melhores alternativas dentro do género esta servirá, mas deixa um sabor tão fugaz como o de um amor de Verão.

E O VEREDICTO É: 2/5 - RAZOÁVEL

quinta-feira, agosto 02, 2007

ESTREIA DA SEMANA: "JINDABYNE"

Numa semana com oito estreias (!), a aposta da casa vai para "Jindabyne", que entre o drama e o thriller narra o regresso de quatro amigos de uma pequena localidade australiana que se ausentaram para pescar juntos. O problema é que consigo trazem o cadáver de uma jovem, que dizem ter encontrado no rio, mas os seus vizinhos e familares mostram-se algo cépticos quanto a esta justificação. A esposa de um deles fica especialmente desconfiada e tenta descobrir o que ocorreu de facto durante a saída.
Baseado num conto de Raymond Carver, "Jindabyne" é o novo filme de Ray Lawrence, nome familiar para quem viu "Lantana", de 2001. Laura Linney e Gabriel Byrne lideram o elenco e reforçam a suspeita desta ser uma obra a ter em conta.

Outras estreias:

"Cash", de Anubhav Sinha
"Dia de Surf", de Ash Brannon e Chris Buck
"Golpe Quase Perfeito", de Lasse Hallström
"Paranóia", de D. J. Caruso
"Torre Bela", de Thomas Harlan
"Van Wilder 2: O Rei da Festa", de Mort Nathan
"Vitus", de Fredi M. Murer



Trailer de "Jindabyne"